Editorial: Fora de época

O ano ultrapassou, há pouco, a marca de 100 dias e a mesma contagem vale para mandatos de chefes do Executivo, nacional e estaduais, e de três classes parlamentares, eleitos em outubro de 2018. Balanços foram feitos e resultados preliminares apresentados, ainda que em tão pouco tempo seja mínimo aquilo que poderia ter sido realizado. Enquanto a população e as instituições olham para frente, num movimento pendular de apreensão e esperança pelo futuro, que só pode ser construído por ações no tempo presente, setores da classe política já se movimentam, ouriçados por intenções eleitorais para 2020 e 2022.

É o jogo político, dirão alguns. Troca-troca de partido, aproximações entre grupos políticos, novas alianças. Cargos vão e vêm. Escalações difíceis, como as de um técnico de seleção: quem sairá de uma posição a outra, quem irá esperar ainda mais tempo, quem não terá lugar. Pode parecer apressado todo esse empenho com fins das eleições de 2020. Não seria cedo demais para se investir tanto tempo e energia? Não faltará quem diga que é ilusão que o jogo tenha começado cedo; na verdade, sequer parou.

As notícias já dão conta de tudo isso, e leitores, ouvintes e espectadores sequer estranham, acostumados que estão com esses ciclos eleitorais, que parecem cada dia mais abreviados dadas essas movimentações. E, de certa forma, elas fazem sentido e têm até razoabilidade: afinal, a complexidade administrativa e legislativa, associada aos problemas antigos, novos e remoçados de nossa sociedade, por vezes pede mais tempo, para garantir a continuidade mínima de projetos políticos.

Mas há de se estar atento para o desvio dessa tendência, pois ela pode ser o índice de uma política que é, também, plano de poder, com finalidades nada republicanas. É quando o objetivo maior das forças políticas é apenas se perpetuar; quando as ações são calculadas em termos do que podem render, eleitoralmente, em dois ou quatro anos. Quem segue por esse caminho trai a ideia de representatividade que é um dos pilares de nosso sistema democrático. Deixa em segundo plano a missão que lhe foi confiada não apenas por seus eleitores, mas por cada um que acredita no modelo representativo brasileiro.

Daí o cidadão deve tirar uma lição. Se parte dos políticos dedica o tempo que deveria ser empregado em ações em prol da sociedade, ao que poderá garantir o futuro de seu grupo de poder, numa espécie de cabotagem eleitoral, cabe ao cidadão se investir de um espírito de eleitor também permanente.

É preciso estar atento à política dos jogos de poder e da pouca eficiência, seja no Executivo ou no Legislativo. É preciso ter em mente as promessas feitas e as demandas não atendidas, os impasses que precisam ser solucionados no País e os problemas que devem ser antevistos antes que se somem aos que já temos. Como os candidatos dos dois últimos pleitos têm se saído nisso tudo? Obversar bem certamente ajudará o cidadão na próxima vez que estiver diante das urnas.

No País, nos estados e nos municípios, há muito por fazer. O futuro que interessa à sociedade é o que se constrói no presente e almeja o bem coletivo. Essa deveria ser a finalidade da política.


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