A criminalização da política

A Operação Lava-Jato impôs ao cenário político brasileiro consequências positivas e negativas. As positivas, que são muitas e por demais conhecidas, deixarei de reproduzir, até para evitar o lugar-comum. Posicionarei a lente desta análise sobre as negativas, que precisam ser ditas, mas que costumam ser abafadas em nome de argumentos eufóricos do tipo "para varrer a corrupção do Brasil, vale tudo".

O efeito que reputo mais deletério causado pela dita Operação é a criminalização da política. Poderia mencionar excessos cometidos contra indivíduos, como conduções coercitivas arbitrárias, quebra e divulgação abusiva de diálogos telefônicos íntimos e sem relevância penal, espetacularização de algumas entrevistas coletivas de delegados e procuradores com propósitos midiáticos e incendiários etc.

Todavia, abordarei prejuízos institucionais, em vez dos individuais (embora eu saiba que violações a direitos fundamentais de um indivíduo prejudicam toda a coletividade).

A criminalização da política consiste em deslocar para a jurisdição penal praticamente todas as desvirtudes da arena político-partidária, numa espécie de megalomania penal, de modo que a responsabilização política, antes exercida por meio dos processos de fiscalização e reprovação de contas, cassações de mandatos, inelegibilidades ou derrotas nas urnas já não bastam.

É preciso cada vez mais prender o político para proteger o eleitor. Resultado: este último passa a enxergar o exercício do voto como um frívolo e pesado ônus e a democracia representativa como uma farsa. Cenários assim fazem surgir três "ismos": autoritarismo, populismo e falso moralismo.

Em grande medida, a degeneração da política no Brasil se deve a fatores institucionais e sociais anteriores à Lava-Jato, tais como a hiperfragmentação partidária, o fisiologismo, o foro privilegiado, a impunidade e a alienação política do eleitor.

É preciso denunciar os excessos já cometidos pela Operação (até mesmo para preservá-la!), sobretudo quando esta apresenta o punitivismo como salvação à democracia brasileira. Só a política conserta a política.

É preciso crer que a solução não está apenas nos tribunais, mas principalmente nas tribunas, de onde devem sair as verdadeiras reformas, constitucionais, eleitorais e partidárias, que aprimorem a responsabilidade política, o sistema representativo e a disciplina dos partidos.

Luis Lima Verde Sobrinho
Mestre em Direito Constitucional