Guaidó convoca greve geral e Maduro diz que opositor quer provocar guerra

Embora Guaidó não tenha se referido ao fracassado levante de terça-feira (30), afirmou que continuará convocando protestos até conseguir o fim da "usurpação" de Maduro

Escrito por Estadão Conteúdo ,
Legenda: Nicolás Maduro acusa a oposição de querer "iniciar uma guerra civil"
Foto: Foto: Cristian Hernandez / AFP

Juan Guaidó, autoproclamado presidente interino da Venezuela, reapareceu na quarta-feira, dia 1º, em Caracas durante a manifestação e convocou uma greve progressiva na administração pública a partir desta quinta-feira (2). "Amanhã (hoje) começa a 'Operação Liberdade Sindical' rumo à greve geral (...) Amanhã vamos acompanhar a proposta de greve escalonada", disse Guaidó diante de mil pessoas que se concentraram em um dos pontos preparados para o protesto contra o governo de Nicolás Maduro.

Embora Guaidó não tenha se referido ao fracassado levante de terça-feira (30), afirmou que continuará convocando protestos até conseguir o fim da "usurpação", que é a forma como se refere ao mandato de Maduro. Na Venezuela, as greves não costumam ter o efeito desejado.

"Esperamos que Bolsonaro nos ajude", afirmou o engenheiro eletrônico venezuelano, que pediu para ser identificado somente como "Chicho", um dos manifestantes que protestavam nesta quarta na Avenida San Juan de Bosco, altura da Praça Altamira, um dos pontos de reunião de opositores ao governo. Durante toda a tarde Chicho e a irmã, dona de lavanderia em Las Mercedes, zona comercial de Caracas, acompanharam a manifestação que foi reprimida com gás lacrimogêneo, com avanço e recuo de policiais em motos e blindados.

No fim da tarde, Maduro discursou para milhares de apoiadores em evento pelo Dia do Trabalho. Ele acusou a oposição de querer "iniciar uma guerra civil", e voltou a insinuar que os EUA poderiam ordenar uma invasão militar caso a tensão interna escalasse para um conflito armado. "Se tivéssemos mandado tanques para enfrentá-los (os manifestantes), o que teria acontecido? Um massacre entre venezuelanos", afirmou Maduro. "É isso que a oposição quer? Uma guerra civil entre compatriotas?". Enquanto Maduro discursava, Guaidó usou as redes sociais para responder ao chavista: "O regime covarde trata de demonstrar com repressão um controle que já não tem".

Maduro voltou a chamar Guaidó e o opositor Leopoldo López de golpistas, e disse que os dois são marionetes do presidente americano, Donald Trump. "Jamais haverá uma marionete como presidente no Palácio de Miraflores", disse no discurso. "Na Venezuela, a democracia existe de verdade. Aqui, só o povo põe, só o povo tira."

Maduro celebrou o que classificou de "vitória" contra "golpistas" nos confrontos de terça-feira, felicitando seus apoiadores pelo "dia em que a classe operária derrotou novamente um golpe de Estado" dos opositores. "Não puderam com (o falecido líder venezuelano Hugo) Chávez e tampouco puderam conosco", afirmou Maduro sobre o que disse ser um "complô" da direita para derrubá-lo. "Eles esqueceram que há uma poderosa união cívico-militar que não se enfraqueceu." Ele também prometeu punir os "traidores".

Para Benigno Alarcón, diretor do Centro de Estudos Políticos da Universidade Católica Andrés Bello, a maior da Venezuela, Maduro está esperando o desgaste de Guaidó. "Essa é uma aposta que o governo sempre fez. Apostar no desgaste do tempo. E desta vez conta a favor dessa estratégia as ameaças feitas pelos EUA caso algo aconteça a Guaidó". "Por isso o governo tem evitado tomar medidas como tomou no passado, quando prendeu líderes da oposição."

Uma mulher de 27 anos, identificada como Jurubith Rausseo, morreu no hospital após ser atingida por um tiro na cabeça durante os protestos em Caracas. Segundo fontes médicas, ao menos 46 pessoas ficaram feridas nas manifestações que ocorreram nesta quarta em várias partes do país. Em Caracas, os confrontos começaram quando dezenas de opositores tentaram bloquear uma rodovia e lançaram pedras e coquetéis molotov contra a base aérea, onde militares se rebelaram na terça-feira contra Maduro.

Na avenida próxima à Praça Altamira, onde se concentram os protestos, a empresária de lavanderia, que também não quis se identificar, gritava: "Até quando vamos com isso? Isso aqui é perigoso, senhor. Não estamos num país normal", afirmou ao saber da reportagem para o jornal O Estado de S. Paulo. "Como disse meu irmão, esperamos que Bolsonaro nos ajude a sair disso. É um absurdo o que estamos vivendo."

A manifestante disse ainda, durante uma das ondas de correria por causa das bombas de gás e estampidos de tiros, que "não são venezuelanos que estão fazendo esses ataques às pessoas", e emendou "isso deve ser cubano", argumentando que "venezuelanos não têm essa índole de atacar o próprio povo".

No quarteirão logo abaixo, um grupo de jovens, com os rostos cobertos reunia pedras e coquetéis molotov para investidas periódicas contra o comboio policial que tentava desobstruir a via. Os mascarados comemoravam a cada fogaréu que se erguia dos blindados atingidos.