Editorial: Números da miséria

Métricas, tabulações, estatísticas. À racionalização matemática se recorre, com frequência, para se chegar a ideias precisas acerca dos desafios e feitos de uma administração, seja ela de entes públicos ou privados. Há indicativos que se sobrepõem a outros, sendo medidos ponto a ponto, acompanhando assim os humores que os determinam. São registrados os menores movimentos nas projeções para o crescimento econômico, oscilações do Produto Interno Bruto (PIB), flutuações do dólar e o sobe e desce de juros e inflação. O sucesso de uma política econômica, em tese, se mediria pelo bom desempenho atestado nos índices, esperados e positivos para o País.

O quadro é mais complexo e não pode ser trocado por mera abstração matemática. É importante que se chegue à concretude destes dados e que outros, de importância semelhante, também sejam considerados, acompanhados e sirvam de base para ações que ajudem a moldá-los conforme os objetivos da administração pública. As Nações Unidas têm incentivado novos paradigmas econômicos que considerem indicativos de felicidade e bem-estar. Fala-se mesmo numa métrica que considere a Felicidade Interna Bruta (FIB).

Uma virada do gênero não acontece da noite para o dia. Contudo, é possível se ater a medições presentes para entender a situação em que se vive e, quando necessário, procurar mudá-la. É o caso do grave problema social das pessoas que vivem na extrema-pobreza. Em um ano, 31,7 mil cearenses passaram a viver abaixo dessa linha – definida como daqueles que sobrevivem com renda familiar per capita de até R$ 89 por mês. O número é expressivo e superior à população de 122 municípios do Ceará.
De acordo com dados do Cadastro Único para Programas Sociais do Ministério da Cidadania, referentes ao mês de junho, 1.027.487 pessoas vivem nesta condição no Ceará. A amostragem permitida pelo cadastro é de mais de 1,8 milhão de pessoas. Em situação de pobreza, estão 150.368 pessoas cearenses (com rendimentos entre R$ 89,01 e R$ 178/ mês); um grupo de 380.649 pessoas tem renda de R$ 178,01 e R$ 499; e 274.790 dispõem, mensalmente, acima de meio salário mínimo.

Em números absolutos, o Ceará ocupa a quarta posição entre os estados com maiores índices de extrema pobreza. As três unidades da Federação que ocupam as primeiras colocações são Bahia, com 1,82 milhão de pessoas nesta faixa; seguida de São Paulo, com 1,41 milhão; e Pernambuco, com 1,15 milhão.

Situações do tipo não podem ser negligenciadas e deixadas em segundo plano. O recorte apresentado – a realidade do Ceará – não implica em identificá-la como um problema a ser manejado pelo Governo do Estado. Exige envolvimento e ações dos municípios e da União. Reverter tais números é um imperativo, em acordo com as garantias que o estado de bem-estar social da Constituição Federal confere aos cidadãos de todo o País. 

Desenvolvimento passa, necessariamente, por reduzir tais números – e, idealmente, superar de todo realidades como a da extrema-pobreza. Exige-se compromisso de todas as instâncias federativas e ações de longo prazo, para superar o quadro em definitivo. 


Assuntos Relacionados