Editorial: Dialogar é fundamental

A cena política – e a sociedade, num modo mais amplo – tem encontrado com frequência incomum no noticiário as palavras “diálogo” e “conversa”. Não que a utilização dos vocábulos deva impressionar ou que saia do convencional. O que merece destaque é a atual conjunção de elementos que fazem com que ganhem mais nitidez e tenham o valor realçado. Afinal, trata-se de ingredientes sem os quais a democracia não teria substância nem poderia ser relacionada, sequer, como uma das mais relevantes criações, ou conquistas, da humanidade.

O Brasil está, por assim dizer, imerso numa intensa discussão sobre o sistema previdenciário e a reforma que o Palácio do Planalto almeja para o setor. Os interesses são, evidentemente, indiscutíveis e gerais. Isso, ademais, é pertinente. É natural que o cidadão, com os direitos constitucionais que conquistou, não admita definições excludentes ou decisões verticalizadas, sem a exposição de demandas do contribuinte.

E é indispensável, então, que seja saudado e estimulado o uso tão reiterado, da negociação, assim como a prática. E que essa postura benfazeja atravesse os limites das casas parlamentares e chegue ao cotidiano das pessoas, que ainda vivem o trauma da fratura de relações causada pelas últimas eleições.

Observe-se que a Carta Magna relaciona no Artigo 6º a Previdência Social entre os direitos sociais dos brasileiros, dando-lhe proeminência equivalente às da educação, saúde, segurança, trabalho e moradia. No Artigo 10º, observa-se que “é assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação”. Somam-se interesses públicos e corporativos.

Em resumo, a Previdência é mencionada 102 vezes nos 114 artigos da Constituição Federal, numa demonstração de que foi enxergada, já em 1988, como um dos pilares da sociedade brasileira. Ou, pode-se dizer, como uma medida que espelha em todos os ângulos as necessidades da população.

A espinha dorsal da retórica do Governo tem sido a de que a reforma da Previdência, na forma como está proposta, permita, em 10 anos, a economia de R$ 1 trilhão. Não é pouco. A expressividade dessa quantia, no entanto, perde força quando se nota que a questão não há de ser prioritariamente pecuniária – apesar de esse ponto ser, de fato, relevante. Há a se observarem os lados humanos, da idade e do trabalho, pelo menos.

Além do mais, argumentos como o da economia de dinheiro podem ser tratados mais convenientemente em abordagens como a que trata do sistema tributário brasileiro, que também carece de reformulações – algo que o Governo ainda não estabeleceu na pauta da Nação. A propósito disso, uma recente pesquisa feita entre empresários cearenses, pela Federação das Indústrias do Estado (Fiec), indica um alto grau de insatisfação local com a política de impostos, classificada por 88% dos industriais ouvidos como “Ruim” ou “Muito Ruim”.

Chegou-se a um patamar em que o Brasil não pode abrir mão de reformar a Previdência. Mudanças implicarão competitividade, renda, empregos. Não se pode, sob o mesmo risco, abdicar do “diálogo” e da “conversa”.