Órgãos que atuam no Ceará aumentaram efetivo de fiscalização nos últimos anos

Autuações com base na Lei Seca crescem 63% em rodovias do Ceará Levantamento das Polícias Rodoviárias

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Foto: Foto: Fabiane de Paula

O período festivo do Carnaval se aproxima e, com ele, cresce a preocupação da mistura entre folia, álcool e direção. Um dos principais instrumentos de inibição desse comportamento é a Lei Seca, que completa 12 anos de vigência em 2020. Nesse tempo, ela ficou conhecida por reduzir a zero a tolerância com motoristas que pegam no volante estando embriagados. Contudo, o número de autuações com base no dispositivo cresceu 63,4% nos últimos dois anos, em rodovias estaduais e federais que cortam o Ceará.

O aumento leva em consideração dados da Polícia Rodoviária Federal no Ceará (PRF-CE) e da Polícia Rodoviária Estadual (PRE) em conjunto com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-CE). Em 2018, foram registradas 3.794 autuações, contra 6.201 no ano passado. No mesmo período, a média mensal passou de 316 para 516 autuações.

Aparentemente, a atitude dos motoristas pouco parece ter mudado mesmo com a Lei se tornando mais severa em 2018, quando aumentaram as penas para motoristas que cometerem homicídio ou causarem lesão grave ou gravíssima ao dirigir alcoolizado ou sob efeito de qualquer outra substância psicoativa. O condutor está sujeito à reclusão de cinco a oito anos, além de outras possíveis sanções.

Porém, na leitura do advogado especialista em trânsito Rodrigo Nóbrega, o aumento dos números é reflexo da fiscalização mais ostensiva dos órgãos responsáveis. Para ele, o saldo da Lei até o momento é positivo. "Com a tolerância zero, os condutores passaram a se policiar mais e a utilizar outras alternativas de transporte, como o compartilhado. Obviamente, a gente ainda encontra vários casos diários, por isso outras medidas de prevenção deveriam ser adotadas. O poder público foca muito na fiscalização e na punição, mas não tanto na educação", considera Nóbrega.

O advogado lembra que o próprio Detran aumentou o efetivo de fiscalização. Segundo o órgão, as autuações com base na Lei Seca nas rodovias estaduais cearenses saltaram de 2.864, em 2018, para 4.786, em 2019. Para intensificar as vistorias, o Detran-CE também adquiriu 150 novos etilômetros fabricados na Austrália, que são capazes de realizar testes com velocidade de cinco a 10 segundos.

"Com a utilização do novo etilômetro, será possível ampliar a quantidade de pessoas abordadas em cada operação e reduzir o tempo de espera para o condutor, que nem precisa descer do veículo para fazer a triagem inicial", avalia o órgão.

Considerando a atuação da PRF, o número de autuações cresceu 52% no mesmo período, passando de 930 para 1.415. O órgão informou que ocorreram 233 detenções - 111 em 2018 e 122 em 2019. A BR-116 foi a via com maior número de autuações, seguida pela BR-222 e pela BR-020. Já em 2020, até o dia 13 de fevereiro, foram realizados 18.344 testes, com 179 autuações e 12 detenções.

Penalidade

Conduzir veículo sob influência de álcool leva a uma multa de R$ 2.934,70. Além disso, o condutor responde a um processo administrativo que poderá levar à perda do direito de dirigir por um ano. "Esse processo de suspensão corre separado do da multa, e o Detran tem até cinco anos para instaurá-lo porque é responsável pela habilitação, explica o advogado Rodrigo Nóbrega.

Segundo o especialista, uma das principais polêmicas em relação ao tema gira em torno da recusa em se fazer o teste do bafômetro. De um lado, a Constituição Federal estabelece que nenhum indivíduo é obrigado a produzir provas contra si. Por outro, a legislação complementar do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) diz que o condutor que se recusar comete uma infração, sob o princípio de perigo à coletividade.

Atualmente, há jurisprudência nos dois lados, mas o conflito "deve ser pacificado" em breve pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que contesta a Lei Seca, relatada pelo ministro Luiz Fux, vai definir se a recusa é mesmo infração ou se prevalece a presunção de inocência. A última movimentação no processo ocorreu em julho do ano passado.

Para o administrador Jefferson Mesquita, 40, na prática, prevalece o ditado "quem não deve não teme". Ele conta que cai em blitzes da Lei Seca de uma a duas vezes por ano, mas não se preocupa com o resultado "porque é uma coisa básica". "Já vemos tantos exemplos de gente que mata gente no trânsito, por embriaguez, que nem cogito beber e dirigir depois", afirma, lembrando que recorre a familiares ou a aplicativos de transporte quando participa de ocasiões que envolvam o consumo de álcool.

Contudo, a alcoolemia pode ser constatada por um rol bem mais amplo do que o sopro no aparelho ou por exame de sangue. De acordo com o advogado Rodrigo Nóbrega, também valem provas visuais e testemunhais. "Alguns batalhões de Polícia Rodoviária Federal fazem fiscalização com câmera acoplada no capacete. Se ficar comprovado visualmente que o condutor está com a fala e a capacidade psicomotora alterada, e houver testemunho de odor etílico, tudo isso se torna meio de prova", garante.

O advogado pondera que "não tem mais para onde correr em termos de legislação" porque o Brasil é o mais rigoroso do mundo na punição desse tipo de infração. Porém, ainda é preciso investir em cursos de reciclagem, infraestrutura e tecnologias de prevenção. "No caso do Ceará, se criou a cultura de que basta pagar a multa e está tudo resolvido. Precisamos dar mais eficiência a esses processos porque só a multa não tem um caráter pedagógico", arremata.

Número de motoristas autuados pela Lei Seca pulou de quase 4 mil para mais de 6 mil, em um ano. Especialista acredita que, embora a fiscalização tenha se tornado mais ostensiva, é preciso investir em cursos de reciclagem e outras formas de prevenção

 

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