Em gravação, sócio de corretora acusada de golpe admite risco de ser preso

Proprietário Geraldo Alves Vieira admite ter perdido cerca de 75% dos fundos da conta movimentada pelas aplicações

Escrito por Bernadeth Vasconcelos , bernadeth.vasconcelos@verdesmares.com.br
Legenda: Uma das vítimas do Ceará, que aplicou fundos na Miner Investimentos, teve prejuízo financeiro de R$ 150 mil rais
Foto: Foto: Divulgação/B3

Ligações entre um cliente e um dos proprietários da corretora Miner Investimentos, que encerrou as atividades e deixou investidores no prejuízo, revelam que o sócio tinha consciência de que poderia ser preso por irregularidades nas gestões dos ativos. O proprietário Geraldo Alves Vieira admite ter perdido cerca de 75% dos fundos da conta movimentada pelas aplicações. Em ligação, cliente cobra justificativas para tamanho prejuízo, já que nos contratos os riscos eram mínimos. 

Na conversa, registrada por um dos clientes no Ceará, o investidor questiona se haveria riscos de o percentual prometido pela firma não ser debitado em sua conta. Em resposta, Vieira afirma que todos os sócios receberiam o valor proporcional e que assumiria todas as consequências judiciais, caso o processo resultasse em sua prisão.

Confira a conversa completa:

O sócio também explica que não haveria chances de negociação com a CVM para continuar operando. “A CVM tem autonomia de chegar e falar: 'olha, você não pode esperar eu te dar um 'stop order' e você não pode atuar nas corretoras e acabou'. Até provar que lagartixa é jacaré, já era. Não tinha como sair”, afirma no áudio. 

No Estado, alguns investidores não conseguiram resgatar qualquer recurso aplicado na empresa, conforme tinha sido prometido pela Miner. Depois do anúncio de encerramento de suas atividades em agosto deste ano, a empresa se comprometeu a transferir os recursos disponíveis, relativos a 24,73% do total investido, a todos os sócios registrados na firma.

São cerca de 200 clientes prejudicados com a situação no Ceará. Em um escritório de advocacia que atende dez clientes em Fortaleza, o prejuízo avaliado é em torno de R$ 755 mil. 

Em agosto deste ano, a firma anunciou a finalização de suas operações, após ter recebido uma intimação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por não possuir autorização para atuar no mercado financeiro. Logo após a notificação, a Miner enviou um e-mail a todos os sócios decretando o fim de suas atividades.   

Nesta semana, a Justiça de São Paulo determinou o pedido de bloqueio dos bens da empresa, assim como as contas pessoais de Geraldo Alves Vieira e Rene Antônio da Silva, proprietários da corretora. Com isso, os dois serão investigados por possível desvio de ativos dos cotistas.  

Sem justificativas

Contrária  à versão do proprietário da Miner, o advogado Rômulo Marcel, que atende os 10 clientes na Capital, aponta que alguns investidores do Ceará não receberam nenhum valor referente ao percentual prometido pela empresa. “Nem todas as vítimas receberam os 25% que foram prometidos pela Miner”, diz.

Sobre a justificativa usada para decretar o encerramento de suas operações, o advogado pondera que a alegação não tem sentido. “Há 10 anos, a CVM já diz que esse tipo de empresa não pode operar no mercado de capitais. Com isso, usar a desculpa que o órgão alterou seu posicionamento e isto tornou a operação irregular não procede decididamente”, diz.

Na ligação, Vieira afirma que, no ano passado, recebeu uma jurisprudência da CVM em relação à proibição de empresas do seu segmento operarem no mercado de investimentos, já que a firma atua aplicando fundos de cotistas em outras corretoras. O cliente, por sua vez, alegou no que não foi informado sobre o alerta, e o proprietário o contestou, dizendo que todos os clientes sabiam da situação.

