Armadilha na “MP do bem”

Com a edição da Medida Provisória 252 o governo federal estaria concedendo benefícios aos contribuintes, razão pela qual vem sendo a mesma referida pela imprensa como MP do bem. No seu bojo, entretanto, estão algumas maldades que a fazem desmerecer tal qualificação. Além de outras, uma que consubstancia verdadeira armadilha que afeta o direito de defesa dos contribuintes, mutilando seriamente os Conselhos que no âmbito do Ministério da Fazenda julgam os litígios em matéria tributária.

O artigo 68 da referida MP diz que o ministro da Fazenda poderá criar, nos Conselhos de Contribuintes, Turmas Especiais, por prazo determinado, com competência para julgamento dos processos que especificar em função da matéria e do valor. Essas turmas julgadoras serão compostas por quatro membros, sendo um conselheiro presidente da Câmara, representante da Fazenda, e três conselheiros com mandato por tempo determinado, designados entre os conselheiros suplentes. Fica a cargo do ministro da Fazenda a disciplina do funcionamento dessas Turmas Especiais, inclusive quanto à matéria e o valor dos processos que deverão julgar.

Assim, se convertida em lei a referida Medida Provisória, com a disposição em tela, quando as turmas julgadoras de primeira instância examinarem processos envolvendo quantias significativas, e constatarem que os argumentos em defesa do contribuinte são consistentes e por isto mesmo, provavelmente, serão acolhidos pelos Conselhos de Contribuintes, darão ciência disto ao ministro da Fazenda que cuidará de instituir Turmas Especiais temporárias para o julgamento desses processos, subtraindo-os da competência dos órgãos permanentes. Cuida-se, portanto, de órgãos de julgamento administrativo que podem ser constituídos depois de instaurado o litígio que deverão julgar, e aos quais o Ministério da Fazenda poderá atribuir competência para julgar processos que serão subtraídos da competência dos órgãos existentes no Ministério da Fazenda, com funcionamento ordinário e permanente.

Recorde-se que o governo, com a Medida Provisória 232, que elevou a carga tributária, pretendeu excluir para a maioria dos casos, o recurso para os Conselhos de Contribuintes, estabelecendo o julgamento em instância única. A forte pressão da opinião pública fez com que a referida Medida Provisória, que provavelmente não seria aprovada pelo Congresso Nacional, fosse revogada. Permaneceu, todavia, a vontade de esvaziar os Conselhos de Contribuintes, que são valiosos instrumentos para o controle do arbítrio do fisco. Agora volta o governo a atingir os Conselhos de Contribuintes, abrindo ensejo à instituição de verdadeiros tribunais de exceção. No dizer autorizado de De Plácido e Silva, “exceção é qualidade que se atribui ao tribunal quando, havendo tribunal comum, a que se afeta determinada questão, em razão da pessoa, ou pela natureza excepcional do fato, é subtraído do tribunal comum para ser entregue ao excepcional”. (Vocabulário Jurídico, Forense, Rio de Janeiro, 1987, Vol. IV, Pág. 419).

O art. 68, verdadeira armadilha encartada na MP 252, que é do bem, mas nem tanto, deve ser extirpado pelo Congresso Nacional por ser flagrante a sua inconstitucionalidade. Tão flagrante que não pode ser posta em dúvida por quem quer que tenha noções elementares de Direito, pois a Constituição Federal, ao cuidar dos direitos e garantias fundamentais afirma, com clareza meridiana, que “não haverá juízo ou tribunal de exceção” (Art. 5º, inciso XXXVII).

Professor Titular de Direito Tributário da UFC