Editorial: Analfabetismo persiste

Numa época em que as produções do conhecimento humano, de natureza tecnológica, ocupam cada dia mais todos os domínios do cotidiano, observa-se o aparente paradoxo da resistência de fenômenos associados ao passado. Vale a máxima do escritor canadense William Gibson, segundo a qual “o futuro já chegou. Só não está uniformemente distribuído”.

O “futuro”, às vezes, nem sequer é uma questão  tecnológica. O que falta ser uniformemente distribuído é, em muitas ocasiões, o básico, direitos tão elementar quanto o acesso a formações que oportunizem o desenvolvimento da competência leitora. O analfabetismo alcança cerca de 750 milhões em todo o mundo, de acordo com estimativas da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

Para agência, não há previsão de solução para ele em curto prazo, dado que as nações ao redor do planeta não apenas são ineficazes em freá-lo, como os números de pessoas incapazes de ler e escrever têm aumentado em diversas partes do mundo. No ano passado, a Unesco registrou 260 milhões de crianças e adolescentes fora das escolas – o número corresponde a uma massa humana superior à população brasileira.

De acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no ano passado, o País contava com 11,3 milhões de pessoas analfabetas, consideradas apenas aquelas com idade igual ou superior a 15 anos. Esse retrato traduz os efeitos históricos do racismo no Brasil, ao mostrar, ainda, que negros e pardos são os grupos mais afetados, com mais que o dobro do percentual de analfabetos entre brancos. No grupo etário de maiores de 60 anos, o número é quase três vezes maior, quando comparados negros e pardos com brancos.

No contexto brasileiro, o Ceará apresentou uma melhora em sua situação no último ano. Saiu da 5ª para a 6ª posição do Brasil em analfabetismo, mas mantém índices elevados de pessoas incapacitadas de ler e escrever. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada pelo IBGE, mostram que 13,3% dos cearenses com 15 anos ou mais são analfabetos. Em números absolutos, isso significa 956 mil pessoas. Percentualmente, o indicativo está alinhado com o da média da região Nordeste, mas é superior ao da média nacional – de 6,8%.

Especialistas convergem no prognóstico: investir mais, e de forma eficiente, não apenas na educação básica, como na Educação de Jovens e Adultos (EJA). O entendimento já difere de propostas populares no passado, que previa centralizar os investimentos em crianças na idade escolar e esperar que a sucessão geracional, com o tempo, desse conta da erradicação do analfabetismo. A alfabetização é fundamental para o pleno exercício de obrigações e direitos por parte de jovens e adultos, como previstos na Constituição Federal, e indispensável em qualquer regime que honre sua condição democrática.

Indicativos do tipo são essenciais para reforçar a importância capital da educação para um País. Investimentos na área devem ser garantidos e cortes minimizados, para que se possa pavimentar um futuro mais esclarecido para o Brasil e erradicar o que ainda causa vergonha de seu persistente passado.


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