Escândalo de corrupção derruba chanceler da Áustria

Gravação divulgada pela imprensa mostra políticos oferecendo vantagens à oligarca russo

Escrito por AFP ,
Legenda: Conservador Sebastian Kurz deixou o cargo após o escândalo de corrupção que implodiu sua coalizão de governo
Foto: AFP

O Parlamento da Áustria votou, nesta segunda-feira (27), uma moção de censura contra o chanceler conservador Sebastian Kurz, retirando-o do cargo após o escândalo de corrupção que implodiu sua coalizão de governo. Esta votação sem precedentes na história da República da Áustria contou com os votos dos socialdemocratas e do partido nacionalista FPÖ, cujo líder havia sido obrigado a renunciar a seu posto de número dois do governo, em função do escândalo. O resultado da votação foi anunciado pela vice-presidente do Parlamento, Doris Bures.

O destino do líder de 32 anos, no poder desde o final de 2017, já havia sido selado esta manhã, quando o FPÖ, de extrema direita, outrora seu aliado, decidiu que votaria a favor da moção de censura contra Kurz. Já o Partido Social Democrata anunciou no domingo que também apoiaria a moção. A soma dos 52 deputados do SPÖ e dos 51 do FPÖ configurou uma maioria na Casa, de 183 cadeiras. 

Nos últimos dias, o FPÖ não parou de atacar Sebastian Kurz, líder dos conservadores do ÖVP, que os expulsou sem qualquer hesitação do governo após as revelações do caso "Ibizagate".

O que é o escândalo

O "Ibizagate" veio à tona quando a revista alemã "Der Spiegel" e o jornal "Suddeutsche Zeitung" publicaram no dia 17 em seus sites trechos de uma gravação com câmera oculta de uma reunião que teria acontecido meses antes das eleições parlamentares de 2017 na Áustria. Foi quando o FPÖ chegou ao poder.

Nas imagens, aparecem o vice-chanceler Strache e Johann Gudenus, líder da bancada parlamentar do FPÖ, conversando com uma mulher que diz ser sobrinha de um oligarca russo. Os três falam sobre como investir dinheiro na Áustria, especificamente para controlar o jornal de maior tiragem do país, o "Krone Zeitung".

A conversa envolve, principalmente, a participação acionária no poderoso jornal austríaco. Strache sugere que, sob uma nova direção, o "Krone" poderia ajudar o FPÖ em sua campanha eleitoral. Também diz à mulher que seu grupo poderá ter acesso a contratos públicos. Strache afirma que não haverá resistência na redação do "Kronen Zeitung", porque "os jornalistas são as maiores prostitutas do planeta".

Sem confiança

Para o ex-líder do FPÖ Heinz-Christian Strache, que teve de renunciar a todos os cargos após o escândalo, exigir a saída do chanceler era "compreensível e lógico".

"A confiança desapareceu", disse o secretário-geral da legenda, Harald Vilimsky. 

O Parlamento organizou uma sessão extraordinária esta manhã para discutir a moção de censura. A coalizão ÖVP-FPÖ acabou depois da divulgação em 17 de maio de um vídeo - que na verdade foi uma armadilha -, no qual Strache propõe contratos públicos em troca de apoio financeiro russo.

Após a queda do líder do FPÖ, que ocupava o cargo de vice-chanceler na coalizão governamental, Kurz destituiu o ministro do Interior, também de extrema direita.  Em resposta, os outros ministros do FPÖ abandonaram o Executivo, deixando o partido conservador governando sozinho.

Apesar de sua popularidade - segundo uma pesquisa recente, a maioria dos austríacos apoiava a permanência do chanceler no cargo -, Kurz não foi capaz de se manter no poder. Ele acusou os socialdemocratas e a extrema direita de formarem "uma coalizão" para derrubá-lo.

Paradoxalmente, a votação da moção de censura aconteceu depois que Kurz saiu vitorioso no domingo com seu partido nas eleições europeias. A sigla obteve 34,9% dos votos, o melhor resultado de um partido desde a entrada da Áustria na União Europeia, em 1995.

Segundo analistas, a popularidade do líder dos conservadores pode até ser reforçada com a proximidade das eleições legislativas antecipadas convocadas para setembro após o escândalo "Ibizagate".

"Em setembro, as pessoas decidirão", disse Kurz em sua primeira aparição pública depois de ser destituído. "Eu ainda estou aqui e vamos lutar, a mudança que eu comecei há dois anos não vai parar", acrescentou.

Antes da votação, Kurz afirmou que "ninguém no país pode entender a vontade de derrubar o governo", uma decisão suscetível, segundo ele, de prejudicar a estabilidade do país.