Editorial: A conta de luz do produtor rural

Erguem-se os produtores rurais do Ceará contra nova tentativa da Secretaria da Fazenda do Governo do Estado no sentido de taxar com alíquota de 27% do ICMS a conta de energia elétrica dos que produzem na agropecuária cearense. Essa atividade - que, no semiárido nordestino, é, na verdade, de alto risco - está isenta desse tributo em quase toda a região Nordeste. Produzir em condições hostis de clima e solo - como são as do sertão da região Nordeste - já é um grande desafio para agricultores e pecuaristas. Fazê-lo sob o peso de uma carga tributária que ferirá a legislação se for mesmo estabelecida, como afirma parecer do advogado tributarista Hugo de Brito Machado, é tornar esse desafio algo quase impossível de ser superado, como reclamam os produtores.

Além da raquítica pluviometria dos últimos seis anos, que secou a maioria dos açudes do Ceará, inclusive alguns de grande porte, como o Banabuiú; da dificuldade de extrair do subsolo a pouca água que nele existe para a irrigação das fazendas produtoras de forrageiras para o gado bovino, de grãos alimentícios para a população e de frutas para os mercados interno e externo; não fossem suficientes as deficiências da logística de transporte próprias do Interior nordestino; se tudo isso não bastasse, surge agora, outra vez, a iniciativa dos auditores da Sefaz, que, desejando otimizar a receita do Tesouro estadual, pretendem - por meio de resolução a ser votada na próxima reunião do seu Contencioso Administrativo Tributário (Conat) - inserir na conta de luz do produtor rural - Pessoa Física ou Jurídica - a alíquota referente ao ICMS.

Empresas de médio e grande portes que atuam no Interior do Ceará já advertiram: deixarão de produzir aqui e transferirão para outros estados - como o Piauí, o Rio Grande do Norte ou a Bahia, onde a atividade rural goza de isenção tributária - não só seus laboratórios e equipamentos, mas também, e principalmente, os milhares de empregos diretos que hoje geram na geografia deste Estado.

Há outro fator que merece ser destacado nesta questão: a Enel - que distribui a energia elétrica no território cearense - também se vê ameaçada pela intenção da Sefaz. A empresa, uma multinacional controlada por capital italiano, será prejudicada pelo aumento da inadimplência.

Creem seus diretores que os pequenos produtores rurais dificilmente terão condições de suportar mais essa carga tributária, o que resultará no corte do fornecimento da energia. Aí, então, estará criado mais um grave problema social.

Para evitar o impasse, o Governo do Estado e as lideranças da agropecuária cearense, a começar pela Federação da Agricultura (Faec), devem reunir-se em busca de uma solução negociada, algo a que já se dedicam os fóruns informais do setor. Sabe-se que, no Rio Grande do Sul, quando impasse semelhante aconteceu, chegou-se a um consenso, por meio do qual foi estabelecida uma alíquota de 12% do ICMS que passou a incidir sobre o valor da conta de energia elétrica consumida pelos estabelecimentos rurais gaúchos. Um acordo semelhante - provavelmente com alíquota menor, tendo em vista as difíceis condições de produzir no semiárido nordestino - poderá ser tentado. Os líderes da agropecuária cearense não têm dúvida de que o governador Camilo Santana, ao tomar ciência da exata dimensão da questão, adotará uma decisão que, ao mesmo tempo, resguardará os interesses do Governo do Estado e os do universo dos produtores rurais. Se 2019 trouxer de volta o El Niño, como preveem os institutos que monitoram o clima, haverá a uma só vez carência de água e excesso de tributo sobre a produção agropecuária. Essa conta não fechará.


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