Medidas econômicas opõem setor produtivo e governo em meio à pandemia; especialistas defendem união

Iniciativa privada tem cobrado normalização das atividades, respeitando os padrões de proteção sanitária. Economistas sugerem que momento é de adaptação e integração entre governos, entidades e sociedade civil

Escrito por Redação ,
Legenda: O lockdown afetou principalmente o comércio e serviços, cujo peso no PIB Ceará é o maior, além de diversos segmentos da indústria.
Foto: Fabiane de Paula

As questões econômicas se encontram no centro das divergências entre governos e setores produtivos na crise deflagrada pelo novo coronavírus. A falta de medidas de apoio a empresas, o fechamento de negócios e o isolamento social opõem dos dois lados sobre o que fazer para a atividade econômica não sofrer perdas irremediáveis. Neste cenário, economistas defendem integração, adaptação de posturas para superar as crises na economia e na saúde.

"É o momento de atuar em coordenação (Governo Federal e Estadual). Não é um momento de enfraquecer o isolamento social e liberar totalmente a economia, porque é um risco de termos um pico da pandemia e a rede hospitalar não suportar. O momento é para pensar em medidas para reduzir os impactos econômicos, principalmente, aos mais pobres", avalia João Mário Santos de França, diretor geral do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece).

O economista Alcântara Macêdo também cobra equilíbrio e racionalidade. "Nós temos que priorizar a vida humana. Há dois caminhos que são imprescindíveis: um é obedecer as regras dos consultores da área da saúde. Por outro lado, se nós sobrevivermos do ponto de vista de manter a saúde e não manter a saúde econômica, vamos ter consequências desastrosas. Não podemos desligar esses dois caminhos", aponta.

O vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-CE), Ênio Arêa Leão, afirma que não há uma escolha binária.

"Primeiro vem a saúde, depois vem a economia. Mas o ponto principal é que se a gente não priorizar a saúde agora, vamos ter um impacto pior na economia no futuro. A saúde e a economia andam juntas. Se a gente não tiver um controle mais duro, vamos ter um impacto econômico muito maior. Depois que a gente errar e a propagação do vírus aumentar, o custo econômico vai ser muito maior do que o que a gente está vivendo hoje", acrescenta.

Para o economista Célio Fernando, o contexto atual é de disruptura. "É um momento de adaptação tanto macro como na periferia. As relações se alteram mesmo na informalidade. As pessoas têm que ter criatividade e têm que buscar mecanismos de adaptação. Neste momento, temos que ter um olhar que possa atender a todos. Nós temos que mudar as formas de produção, e a tecnologia já traz uma transformação mais clara, entendendo sempre que Estado e mercado são complementares", aponta.

Fernando argumenta que a área da saúde tem uma cadeia produtiva ao seu redor, como indústrias, comércios e serviços, que podem se adaptar para enfrentar o momento. "Eu tenho uma cadeia produtiva principal e tenho outras cadeias produtivas associadas. Tudo pensando no eixo principal que é a questão da saúde sanitária. Neste momento, a economia pode se propor a estar em tudo isso. Além disso, eu tenho que criar formas de proteção social para que isso tudo se organize. Você vai associando toda a discussão aos demais setores, sem deixar de planejar de forma rápida no cenário de crise", observa.

Solidez fiscal

Segundo Arêa Leão, pela solidez fiscal do Ceará, o Estado pode atravessar essa crise de forma mais segura. No entanto, ele pondera ser preciso ter mais cautela.

"O Ceará tem uma situação fiscal entre as melhores do Brasil. Agora, infelizmente, eu estou me comparando a outros estados (em situações) muito ruins. A gente estar melhor que o resto do Brasil não significa que a gente está fantástico. O Ceará está neste grupo dos menos ruins, que ainda têm capacidade de apoiar e tentar ajudar neste momento", aponta o economista.

Conforme o diretor geral do Ipece explica, em uma situação como essa, os estados que têm uma situação fiscal boa têm capacidade maior neste momento para gerenciar algum tipo de recurso.

"A magnitude dos impactos econômicos é tão grande que só um Estado não vai conseguir mitigar. O Governo Federal, que tem capacidade de se endividar, é muito importante em várias áreas, como no emprego, linhas de financiamento e políticas públicas de renda", destaca.

João Mário cita como exemplo a ampliação do Bolsa Família e a manutenção dos empregos. "É necessário que o Governo Federal tente manter os empregos, complemente salários, amplie o Bolsa Família. São políticas que envolvem uma quantidade de recursos muito grande. Já o papel do Estado é investir na parte de infraestrutura hospitalar e melhorar os recursos humanos na área de saúde".

Ele afirma também que acredita que País e os estados não consigam ficar muito tempo em isolamento. "Eu acho que no fim do mês de abril, a gente começa a se soltar mais do isolamento. E acredito que as medidas têm que vir logo, porque o problema já está acontecendo", aponta o diretor.

Preservação

Para o economista Alcântara Macêdo, é preciso preservar os mais velhos (acima de 60 anos) e colocar os mais jovens (até 40 anos) na linha de frente. "Nós temos que preservar os mais velhos. Temos que preservar as pessoas entre 40 e 50 anos, dependendo da situação delas. E até 40 anos, no meu entendimento, têm que ir para o front", diz.

Segundo ele, se a atividade econômica não for mantida pelos mais jovens, haverá recessão. "O Governo não está arrecadando e começa a criar um déficit público que se transforma em inflação de custo. Vamos ter inflação de demanda e de custo. Quando isso acontece, proporciona um desarranjo entre o setor produtivo e os meios de pagamento. Instalada a recessão, imediatamente falta investimento", avalia.

 

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