Reforma da Previdência deve forçar País a poupar mais

Taxa de poupança do Brasil é atualmente uma das menores entre os principais países da América Latina

Escrito por Estadão Conteúdo ,
Legenda: O saldo total da poupança atingiu R$ 800,647 bilhões, já considerando o rendimento de R$ 2,989 bilhões creditado no mês
Foto: Foto: Arquivo

Bem inferior à média global, a taxa de poupança do Brasil é hoje uma das menores entre os principais países da América Latina (exceto Argentina), "lanterninha" entre os Brics (grupo que inclui Rússia, Índia, China e África do Sul) e baixa em relação à maior parte das nações desenvolvidas.

Em 2017, o índice brasileiro era de 14,8% do Produto Interno Bruto (PIB). Apesar de ser influenciada pela crise econômica, a pouca disposição nacional em guardar dinheiro não é explicada só por ela.

Segundo economistas ouvidos pela reportagem, o sistema de bem-estar social - que garante direito universal a educação, saúde e aposentadoria - é um fator que pesa mais na justificativa do fenômeno. 

A reforma da Previdência pode ser um incentivo para o aumento das poupanças individuais no País, apontam especialistas. Embora a Constituição de 1988 garanta acesso universal à saúde e à educação, o cidadão sabe que a qualidade dos serviços deixa a desejar.

Não é o que ocorre com a aposentadoria: apesar do alerta dos atrasos recentes no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Norte, os benefícios são historicamente pagos em dia.

"Quanto mais a renda futura é garantida pelo Estado, menor o incentivo individual para poupar. O que as crises fiscais em nível estadual mostraram é que a garantia do Estado não é mais absoluta", diz Mário Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco.

O economista Simão Silber, da FEA-USP, lembra que o Brasil já gasta "mais que a média da OCDE, o clube dos países ricos, com aposentadoria".

Como a "nova Previdência" deve resultar no pagamento de benefícios menores, parte da responsabilidade da renda após a aposentadoria será transferida ao cidadão - incentivando reservas.

"A correlação é simples: se antevejo o descasamento entre minha renda e os desejos para o futuro, a poupança cresce" afirma Ricardo Brito, professor da escola de negócios Insper. 

Ao relacionarem o aperto na Previdência à elevação da poupança, economistas dizem que o exemplo mais concreto da tendência é a China, onde a taxa de reservas subiu para quase 50% do PIB após a reforma previdenciária, mesmo com renda média semelhante à brasileira.  A "mexida" nas aposentadorias também ampliou reservas em países como Chile e Itália, argumentam especialistas .

Brito, do Insper, rechaça a noção de que o brasileiro é pouco cuidadoso com as finanças. Para ele, apenas a pequena parcela de trabalhadores que ganha mais do que o teto do INSS - de R$ 5,8 mil - teria hoje incentivo para poupar mais visando à aposentadoria.

"O brasileiro seria imprevidente se tivesse uma expectativa de queda brusca de renda na velhice. Nas condições atuais, a poupança é suficiente, pois a taxa de reposição das aposentadorias (quanto se ganha em relação ao salário da ativa) é de cerca de 80%. É muito diferente do que ocorre lá fora".

Pesquisa da FenaPrevi, federação que reúne os planos abertos de previdência privada, corrobora a confiança do brasileiro no sistema público: entre os entrevistados no levantamento realizado em 2018, 76% disseram que dependerão "muito" ou "totalmente" da renda do INSS após a aposentadoria. 

Com redução de garantias, porém, o comportamento relativo à poupança tende a se alinhar ao de outras partes do mundo. "A evidência da teoria econômica é de que o 'bicho-homem' é mais parecido do que se imagina", diz Samuel Pessoa, pesquisador do Ibre-FGV.  "Sob as mesmas regras, as pessoas tendem a se comportar de forma semelhante. Se um chinês vivesse no Brasil, provavelmente pouparia menos".

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