Arroto choco

Zeca Vaqueiro vinha, nos últimos tempos, amofinado e tristonho pelos cantos da morada. Nem aboiar, sua paixão, dava ânimo. Bastava alimentar-se, em pequena ou grande quantidade, e sofrer o que jamais sentira em seu viver. Aos vizinhos e amigos contava os sintomas. Chás e mezinhas de todos os tipos usou. Rogou milagres, com promessas a realizar, aos santos e santas. Mas alívio, que era bom, nada. A queixa continuava a mesma. "Premêro u'a gastura danada na boca. Adispois, u'a dor da molesta bem no entre peito. E aí, u'a água quente e fedorenta subindo da boca do estombo inté a guéla, queimando tudo lá dentro. É o diacho atazanando este fiel cristão!". Até que, não mais resistindo, desceu a serra e foi consultar-se no posto de saúde da cidade. Ao médico, relatou aquele padecer, inclusive, usando mímica no complementar de cada detalhe. Depois de meticuloso exame e perguntas, o doutor diagnosticou a enfermidade como refluxo. Medicou comprimidos a serem ingeridos durante quinze dias. Recomendou tomar com "constância" e, quando o medicamento terminasse, voltasse, trazendo a receita e informando o resultado. Zeca apanhou o medicamento e retornou para casa. Passada uma semana, procurou o clínico, dizendo que o remédio havia acabado. "Impossível! Você recebeu 30 unidades e recomendação de ingerir duas diariamente, portanto, não findariam em sete dias". O respostar veio imediato: "O dotô num diche qui eu tumasse cum Constança? A muié, mermo sendo teimosa, tomô à força, mais tomô! Cuma si vê, prus dois só deu metade do mês! Vim buscá mais!". Coitada de dona Constância...

Geraldo Duarte
Advogado e administrador