Editorial: Olhares para a periferia

As cidades são diversas e, em regra, marcadas por desigualdades. Não é o caso de responsabilizar administrações particulares por descompassos que se inscrevem numa rede de fenômenos mais ampla, que envolve desde fatores econômicos (dos globais aos locais), passa pela dimensão cultural das urbes e de seus habitantes e, claro, também alcança o que é próprio da política.

No entanto, qualquer administração responsável, atenta à missão cidadã que recebeu por força do voto popular, deve estar comprometida para trabalhar pela superação das desigualdades. Isso nada tem a ver com o comportamento infrutífero de se agarrar a uma utopia inatingível. Aproxima-se mais do espírito científico, que dedica seus esforços ao aperfeiçoamento daquilo que sabe e faz, sem guardar ilusões quanto à conquista da perfeição ou do desvelamento da verdade absoluta.

Para que se caminhe, nesta direção, é preciso, mais uma vez, com o espírito inspirado pelas luzes da razão, empenhar-se em conhecer. Metrópoles como Fortaleza, que há muito superaram a marca de 1 milhão de habitantes, demandam não apenas empenho, mas método para que se conheça bem cada um de seus entraves, para que se defina, claramente, os desafios a serem superados.

O território é vasto e complexo. A população, imensa, e seus problemas, portanto, sempre tenderão ao gigantismo. Este, aliás, é o desafio permanente da administração pública da Capital. O é, nesta gestão, e será, certamente, em todas as vindouras. É preciso, para bem conhecer a cidade e seus desafios, fazer-se presente nela. Todos os equipamentos públicos, sejam eles de quais naturezas forem, da educação à saúde, podem e devem funcionar como antenas, canais de acesso à população para que se entenda suas demandas, mesmo quando estas ainda não estão organizadas.

Outro instrumento importante, do qual o Poder Público precisa se valer cada vez mais, são pesquisas qualificadas, pensadas para esquadrinhar dimensões da vida em sociedade, de forma a servir de referência para políticas públicas que estejam firmemente ancoradas na realidade da população. Esta, importante salientar, compreendida em sua máxima diversidade, com cada território da cidade sendo compreendido em suas próprias especificidades.

Levantamento da Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos (SCSP), acerca da mobilidade na Capital, revelou dados que apontam, inequivocamente, caminhos a serem trilhados pela administração pública municipal, seja de forma autônoma ou em eventuais parcerias com a iniciativa privada, com o Estado ou a União. Os dados preliminares deixaram claro a importância das bicicletas para o deslocamento da população. A chamada "mobilidade ativa" (que inclui, além das bikes, o caminhar) responde por 1/3 de todos os trajetos feitos em Fortaleza. Deslocamentos que têm finalidades práticas: 84% dos ciclistas de Fortaleza utilizam o veículo para se locomover ao trabalho ou ao estudo, e 88% possuem renda que varia de um a dois salários mínimos, concentrando-os na periferia da cidade.

Amostragens do tipo apontam a necessidade de, sistematicamente, se investir mais neste modal e levar ações de políticas públicas de mobilidade para as periferias. São exemplos de como a administração pública pode ir direto ao ponto: a vocação e as necessidades da população para a qual trabalha.


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