Editorial: A velha mácula das 'fake news'

O País está às vésperas de encerrar mais uma disputa eleitoral - como todas as demais, importantíssima nas condições de baliza da democracia e de fator da determinação das vontades do povo. Mas essa, em especial, traz a mácula das notícias falsas, ou "fake news", expressão em inglês já consagrada para designar um preocupante fenômeno da comunicação que se estende para a política.

É válido, primeiramente, lembrar que as fake news permeiam a história mundial. Podem ser identificadas desde o Império Romano, passando pela Primeira e pela Segunda Grande Guerra, pela Guerra Fria e pelas turbulências e inovações dos anos 1960 e 1970 na Europa e na América Latina. Estiveram também nos tempos do Brasil Império, do Estado Novo, do regime militar e da redemocratização.

Atualmente, porém, encontraram na tecnologia da Internet e dos telefones móveis espetaculares campos de disseminação. E, nesse cenário, ganharam uma perigosíssima dimensão, capaz de abalar as estruturas da democracia a partir da deformação de fatos ou mesmo da criação de mentiras.

Mas que ninguém se engane ou se dê por vencido pela característica endêmica das fake news. Essas permanência e persistência não lhes podem servir como autorização ou, no limite da análise, como simples justificativa para existirem. Afinal, são crimes e como crimes devem ser repudiados, combatidos e exemplarmente punidos. É preciso, à frente de tudo, ter recursos que as previnam.

É necessário destacar que não são exclusivamente os pleiteantes de cargos públicos os atingidos. As instituições públicas também terminam vitimadas - o que também se pode dizer dos interesses do cidadão em dispor de mecanismos eficientes para a distribuição de informações e opiniões bem apuradas e, por isso, confiáveis.

A sociedade civil, a partir de seus mecanismos de organização e de seus instrumentos de funcionamento, finda igualmente fragilizada. Há um "efeito dominó" extremamente negativo que alcança a tudo e a todos.

A Imprensa, ao final, se torna refém, uma vez que restam desconsideradas as mais legítimas ferramentas de apuração de fatos, documentos e declarações, todas aprimoradas ao longo de séculos pela experiência e pelos meios acadêmicos.

Vale, nesse sentido, ter como referência a sequência de ataques que o Poder Judiciário e os magistrados têm sofrido, golpes que vêm acusando repetidamente. Não são apenas análises ou repercussões que extrapolariam as fronteiras, mas ameaças covardes e notícias falsas que, a grosso modo, visam a sustentar faticamente a argumentação deletéria.

A hostilidade tenta por em xeque até mesmo a eficiência do sistema de urnas eletrônicas, o qual vem funcionando sem sobressaltos há 22 anos e assegurando à democracia brasileira a vanguarda na captação e na apuração de votos. Sobre isso, o presidente do Supremo Tribunal Federal precisou se manifestar: "As urnas eletrônicas são totalmente confiáveis. Os sistemas são abertos para auditagem, a todos os partidos políticos", explicou o ministro Dias Toffoli, deixando escapar uma farpa de ironia em direção aos que questionam as urnas. "Tem gente que acredita em Saci Pererê".

Costuma-se, enfim, atribuir ao político alemão Joseph Goebels (1897-1945), ministro da Propaganda de Adolf Hitler, uma frase tão desprovida de caráter quanto de moral ou ética, posto que se revela como um ensinamento contrário à tão necessária verdade: "Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade". Em pleno século XXI, deve-se avaliar com extrema apreensão que o mau instinto nazista, condenável sob quaisquer aspectos, emerge em meio à modernidade da tecnologia.


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