Centro é palco democrático para empreendedores e consumidores

Diversidade fortalece cultura e negócios que persistem no local apesar das dificuldades e depositam esperança na requalificação do bairro

Escrito por Ingrid Coelho/Dháfine Mazza , negocios@diariodonordeste.com.br

Com o passo apertado, o consumidor cruza a Praça do Ferreira em busca de um estabelecimento específico. No caminho até lá, a atenção se perde várias vezes. Em cerca de dois minutos caminhando pelo espaço, alguém esbraveja palavras, o que seria assustador se quem passa pelo local ao menos duas vezes por mês não soubesse que, ali, no coração da Cidade, personagens já cativos no imaginário fortalezense costumam fazer suas aparições que dificilmente passam despercebidas.

Não demora muito até que um pequeno conglomerado de pessoas se forme. Na calçada lateral da Praça, celulares são posicionados a fim de filmar o espetáculo de um velho conhecido de quem passa pelo Centro: o "Quebra-Coco".

Enquanto garante o entretenimento de quem passa pelo local, o homem, também conhecido como Edson "Maluco", promete: "vou quebrar o coco na bunda e na cabeça". Enfileira os frutos e começa quebrando os cocos com a mão. Alguns transeuntes seguem viagem. "Minha filha, você é de onde?", pergunta. Antes mesmo que uma resposta seja ouvida, diz: "pode filmar, viu, filma aqui que eu vou quebrar o coco, ó", graceja.

Não muito longe dali, na frente do Cineteatro São Luiz, o venezuelano Yorge Ruiz e sua cachorrinha se preparam para performar uma estátua viva. Antes mesmo que ele comece, um grupo em coro invade o quadrilátero da Praça do Ferreira aos gritos de "Abrace". Abraçam o público que assiste ao espetáculo do "Quebra-Coco", Yorge e até a cachorrinha ganha um carinho. Apenas mais um dia no Centro da Cidade.

A atenção também se perde em meio ao universo de negócios instalados ao redor do espaço. Entre os passos apertados no local, um destoa. Lentamente, a aposentada Francisca Rodrigues caminha pela Rua Guilherme Rocha esbanjando sorriso e simpatia enquanto espera até a hora de ir ao médico.

"Desde que tive um Acidente Vascular Cerebral (AVC), ando devagar. Eu desço do ônibus que vem de Aracati na Avenida Treze de Maio, pego outro ônibus e venho para cá. Sempre aproveito para dar uma passadinha nas lojas, levar algo para a minha neta, comprar alguma coisa de casa", diz. De acordo com a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL Fortaleza), o ônibus é meio de transporte para chegar ao Centro da Cidade para 65% do total que vai ao bairro.

Relevância

Dona Francisca, Yorge Ruiz e o "Quebra-Coco" se juntam a milhares de pessoas que circulam pelo Centro da cidade todos os dias, dando a cara do bairro que exerce um papel econômico de extrema relevância para Fortaleza e também para o Estado como um todo. Segundo a CDL Fortaleza, 7.800 negócios estão instalados no Centro da Cidade. Muitos deles estão espalhados ao redor de praças - o bairro abriga 32, ao todo, ocupando a Praça do Ferreira, hoje, lugar de destaque na região pela pujança econômica em seu entorno.

O professor da pós-graduação do curso de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Eustógio Wanderley Correia Dantas, explica que o Centro de Fortaleza passou por uma espécie de ressignificação ao longo dos anos.

"Antigamente, o Centro da Cidade era o lócus do lazer. A elite aqui se encontrava. O Passeio Público era um local bastante visitado. As praças foram reconfirguadas e a Praça do Ferreira acaba se instituindo como símbolo da Cidade, o comércio se coloca com força, então praça se transforma em lócus do comércio, mas concomitantemente continua sendo ocupada e validade enquanto espaço de socialização", explica o professor.

Requalificação

Dantas detalha ainda que, hoje, o Centro é visto por alguns segmentos como "um problema a ser resolvido" e chamou a atenção dos empresários do comércio, inclusive a CDL Fortaleza. "Problema porque alguns segmentos entendem a perspectiva da ocupação do Centro enquanto problemática, pela circulação nas ruas e pela concorrência dos ambulantes com o comércio estabelecido", diz.

Assis Cavalcante, presidente da CDL Fortaleza, arremata afirmando que a requalificação é reivindicação antiga dos lojistas. "É uma bandeira de 34 anos e, agora, a requalificação está sendo efetivada. O Centro passa por essa repaginação buscando trazer para o bairro aquele que existia outrora, mais dinâmico e com novas estruturas de lazer. De 32 praças, 90% já foram reformadas", diz.

As reformas fazem parte do projeto Novo Centro, da Prefeitura de Fortaleza, que prevê investimentos acima de R$ 150 milhões e inclui obras de infraestrutura e ações como a retirada dos moradores de rua que hoje vivem em locais icônicos do Centro, como a Praça do Ferreira. "A Praça do Ferreira, os cinemas, o Centro como um todo era uma coisa bucólica no passado. Acredito que vai melhorar com os projetos previstos", diz João Maia Santos Júnior, presidente da Associação dos Empresários do Centro de Fortaleza (Ascefort).

O titular da Secretaria Regional do Centro, Adail Fontenele, explica que as intervenções na região já começaram e devem ser concluídas até agosto de 2019. As primeiras obras, como a reforma do calçadão da Rua Guilherme Rocha, devem ser entregues ainda neste ano. Além das ações planejadas pela Prefeitura, o Governo do Estado também prevê obras no Centro de Fortaleza. 

A expectativa do poder público - e também dos comerciantes que atuam na região - é que as intervenções atraiam um número maior de consumidores, turistas e também de moradores para o Centro da cidade. "O Centro é uma região que tem resistido à proliferação dos shoppings em todos os bairros da cidade. Ele é muito grande no que diz respeito ao comércio, respondendo por 11% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) arrecadado pelo Estado em Fortaleza. Estamos fazendo tudo que a Prefeitura pode para fortalecer o Centro, para que a população ocupe o bairro.  Temos orgulho do trabalho que está sendo realizado. É uma região que precisa ser vista com muita responsabilidade", arremata Adail Fontenele.

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