Editorial: O novo e o velho

Dias intensos marcaram a volta aos trabalhos na assembleias legislativas, nos estados; na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, em Brasília. No começo da nova legislatura, veteranos destas casas se reapresentaram e tomaram os lugares que, para eles, já era familiar; outros, que por ali passaram e deixaram suas marcas, não voltarão à cena, por força das escolhas dos eleitores que foram às urnas em outubro passado; e, por fim, novos nomes chegam sob o otimismo do desejo de renovação que animou tantas campanhas em 2018.

No embalo dessa onda renovadora que tomou força nos últimos anos, não faltaram políticos decanos investindo em outras formas de comunicação, fazendo ajustes em seu discurso político, aderindo a bandeiras da vez. Sobretudo, aqueles que esperam contar com os eleitores, daqui a dois anos, para impulsionar aliados regionais e, um pouco mais na frente, para garantir sua permanência ou até mesmo promover um salto. O que não tem nada de novo é essa vocação camaleônica de uma parcela daqueles que fazem a política partidária. Tudo para agradar ao eleitorado.

Desejar o novo é positivo, desde que isso signifique empenhar-se no aperfeiçoamento, no caso, das práticas e instituições políticas. Deve-se evitar a apologia do novo, quando por trás dela há uma simples aversão ao velho, num entendimento que despreza o conhecimento que advém da experiência. Não há registro de sociedade que se desenvolva sem ter em mente a contribuição daqueles que a precederam.

Mas, nesse desejo, é preciso abandonar as ingenuidades. Estas não cabem na política. O que se viu nas casas legislativas, já no primeiro dia do novo ciclo, foi uma demonstração de forças, destreza e argúcia. Não é à toa que se costume recorrer à ideia de "arena", como as da Roma Antiga, para fala dos espaços institucionais em que se faz política.

A história mostra que, como tudo, a política também muda. Mas sua mudança não se dá abandonando tudo o que antes estava lá. Uma das áreas que interessa a antropologia é justamente a política, pois ela é, também, rito e tradição. Vale dizer que, apesar do entendimento positivo que costuma acompanhar a palavra, a tradição não necessariamente é algo louvável. Preconceitos, por exemplo, costumam repousar em suas tramas. Mas o fato é que as tradições são fortes e não se desmancham fáceis. Mas elas também se atualizam, mudam de curso, desde que essa transformação se dê de forma orgânica e gradual.

No Senado Federal, assim como na Câmara dos Deputados e nas assembleias legislativas, aqueles que professam a importância da renovação devem ter ciência dos ritos e tradições que lá operam, para que possam atuar e levar suas propostas. Mudanças podem ser feitas, mas precisam levar em conta os movimentos e as disposições destas casas, sob risco de boas ideias serem sepultadas por inabilidade política e falta de diálogo.

Não deve-se pensar, assim, que se trata de um anúncio de imobilidade, de resistência a mudanças. O cidadão tem que estar atento às transformações, por vezes sutis, de seus espaços de representação, como o fortalecimento de frentes políticas que não são, necessariamente, partidárias; e a cada vez mais complexa relação - e disputa de forças - entre os três poderes.


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