Editorial: Nova configuração

Construiu-se nas últimas décadas a narrativa de que o serviço público brasileiro e as empresas estatais são pesados e inoperantes. Que são atrasados, excessivamente burocratizados, dissociados da modernidade e que, por isso, não alcançam índices de eficiência que satisfaçam seus públicos. Com essa carga negativa, constituiriam ônus para o Estado e ao contribuinte.

São críticas que, independentemente de onde partam e do sentido que possam tomar, têm endereços certos: os dos governantes que, de quaisquer origens que sejam e em todas as esferas de poder, se revezam no controle dos mecanismos públicos, em geral sem a eficiência almejada.

Não é equivocado avaliar que os afazeres públicos, a exemplo dos particulares, carecem permanentemente de aprimoramento, tanto de práticas, quanto de tecnologias e de capacitação de pessoal. Existe uma dinâmica que é motivada pela execução de metas e pela obtenção de satisfação  por aquilo que é determinada. Melhorias fazem parte das demandas de qualquer atividade humana, em todos os momentos da história.

De fato, há de se buscarem atualizações necessárias e indispensáveis, não apenas em nome da modernização ou da competitividade, mas sob a égide da Constituição Federal, que destaca no artigo 1º que a soberania e a dignidade da pessoa humana são fundamentos do Estado Democrático de Direito. Afinal, o mesmo princípio ressalta que “todo o poder emana do povo”. Em resumo: define que o cidadão é o princípio e são os fins de todos os esforços.

No entanto, não é justo demonizar os serviços e os servidores. Longe disso, devem-se estabelecer condutas que visem à otimização, à excelência e, claro, aos padrões elevados que os destinatários, com razão, cobram.

É a propósito disso que se deve analisar a venda pelo Governo Federal, por intermédio da Petrobras, de 35% das ações da BR Distribuidora pelo valor de R$ 8,6 bilhões. Os números ainda podem mudar, caso seja acrescentado à transação um lote de ações que elevaria o montante para R$ 9,6 bilhões.
Esse movimento no mercado havia sido acertado há cerca de dois meses, ancorado no argumento de que se deve fazer foco no fortalecimento na exploração do pré-sal, diminuindo as pressões de outras atribuições.

Assim, o Estado brasileiro deixa de ser majoritário na composição da subsidiária que controla postos de combustíveis e entrega esse papel para a iniciativa privada. É uma operação de fácil entendimento: transmitiu-se para outros agentes econômicos a responsabilidade decisória em relação à estatal. Transferiu-se também a maior parte dos lucros, como as deliberações que nortearão as políticas de investimentos e de distribuição de lucros.

A Petrobras possuía 71,25% do capital da BR e passou adiante 30% dos papéis. O tempo vai se encarregar de mostrar se o negócio foi vantajoso para o País, e qual o impacto disso no serviço prestado. O que se pode agora, antes de qualquer conclusão, é estimar que criou-se uma nova configuração – talvez com perspectivas de êxito mais amplas do que as efetivadas com a sucessão de privatizações da década de 1990. E que, desse modo, pode vir a surgir um momento diferenciado.


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