Editorial: Obstáculos da adoção

Celebra-se, hoje, o Dia Nacional da Adoção. Criada em 1996, no contexto de encontros congregando associações e grupos de apoio à prática, a data foi oficializada em 2002, por meio da Lei 10.447. O objetivo, desde o início, tem sido o de dar visibilidade à situação do grande contingente de jovens que vivem em abrigos ou lares provisórios, à espera de um lar definitivo.

Segundo dados do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA), 47.517 crianças e adolescentes se encontram em abrigos no País. Um número bem menor – 9.535 – corresponde aos cadastrados para adoção no Cadastro Nacional de Adoção (CNA). Destes, 267 estão em instituições no Ceará. 

Os números mostram que não se trata de um problema pequeno. Mais da metade dos municípios brasileiros tem contingentes populacionais inferiores ao dos jovens residentes em abrigos no Brasil. O que estes dados não mostram é o emaranhado de razões que leva jovens a uma vida de espera. Falta de condições mínimas em seus antigos lares, abandono familiar e violência estão entre elas. 

Imperativo lembrar o artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral”.

Superar essa situação, primeiramente por intermédio do Estado ou de uma das instituições privadas por ele reconhecidas, depois pela concretização da adoção, é desafio dos mais complexos. Basta que se olhe o aparente contrassenso de outro dado: o de que são quase 30 mil as famílias cadastradas na lista de espera do CNA.

No meio do caminho, estão a morosidade legal – fruto das dificuldades que a Justiça no País enfrenta, e não exclusiva dos processos de adoção; a desatualização de levantamentos; a falta de estrutura que permitam acompanhamentos sistemáticos das famílias que almejam adotar e dos jovens à espera. 

Na avaliação do Conselho Nacional de Justiça, há outros obstáculos a serem considerados. É o caso da discrepância existente entre o perfil da maioria das crianças e adolescentes do cadastro e o perfil de filho, ou filha, admitido por aqueles que aguardam na fila da adoção. Restrições raciais e gênero produzem desencontros. Mas o obstáculo maior é o baixo número de famílias dispostas a adotar crianças maiores. Apenas 25,63% dos pretendentes admitem adotar crianças com quatro anos ou mais. O caso de Fortaleza explicita o problema: 82% das crianças disponíveis para adoção na Capital Fortaleza não têm pretendentes, devido à idade.

Propostas para minimizar o descompasso incluem a aproximação entre as crianças de abrigos e as famílias, na fila ou à causa. Exemplar é o projeto, idealizado pela Defensoria Pública do Estado do Ceará, e instituído, em 2016, pela Justiça Cearense instituiu, que regulamenta apadrinhamentos – afetivo, financeiro e de prestação de serviço –, promovendo interações entre voluntários e o público dos abrigos.

Trata-se de ação paliativa, mas com potencial se fazer solução definitiva, em alguns casos. E oportuna por envolver a sociedade na solução de problema dos mais graves.