Agonia e êxtase da criação

Poucos filmes são tão esclarecedores em termos do que é a criação artística como "Agonia e Êxtase", de 1965. Dirigido por Carol Reed, enfoca os quatro anos em que Michelangelo dedicou-se à pintura dos afrescos da Capela Sistina.

Baseado no romance de Irving Stone, o filme foca a relação conturbada entre o artista italiano, que se considerava muito mais um escultor do que um pintor, e o papa Julio II que, por ter encomendado a obra, exigia de Michelangelo tanto planejamento quanto cumprimento de prazos.

Embora a obra esteja marcada pela ficção, os diálogos entre o poderoso que solicita o trabalho e paga por ele, e o artista que precisa de dinheiro, mas que não abre mão da liberdade e seu processo criativo. É muito interessante e elucidativo. Afinal, essa relação entre o não ter limites da arte e a obediência a normas contratuais permanece complexa até hoje.

As pinturas de Michelangelo na Capela em homenagem a Sisto IV, tio de Julio II, têm como tema os nove episódios do Gênesis. E, para criar esse mundo, o artista tem que recriar a si mesmo. A jornada não foi simples, mas chegou a um termo que tornou a Capela uma referência, sendo utilizada até hoje para realizar os Conclaves, reuniões dos cardeais para escolher um novo Papa.

Se a agonia de criar está diretamente relacionada a inseguranças e ao medo de estar sempre aquém daquilo que se deseja realizar, o êxtase ocorre quando a obra está finalizada. O ensinamento nesse processo é que as dificuldades encontradas no processo criativo podem ser desafios que funcionam como porta de entrada para um amanhã em que a arte gere uma espécie de intervalo de prazer na dolorida existência.

Oscar D'Ambrosio

Doutor em Educação, Arte e História da Cultura