Contratação de pessoas com deficiência tem leve alta no Ceará

Apesar do resultado, o saldo de vagas, de janeiro a maio deste ano, continua negativo. Além do preconceito e discriminação, contexto econômico contribui para dificultar acesso de Pessoas com Deficiência (PCD) ao mercado formal

Escrito por Ingrid Coelho , ingrid.rodrigues@diariodonordeste.com.br
Legenda: Número de postos de trabalho para Pessoas com Deficiência perdidos em 2019 chega a 265

Cresceu o número de admissões de Pessoas com Deficiência (PCD) no mercado de trabalho formal cearense, mas a evolução não foi o bastante para reverter a curva descendente no saldo de vagas. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), levantados pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, foram 1.426 contratações e 1.691 desligamentos de janeiro a maio de 2019, resultando em -265 postos no ano. Nos cinco primeiros meses de 2018, as admissões somaram 1.409.

Em maio deste ano, foram 339 contratações contra 278 em abril e 244 em março. Em fevereiro, o número chegou a 303 admissões. A analista de Mercado de Trabalho e responsável pelo atendimento à Pessoa com Deficiência do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT), Fátima Almeida, explica que, apesar da lei que garante a cota de vagas PCD nas empresas, ainda são muitas as dificuldades enfrentadas por essa fatia da população na hora de ingressar no mercado de trabalho formal.

"Infelizmente, ainda há um preconceito muito grande. A sociedade desconhece o potencial dessas pessoas, acham que elas não terão capacidade para desempenhar uma tarefa e, por isso, elas enfrentam obstáculos de inserção no mercado de trabalho", explica Fátima Almeida. O total de admissões de Pessoas com Deficiência de janeiro a maio no mercado formal cearense representa apenas 0,95% do total de contratações em todo o Estado no período (149.739).

Apesar de não ter números sobre o cumprimento da Lei de Cotas - que fixa a destinação de uma fatia das vagas para Pessoas com Deficiência - por parte das empresas, ela acredita que o cenário está longe do ideal. "Quando a gente olha para os números de um modo geral, é um índice ainda muito distante do que deveria ser. Apesar de todo o nosso trabalho, o estoque de emprego inclusivo deixa a dever em relação à Lei de Cotas", avalia a analista de Mercado de Trabalho do IDT.

O Artigo 93 da Lei nº 8.213/91, também conhecida como Lei de Cotas, estabelece quatro cotas de empregados PCD, cada uma delas correspondendo ao tamanho do quadro de funcionários do negócio. Uma empresa que tem de 100 a 200 empregados deve ter, pelo menos, 2% da equipe composta por pessoas com algum tipo de deficiência. Já os negócios com 1.001 empregados ou mais devem ter, pelo menos, 5%, conforme a lei.

O Sistema Nacional de Emprego do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (Sine/IDT) foi responsável pela mediação de 619 vagas de trabalho PCD no Ceará entre janeiro e maio deste ano. Em 2018, foram 1.956 postos de trabalho no Estado, crescimento de 6,7% na comparação com o ano de 2017 (1.832 vagas). "Das vagas para Pessoa com Deficiência colocadas no mercado, em um número empírico, 80% são preenchidas, porque realmente a exigência é muito grande", diz Almeida.

Além das dificuldades enfrentadas pelas Pessoas com Deficiência para conseguir uma colocação, a analista de mercado de trabalho do IDT explica ainda que algumas deficiências são mais discriminadas no mercado de trabalho. "Os deficientes auditivos e visuais encontram muita dificuldade para serem incluídos", revela Almeida.

Na avaliação dela, os negócios ligados aos serviços, com destaque para o comércio e a indústria são os setores que mais incorporam Pessoas com Deficiência em seus quadros de trabalhadores. "São demandados para a área administrativa, sobretudo, auxiliar de produção e operador de caixa. São vagas normalmente presentes aqui no Sine para PCD", detalha.

Em 28 anos de funcionamento no Estado, ela revela que o Sine já mediou a contratação de mais de 30 mil profissionais com algum tipo de deficiência. "Foram pessoas que tiveram suas próprias vidas e as vidas de suas famílias transformadas por meio do emprego. A inclusão modifica essas histórias de vida. O rótulo de deficiente é discriminador".

Diante de um ano difícil para o Sine/IDT, com o fechamento de 14 unidades no Estado, as Pessoas com Deficiência estão entre os prejudicados na busca por uma vaga de emprego. "É, sem dúvida, muito difícil. A esperança é uma grande aliada nossa", acredita Almeida.

Mercado formal

Ainda segundo os dados da Secretaria Especial da Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, o saldo negativo de 265 vagas de emprego PCD em 2019 é quase cinco vezes maior que o saldo de -54 postos registrados de janeiro a maio de 2018. Na Região Nordeste, o saldo ficou negativo em 603 vagas e, no País, o mercado de trabalho formal perdeu 2.496 vagas para Pessoa com Deficiência nos cinco primeiros meses do ano.

Uma nova percepção

Francisco Messias Fernandes Lima, 50, descobriu a deficiência auditiva apenas aos 33 anos, em 2002, ao passar por audiometria durante um processo seletivo. "A minha vida toda, eu escutei abafado. Quando falavam baixo, eu não entendia. Tive problemas na escola, sofri bullying por conta disso, mas achava que era normal, não tinha conhecimento sobre isso na época", conta.

Ele relata que, devido à constatação da perda auditiva, não pode assumir a vaga pretendida. "Foi muito complicado. Eu tinha investido recursos em um curso de técnico de Segurança do Trabalho e essa vaga já estava garantida, sempre me elogiavam durante o curso como um dos melhores alunos", lembra Messias.

Em 2014, o técnico buscou o Sine/IDT para tentar uma nova vaga. "Lá, eles me disseram que eu me encaixava na cota para deficientes. Fiz cursos voltados para PCD e me chamaram para trabalhar na minha área, de Segurança do Trabalho, como deficiente", afirma.

Ele revela que há apenas quatro anos sua relação com o mundo foi modificada ao iniciar o uso de aparelho auditivo. "Foi aí que eu percebi o que era escutar de verdade, porque antes eu perdia muita coisa, até mesmo em reuniões no trabalho, eu tinha que perguntar para colegas depois que terminava".

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