Câmbio e pandemia fazem empresas investirem em projetos made in Brazil

A intenção é escapar das importações que estão mais caras diante da valorização de 25% do dólar desde o início da pandemia

Escrito por Estadão Conteúdo ,
Legenda: O economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin, acredita que haverá algumas mudanças substanciais no País
Foto: Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Duas explosões simultâneas, a do câmbio e a do coronavírus, estão levando empresas a ampliar o processo de nacionalização de matérias-primas e componentes. A intenção é escapar das importações que estão mais caras diante da valorização de 25% do dólar desde o início da pandemia, da dependência de poucos fabricantes globais e da escassez de produtos de combate à covid-19 por causa da alta demanda mundial.

Diante da falta generalizada de álcool gel, usado para evitar a disseminação da covid-19, a Klabin, fabricante de papéis para embalagens, desenvolveu um espessante em substituição ao carbopol, matéria-prima derivada do petróleo que transforma o álcool líquido em gel. O produto era 100% importado da China e, além da escassez, teve significativo reajuste de preço.

O novo produto é extraído da madeira e foi desenvolvido em apenas duas semanas numa parceria da Klabin com o Instituto Senai de Inovação e com a indústria de cosméticos Apoteka, que produzirá o álcool gel em sua fábrica de Leme (SP).

"Conseguimos, num momento crítico para nós e para o mundo, um substituto do carbopol derivado da microfibra celulósica extraída de nossas florestas o que é muito bom em termos de sustentabilidade pois é um produto renovável", afirma Carlos Augusto do Amaral Santos, gerente corporativo de P&D da Klabin. A empresa já entrou com pedido de patente.

O novo espessante também tem outras aplicações, como em fórmulas de cosméticos e na própria produção de papel. "Isso abre uma possibilidade grande de mercado interno e, no futuro, de exportar, dependendo da nossa estratégia", diz Santos.

O economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin, acredita que haverá algumas mudanças substanciais no País. Para ele, as empresas vão ampliar o número de fornecedores para diminuir a dependência de fabricantes externos.

"A reconversão das plantas (para produção de equipamentos médicos, por exemplo) mostra que temos competência industrial para voltar a produzir e reduzir alguns gargalos", diz.

Na avaliação do presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, a crise atual escancarou a vulnerabilidade do País em relação ao mercado internacional. "Quando o problema surgiu na China, em pouco tempo sofremos com a falta de peças. Esse nível de dependência de componentes eletrônicos cria uma situação grave."

Ele acredita que o Brasil tem oportunidade de retomar a nacionalização da sua indústria, mas, para isso, as empresas precisam ser competitivas e, além de atender o mercado interno, também exportar. E isso, diz ele, só será possível com as reformas tributária e administrativa.

A ZF, fabricante de transmissões para veículos comerciais, diz que, mesmo em home office, seu pessoal está buscando identificar potenciais fornecedores locais que atendam os níveis de tecnologia de seus produtos.

"Este trabalho tem apoio dos nossos clientes pois, além de reduzir a exposição cambial, minimiza riscos logísticos ante a fragilidade demonstrada por esta pandemia, para não depender de um único fornecedor, principalmente distante e de ação limitada" afirma Silvio Furtado, diretor da ZF América do Sul.

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