Editorial: Mau uso de medicamentos

Em regra, a saúde não é um problema restrito à ordem do pessoal. Diz respeito ao ciclo social do enfermo, por razões afetivas, mas também financeiras, sobretudo países com sistema público deficiente e insuficiente para atender às demandas da área. Para o corpo social, têm ainda impactos econômicos, tanto de produtividade, como os relativos aos custos para a máquina pública de tratamentos médicos.

Há uma terceira dimensão social do problema, relativa à não observância dos cuidados clínicos necessários, que podem levar à proliferação de doenças ou o surgimento de enfermidades que poderiam ser evitadas. A má administração de medicamentos e o uso indiscriminado de drogas que exigem orientação especializada têm uma série de impactos bem documentados. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem alertado, seguidas vezes, para o aumento da resistência de bactérias a medicamentos – o que, na prática, implica numa diminuição da eficiência de drogas até então capazes de combater males. Uma das principais causas desse problema é o consumo inadequado de antibióticos.

O caso é bastante comum. Entre os tipos de uso incorreto mais frequentes, está o de utilizar antibiótico para infecções bacterianas, para tratar quadros virais; e o da escolha da medicação errada para combater o agente infeccioso. Há ainda risco de efeitos colaterais capazes de piorar o quadro de saúde.

A falta de acompanhamento médico apropriado, dificultado por problemas na oferta desse serviço básico, tem seu quinhão de responsabilidade nessa grave situação. Contudo, mais danoso é o hábito da automedicação, potencializado pela busca de diagnósticos e prognósticos em sites, blogs e redes sociais. Trata-se de um problema que não pode ser explicado por falta de acesso a serviços de saúde, sendo observado em todas as classes sociais. A automedicação não se restringe a esta ou aquela doença, e não faltam adeptos que se disponham mesmo a administrar remédios a crianças, sem orientação médica. 

Dados da Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) mostram uma das facetas deste descontrole, que tem implicações graves para a saúde do corpo social. Em suas ações de fiscalização, a agência tem realizado cerca de 60 autuações de comércio irregular de produtos farmacêuticos, em estabelecimentos comerciais, e em logradouros públicos. A média do primeiro semestre deste ano mostra uma curva ascendente se considerados os números do ano passado.

Há legislação municipal – a Lei nº 8.222/1998 – que proíbe “comprar, vender, ceder, transportar ou usar medicamentos sem registro, licença ou autorizações dos órgãos sanitários competentes ou contrariando o disposto na legislação sanitária pertinente”. Em âmbito federal, Lei nº 5.991/1973, restringe a comercialização de medicamentos às farmácias e drogarias, que devem ser licenciadas pelos órgãos sanitários.

É importante que o Poder Público exerça sua função fiscalizadora, para garantir que tais substâncias sejam comercializadas e administradas dentro de parâmetros seguros, com acompanhamento de pessoal capacitado. E é fundamental que o cidadão faça sua parte, seguindo conduta correta e responsável com a saúde que, como se sabe, é uma questão pública.


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