O advogado defende que as vítimas não tinham total clareza da situação quando fechavam acordos com a Miner. “Indagados sobre qualquer tipo de circunstância sobre a autorização da CVM para operar, eles diziam que esta autorização era irrelevante ou desnecessária. Se você está lidando com pessoas que não são especialistas em mercado financeiro, é obvio que essas pessoas não têm como proferir se aquela justificativa realmente procede”, aponta, 

Na ligação, a vítima também questiona o valor dos ativos da Miner, diante do número de clientes registrados na firma (cerca de mil) e pergunta se parte dos recursos aplicados serão devolvidos. A vítima, que aplicou R$ 150 mil reais, receberia cerca de R$ 40 mil, equivalente ao percentual de 24,73%. Vieira afirma enfaticamente que o valor será debitado “Será. Eu tenho R$ 22 milhões na minha conta. Eu tenho R$ 22 milhões na minha conta, das operações que a gente foi liquidando. Esse dinheiro vai ser todo pago aos sócios”, acrescenta.  

Vieira afirma que a instabilidade do dólar foi um dos motivos da perda de 75% dos rendimentos dos clientes. “Se você tem R$ 22 milhões na conta, e operou com fechamento de 75%, você tinha uma carteira de R$ 100 milhões, é isso? É que essa diferença toda eu juro que não entendo onde ela tá”, questiona o cliente. O sócio, por sua vez, aponta que, diante do cenário instável do dólar, os recursos foram desvalorizados. “Você pode perder R$ 1 milhão de reais em um minuto. Ou ganhar em 1 minuto. É um investimento de altíssimo risco”, argumenta.  

Novos relatos

Desde o começo do ano, Geraldo Alves Vieira e Rene Antonio da Silva realizavam palestras em diversos pontos do País para atrair mais clientes, inclusive no Estado. Com a promessa de poucos riscos nos investimentos aplicados, foi assim que outro cliente cearense se tornou investidor na Miner, em janeiro deste ano. O lance inicial era em torno de R$ 10 mil. 

“O Geraldo veio palestrar. Ele me tirou dúvidas por telefone por coisas mais específicas que eu tinha. Uma das dúvidas era como saber que eu estou associado a Miner. Ele disse que o investidor participava dos lucros e prejuízos que virão acontecer. Ele confirmou isso nas palestras que ele fazia", comenta um dos clientes da empresa.  

Os consultores da firma patrocinavam palestras para clientes e futuros sócios para atrair mais visibilidade ao negócio. “O discurso era tão seguro que a gente acabou acreditando. Nas palestras, o Geraldo garantiu que os riscos eram mínimos e que a operação dele era de renda fixa e isso foi o que me fez investir na empresa”, revela.  

Durante seis meses, todos os registros dos rendimentos deram certo. Mas em julho, algumas atualizações atrasaram, conforme descrições da vítima. “Durante esses 6 meses, algumas atualizações diárias atrasaram. Eu tenho um grupo de amigos que também participava. Depois, alguns amigos fizeram retiradas e deu tudo certo. Em agosto, ele chegou com demonstrativo da perda de 75% de rendimentos. E aí a gente foi buscar retornos e foi uma confusão geral”,  aponta o cliente.  

Após o anúncio de fechamento da empresa, o investidor teve um prejuízo de R$ 103 mil. No total, ele aplicou R$ 135 mil em seis meses. “No contrato, ele especificou que a empresa tinha um controle de risco muito bom, ele não poderia ter perdido 75% dos rendimentos. Na minha ideia ele já estava com prejuízo e não estava passando para os clientes. Ele não cumpriu os termos que foram acordados", pontua. 

Em sua defesa, a Miner alegou que todos os sócios da firma receberão os 25% dos ativos da empresa. “Todos receberão os valores a que tinha direito, descontadas as perdas”, informou. E que está atendendo todas as exigências da Justiça no fornecimento de informações e documentos de suas atividades. Em relação às supostas conclusões das vítimas de terem sido vítimas de golpes, a assessoria esclareceu que “Se golpe houvesse, não teria devolução de dinheiro alguma”  

 

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