Editorial: O caminho da leitura

É bem conhecida a receita de Monteiro Lobato, que ensina que um país se faz com homens e livros. Contudo, as transformações sociais das últimas décadas, em mais de uma ocasião, convidaram à avaliação crítica da produção literária do autor de “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”, dadas as limitações que o contexto histórico impõe até mesmo aos gênios. Seria prudente, ao endossar sua famosa fórmula, trocar “homens” por pessoas ou outra palavra mesmo equívoca para dizer do gênero humano.

Considerada de forma rigorosa, a combinação pode parecer exagerada ou ainda ter sido elaborada com finalidade de dar ênfase às competências e ofícios de quem a concebeu – Lobato era, como se sabe, escritor e editor. Importante dizer que aquilo que se destaca na máxima é a defesa contundente da leitura na formação de homens e mulheres. Formação, necessário salientar, que não se esgota apenas no aspecto educacional, mas da construção de si mesmo, como cidadão dotado de capacidade crítica e, portanto, pleno de condições de exercer aquilo que a sociedade dele espera.

Há certa concordância em torno da importância dos livros, a despeito do espírito político daqueles envolvidos no debate. É expressa nos elogios recorrente do saudável hábito de ler, que costuma ser colocado degraus acima numa hierarquia de atividades de consumo cultural e informativo. Mesmo em tempos (ainda) polarizados, não se encontra muita gente disposta a questionar a prática em si, ainda que já se encontrem os censores de conteúdos que seriam ou não apropriados. 

Ler, em suportes físicos ou digitais, é visto, como no ensinamento lobatiano, atividade capaz de qualificar que a pratica. Tamanha a frequência com que hoje se envolve debates e embates críticos, ter conteúdo, ser letrado, são instrumentos fundamentais e eticamente necessários. Não poucas vezes, nos exageros mais reprováveis, é patente a falta de cultura livresca, de educação cultivada e de informação qualificada por parte dos envolvidos.

Deve-se registrar a continuidade e longevidade de projetos que celebram o universo do livro e contribuem para o incentivo à leitura, como o da Bienal Internacional do Livro do Ceará, promovido pelo Governo do Estado do Ceará, por meio de sua Secretaria da Cultura, merecem ser destacados. O evento já se aproxima de suas três décadas de criação e chega, nesta semana, à 13ª edição. 

A ação é a maior em alcance direto e em orçamento da Pasta – com média de público por edição que supera os 400 mil visitantes. É uma mostra que, a despeito do caráter solitário da leitura, ela é capaz de congregar multidões. A atração principal em eventos do gênero, que o pese sua programação de palestras, debates, conferências e afins, é sempre o livro.

O Brasil ainda está distante da realidade de nações desenvolvidas, no que toca à disseminação do hábito da leitura. Séculos de uma educação deficitária e de exclusão de parcelas significativas da população dos espaços de cultura cobram seu preço. É, também por esse motivo, fundamental que a concordância a respeito da importância dos livros e da leitura ganhe corpo em ações, não apenas pontuais, mas estruturantes, como a construção e manutenção de bibliotecas abertas ao público.