Editorial: Necessidade e prudência

Sancionada há quase duas décadas, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) - oficialmente, Lei Complementar nº 101 - representou um avanço da racionalização da administração pública. Com ela, foi criado mecanismo legal que impõe o controle dos gastos públicos, nas instâncias federal, estadual e municipal. A lei determina um princípio razoável: os gastos devem ser condicionados à capacidade de arrecadação de tributos por parte dos políticos.

O balanço das finanças da União, dos estados e municípios deve ser transparente, e apresentado detalhadamente ao tribunal de contas competente, de acordo com a instância em questão. A não aprovação de contas está condicionada ao registro de irregularidades, que exigirão que seja então instaurada investigação sobre a responsabilidade administrativa. Caso sejam comprovadas, a sanção pode vir na forma de multas ou até na proibição de os responsáveis disputarem eleições futuras.

Atentos ao rigor da lei, e do imperativo de cumpri-la sob pena de evidentes prejuízos políticos, prefeitos cearenses estão mobilizados para conseguir, junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), acordo para evitar que gestores públicos sejam penalizados por descumprimento da LRF. Antecipa-se, assim, a problemas que podem agravar a situação destas unidades administrativas. Eles estão atentos, em especial, a irregularidades relativas às despesas com a folha de pagamento.

De acordo com a Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece), 120 dos 184 municípios cearenses ultrapassaram o limite prudencial de gastos com pessoal, de acordo com a legislação. O teto de despesas sob essa rubrica é de 54% da Receita Corrente Líquida. Acima disso, as prefeituras estarão sujeitas a sanções administrativas.

De forma geral, a despesa com pessoal mais pesada, nos municípios, vem de duas áreas: Educação e Saúde. Em comum, há o fato de serem consideradas prioritárias pela população - é o que se vê repetido a cada pesquisa com eleitores, e não foi diferente em 2018. Há outra convergência no fato de, sobre nestas duas frentes, terem recaído cortes de programas e redução de repasses. A matemática é simples de compreender, mas difícil de solucionar: com menos dinheiro sendo repassado, em especial da União, as prefeituras viram seus gastos aumentarem. Em alguns casos, foi necessário maior aporte do município para garantir pagamentos de salários conforme o piso das categorias.

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), usado para pagamento dos professores, além de garantir outros investimentos em Educação; e o programa Saúde da Família (PSF), para custeio de médicos e a manutenção das unidades de saúde, são dois exemplos de fontes que minguaram.

Claro, há de se considerar ainda casos em que as folhas com pessoal incham conforme interesses políticos, alheios ao benefício da população. Não se deve ser conivente com a corrupção e a má administração. Contudo, é importante que se encontre soluções para impasses como o que os prefeitos apresentam. Afinal, a crise produziu cenários atípicos e é preciso razoabilidade para manter as máquinas públicas funcionando.