Como o Ceará perdeu o protagonismo no mercado de energia eólica no País

Pioneiro no setor, Estado foi ultrapassado pelo Rio Grande do Norte e Bahia, que têm hoje o dobro da capacidade

Escrito por Bruno Cabral , bruno.cabral@diariodonordeste,com.br
Legenda: Bahia e o Rio Grande do Norte concederam mais incentivos fiscais do que o Ceará, reduzindo o custo da operação naqueles estados e, assim, viabilizando os projetos de geração

PIoneiro na geração de energia eólica - com a instalação dos primeiros geradores do País há cerca de 20 anos - e líder nesse mercado por quase 15, o Ceará é hoje o terceiro em potência instalada. Foi ultrapassado pelo Rio Grande do Norte e Bahia, que possuem condições climáticas semelhantes e ambiente considerado mais amigável a investidores.

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Até 2014, o Estado liderava o segmento de geração eólica, com mais de 1 mil MW de potência instalada, superando a soma das capacidades do Rio Grande do Norte e da Bahia. Hoje, tanto o Estado potiguar (4.066 MW) como o baiano (3.934 MW) têm praticamente o dobro da capacidade do cearense (2.054 MW).

"Estamos em terceiro lugar e muito distante dos dois primeiros, embora tenhamos condições até melhores em relação aos ventos e às linhas de transmissão", diz João Mamede Filho, consultor em energia. Para ele, o ambiente para a atração de investimentos foi um dos fatores que acabaram contribuindo para que o Ceará ficasse para trás.

"As exigências ambientais, sobretudo no litoral, que é a região onde as condições de vento são mais favoráveis, ficaram muito rígidas e isso, de certa forma, acabou afugentando investidores, que realocaram seus projetos para outros estados", avalia.

O consultor destaca ainda que a Bahia e o Rio Grande do Norte concederam mais incentivos fiscais do que o Ceará, reduzindo o custo da operação naqueles estados e, assim, viabilizando os projetos de geração. "O Ceará até oferecia melhores condições de conexões, mas levando em conta os incentivos fiscais e as questões ambientais, os investidores buscaram outros estados".

Hoje, além dos 81 parques eólicos em operação, o Ceará tem um em construção (com capacidade de 19,2 MW) e 12 empreendimentos com construção iniciada, com capacidade total de 315 MW. O Rio Grande do Norte, além de 152 parques em operação, tem dois em construção e 60 com construção não iniciada que, juntos, somam 1.903,3 MW. E a Bahia irá adicionar 1.523,6 MW à sua matriz eólica nos próximos anos, com 38 parques em construção e 47 com construção não iniciada.

Retomada

Após perder espaço, o Estado vem, desde 2015, buscando oferecer um ambiente mais atrativo para novos investimentos.

"Em 2011, o Ceará era responsável por 35% da geração eólica do País. Em 2015, caiu para 15%, e então iniciou-se um trabalho conjunto com todos os setores, sob a coordenação da Fiec", aponta Joaquim Rolim, coordenador do Núcleo de Energia da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec).

"Houve a revisão do licenciamento ambiental, os incentivos fiscais foram atualizados em 2017 e o novo mapa eólico e solar deve ficar pronto em breve. Com isso, o Ceará deve retomar os investimentos da cadeia produtiva como um todo, não só na geração", diz Rolim.

Diferentemente do que ocorria há 20 anos, não basta apenas apresentar as melhores condições climáticas, de vento ou incidência solar, para captar investimentos.

"As linhas de conexão são um dos fatores de grande influência e, quanto mais leilões de transmissão acontecem, mais os estados ampliam suas possibilidades", aponta Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeolica).

"Os fatores que levam à contratação ou não destes projetos, no entanto, estão além dos poderes dos estados, pois se devem à necessidade ou não de contratar energia. Com baixo crescimento econômico, talvez tenhamos uma contratação pequena no próximo leilão".

Uma das antigas demandas do setor é a atualização do atlas eólico e solar do Ceará, estudo que indica áreas com maior potencial de geração no Estado. O documento, considerado essencial para a atração de novos empreendimentos, é esperado há pelo menos dez anos e, segundo a Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), deve ser lançado até o fim deste mês.

Conforme estudo do Governo do Estado de 2016, o Ceará apresenta uma capacidade de geração eólica superior à média nacional e mundial. Naquele ano, o "fator de capacidade média" do Estado era de 43,4%, enquanto no Brasil era de 35,2% e, no mundo, de 28%. Com a atualização, espera-se que os investimentos não fiquem limitados ao litoral, podendo chegar às serras do Araripe e da Ibiapaba.

Energia solar

Em 2011, o Ceará recebeu a primeira usina solar do País, instalada em Tauá, com 5 MW de potência. Hoje, porém, o Estado é o quinto entre as unidades da federação com maior potencial de geração fotovoltaica, atrás da Bahia (669.1 MW), Minas Gerais (641,8 MW), São Paulo (294,3 MW) e Piauí (278,2 MW). Após receber o primeiro parque, o Estado acabou sendo preterido nos leilões seguintes.

"No próximo leilão A-4 (para usinas que começam a operar daqui a quatro anos), o Ceará está com 12% dos projetos solares. É um trabalho que já está começando a render frutos", aponta o coordenador Joaquim Rolim. "No ano passado, 40% dos projetos solares vieram para o Ceará, o que representa 390 MW".

Considerando os empreendimentos em construção e os já contratados, o Ceará irá adicionar nos próximos anos 733,7 MW à sua matriz solar, de acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Com isso, passará para a segunda posição no ranking nacional, com uma potência instalada de 973,9 MW, atrás apenas de Minas Gerais (1.425 MW).

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