Editorial: Constituição estadual

Constituições, como documentos legais, têm aspectos que vão para além do político. A começar pelo caráter histórico, já que representam cenários e momentos determinados, considerando influências diversas, entre as quais as culturais. Há também o lado social, uma vez que, em grande parte das situações, são construções coletivas feitas a partir de representações dos cidadãos – os conceitos democráticos estabelecem, ainda, pluralidade e isenção nesse procedimento.

É a propósito disso que se deve saudar enfaticamente a passagem dos 30 anos da Constituição do Ceará, que transcorre hoje. Trata-se, afinal, de um elemento que se fez e permanece essencial para as bases democráticas do Estado, assim como foi e é para a Nação a Constituição Federal de 1988. Primeiro, num recorte temporal de redefinição de direitos e deveres. Agora, num positivo quadro de confirmação.

Redigida pelas colaborações de 46 deputados estaduais, enfeixando 336 artigos e o Ato das Disposições Transitórias, que reúne outros 41 dispositivos, a Carta local é mais do que a formalidade de adequação do Ceará ao regramento da União, mas a consolidação de um fortalecimento e da autonomia das instituições que havia anos eram reclamados pela sociedade.

Estão no texto os alicerces e as estruturas do funcionamento dos poderes, as normas que regem os desenvolvimentos econômico e social, a educação, a segurança e a saúde pública, entre todas as demais responsabilidades do Estado e os demais direitos dos cearenses.

Vale, dessa maneira, observar o que apontou o jurista Paulo Bonavides, referência contemporânea do Direito Constitucional não só no Brasil, mas no mundo todo. Registrou ele que o novo Direito que a sociedade industrial produziu não haveria de ser outro senão o Direito Constitucional do Estado Social. “É Direito que exprime com toda a força a tensão entre a norma e a realidade, entre os elementos estáticos e os elementos dinâmicos da Constituição, entre a economia de mercado e a economia dirigida, entre a liberdade e a planificação, entre o consenso e o dissenso, entre a harmonia e o conflito, entre plurarismo e o monismo, entre representação e democracia, entre legalidade e legitimidade e até mesmo entre partidos políticos e associações de classe, profissões e interesses, as quais aparecem invariavelmente na crista da revolução participatória de nosso tempo”, escreveu.

Pode-se acrescentar, pois: é o Direito que se exprime pela cidadania.

Assinada pelo então presidente da Assembleia Legislativa, o ex-deputado José Albuquerque, outra definição se fundamenta sobre princípios clássicos, mas de forma incomum, admite que até então “o caminho trilhado pelo Brasil foi árduo e repleto de avanços e retrocessos, a cada rompimento e posterior restabelecimento da ordem democrática”.

Essa é uma expressão que se pode considerar essencial para o fazer político, até porque se reveste da tão necessária e cobrada autocrítica cabível à classe política. E é aí que se robustece com maturidade e perspectivas. Nesse ponto, pode-se até mesmo encontrar um fim didático na Constituição – afinal, está lá uma inescondível capacidade de ensinar homens e mulheres a conviver na democracia. E isso é inestimável;