'Sem China, agricultura do país não seria o que é', afirma Blairo Maggi

Ele não vê como iminente a saída da ministra da Agricultura, Tereza Cristina

Escrito por Estadão Conteúdo ,
Foto: Foto: Beto Barata/PR

Um dos maiores produtores de soja do Brasil, Blairo Maggi não vê como iminente a saída da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, do governo. Criticada por uma ala bolsonarista por pertencer ao partido DEM, dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, Tereza Cristina virou alvo de integrantes do governo e agricultores mais radicais.

"A ministra tem apoio dos líderes do agronegócio e da grande maioria do governo. Há pessoas no governo querendo mexer seus pauzinhos para ganhar espaço. Não é uma situação fácil porque ali, mesmo com todo o vento a favor, é difícil trabalhar", diz Blairo, que foi ministro da Agricultura no governo de Michel Temer.

Blairo Maggi fez pesadas críticas a integrantes do governo e do agronegócio que associam os prejuízos com a pandemia do novo coronavírus à China. "Acho totalmente equivocado e de má-fé ir contra o nosso maior parceiro comercial. Se não fosse a presença da China, a agricultura do Brasil não seria do tamanho que é", disse ele. "A tirada de um parceiro importante por causa de uma ideologia política é uma tragédia." A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como o sr. vê as trocas recentes de ministros na Saúde e na Justiça?

Analisando friamente, penso que o presidente (Jair Bolsonaro) ficou numa posição muito complicada nessas duas substituições - saída do Luiz Henrique Mandetta (Saúde) e de Sérgio Moro (Justiça). No fundo, eu enxergo como desafio da autoridade presidencial. Se o presidente não tomar medidas firmes, não mostrar comando, a gente não vai para lugar nenhum. Vira uma bagunça.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, tem sido alvo de críticas por pertencer ao DEM. O sr. vê risco de saída dela da pasta?

A ministra tem o apoio dos líderes do agronegócio e da grande maioria do governo. Há pessoas no governo querendo mexer seus pauzinhos para ganhar espaço. Mas eu vejo a Tereza prestigiada pelo governo. Não é uma situação fácil porque ali, mesmo com todo o vento a favor, é difícil trabalhar. Ela estando bem com o Congresso e a frente parlamentar (da Agricultura), as chances de ela seguir no governo são grandes.

O governo entrou em rota de colisão com a China. A ministra foi importante para costurar essa boa relação comercial. Como o sr. avalia essa questão?

Acho equivocado e de má-fé ir contra o nosso maior parceiro comercial. Se não fosse a presença da China, a agricultura do Brasil não seria do tamanho que é. O comércio estar desobstruído é muito importante. Fico muito chateado com agricultores apoiadores do governo que pensam diferente. O governo está aí para nos ajudar e não para nos atrapalhar. A China coloca dinheiro aqui no Brasil e compra nossa mercadoria. Quando falo de crédito, não falo só do dinheiro para plantar soja, milho ou trigo. A tirada de um parceiro importante por causa de uma ideologia política é uma tragédia.

Há risco de o País retroceder nessa área?

Conheço bem a China. Estive lá muitas vezes quando era ministro. Não temos nada a ver com a posição política que cada país escolhe. Os chineses gostam muito do protocolo. Não faz sentido o ministro da Educação (Abraham Weintraub), o filho do presidente (Eduardo Bolsonaro) e agricultores falarem mal do país. Só temos a perder com essa política que o Bolsonaro tenta fazer com os Estados Unidos. Temos de ver que, numa negociação maior, os EUA são pragmáticos e podem deixar o Brasil de lado. Esse alinhamento não serve para nós. O Brasil tem de olhar de forma pragmática. Quando era ministro, a nossa chancelaria sempre tentava dar tranquilidade aos chineses e explicávamos que não estávamos alinhados com ninguém. Infelizmente, me parece que isso ficou esquecido e é preciso recuperar. O Brasil não pode abrir mão da China e de nenhum país.

Entidades importantes, como a Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja) nacional e de Mato Grosso, se posicionaram de forma diferente…

Falei para as lideranças do Aprosoja nacional e de Mato Grosso que eles não representam o Brasil politicamente. Associação é feita para defender os interesses dos produtores com o governo de plantão. Ponto. Se você tem preferências partidárias ou ideológicas, você se manifesta no seu campo pessoal.

O sr. acha que o agronegócio brasileiro está enfraquecido no exterior?

Todo mundo precisa comprar comida. Ninguém vai deixar de comprar do Brasil amanhã porque o ministro da Educação falou besteira. Mas, no médio e longo prazos, se você não é um país confiável de fornecimento a outro país, você pode ficar de fora de um planejamento e perder espaço.

Quais devem ser as prioridades do agronegócio neste momento?

É preciso se preocupar com a questão de crédito para o setor como um todo. Em momentos de dificuldades financeiras, é normal que os agentes financeiros recuem um pouco e o setor passe por dificuldades, com as recuperações judiciais em curso. Isso afasta os financiadores. Eu defendo uma mudança na legislação, que é a exclusão de valores financeiros dos financiamentos de custeio imediato, de não considerar isso dentro de um bolo geral da recuperação judicial. Outro ponto é a segurança do alimento e rastreabilidade.

Como o agronegócio está sendo afetado por essa crise?

O agronegócio está indo bem. A crise mudou a consciência de todos envolvidos no combate (aos efeitos da crise).

Mas há setores, como o sucroalcooleiro, que sairão machucados…

O etanol é muito vinculado ao petróleo. Derreteu. Muitos produtores de milho que forneciam para o setor de etanol também foram afetados. Outro setor ligado ao petróleo é o algodão. Tecidos que competem com os fios sintéticos também caíram. É diferente de comida.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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