Pacientes com transtornos psiquiátricos têm capacitação profissional e buscam oportunidades

O setor de Serviço Social do Hospital-Dia, unidade que funciona no Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto, em Messejana, tem buscado parcerias com iniciativas que ofertem cursos às pessoas atendidas no local

Escrito por Thatiany Nascimento , thatiany.nascimento@diariodonordeste.com.br
Legenda: Renato da Silva Ramos, de 26 anos, diagnosticado com esquizofrenia aos 19 anos, já passou por diversas capacitações e hoje, com o auxílio da mãe, prepara bolos
Foto: Foto: Fabiane de Paula

Se os estigmas jogam dúvidas sobre a competência de realização de atividades laborais por pessoas com doenças psiquiátricas, e, na prática, são verdadeiras barreiras para a inclusão, as iniciativas que se contrapõem a estes preconceitos, ainda que pouco numerosas, fazem a diferença na vida de pacientes historicamente desacreditados. Para quem é diagnosticado com transtorno mental, a batalha para ter acesso a algum trabalho, diferentemente da busca convencional por emprego, é antes de tudo, de se perceber capaz. Ter autonomia para reconhecer as afinidades e entregar-se as chances que podem surgir. Evoluir no tratamento potencializando habilidades. 

No Ceará, o Serviço Social do Hospital Dia – Lugar de Vida, unidade que funciona dentro do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM), em Messejana, tem buscado parcerias com iniciativas que ofertem capacitação profissional aos pacientes que fazem tratamento no local ou já receberam alta. 

Os Centros Urbanos de Cultura, Arte, Ciência e Esporte (Cucas), os Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e os Centros de Inclusão Tecnológica e Social (CITS), geridos, respectivamente, pela Prefeitura e pelo Governo do Estado, são alguns dos parceiros que têm auxiliado na oferta de oportunidades para os pacientes.

Estas instituições ofertam capacitação profissional à população e no Hospital-Dia o Serviço Social tenta mediar o contato entre a vagas ofertadas e os pacientes que desejam e têm condições de fazer. 

Encaminhamentos

Desde 2015, o Hospital-Dia realiza, de modo mais sistematizado, encaminhamentos às capacitações profissionais. Nesse intervalo de tempo, 12 pacientes já tiveram oportunidades. O jovem Francisco Renato da Silva Ramos, de 26 anos, diagnosticado com esquizofrenia aos 19 anos, é um deles.

Atendido local por dois períodos de "internação", Renato reencontra seu potencial nas atividades que têm realizado. As afinidades, conta ele, estão ligadas à escrita de histórias e apreço pelo cinema. "Eu gosto e fico treinando a escrita de roteiro". Mas as capacitações perpassam diversos ofícios. Curso de curta-metragem, atendente de farmácia, informática, salgadeiro e auxiliar de escritório. 

Morador do Mondubim, Renato afirma que o tratamento no Hospital-Dia nem sempre foi bem aceito por ele, mas com o passar do tempo ele passou a reconhecer o valor das terapias e da convivência em grupo. O último curso que Renato participou já deu frutos e agora ele junto à mãe, Maria da Silva Ramos, testam o conhecimento na cozinha. Salgados e bolo, garantem que sabem fazer em parceria. "É uma oportunidade para ele. Quando ele tá bem, ele mesmo procura os cursos e quer fazer", acrescenta a mãe.

Outra paciente que já passou pelo Hospital-Dia e também é assídua nas capacitações é Margareth Nascimento Khouri. Diagnosticada com transtorno bipolar aos 28 anos, ela hoje com 56 anos, já fez, pelo menos, cinco capacitações e se diz feliz com o que tem aprendido. Hoje, ela é acompanhada em um posto de saúde e segue em contato com a equipe do Hospital-Dia. Dos cursos que fez, o que mais gostou foi o de recepcionista. "Porque a minha chance de me comunicar com terceiros, me integrar mais, foi mais presente nele", explica. 

Legenda: Margareth Nascimento, diagnosticada com transtorno bipolar, já fez, pelo menos, cinco capacitações profissionais
Foto: Foto: Fabiane de Paula

O Hospital-Dia também já viabilizou a capacitação de Ozorino Melo, de 42 anos, diagnosticado com depressão bipolar há 20 anos. "Já fiquei internado cinco vezes, faço tratamento e tomo remédio. Há um ano tive alta do hospital, mas sempre que tem oportunidade, quero fazer. Eu fiz uns cursos quando ainda estava em tratamento", relata. 

O problema de saúde, segundo Ozorino, inviabilizou sua continuidade na carreira militar, hoje, ele que já fez curso de operador de caixa e recepção/atendimento, busca retornar o exercício de alguma atividade laboral. "Eu fiz faculdade de pedagogia e faltou concluir. Eu queria uma oportunidade de qualquer coisa que eu pudesse fazer. Pudesse mostrar o que eu sei e gosto. Eu me identifico com a recepção, pois eu gosto de atender ao público", garante. 

Legenda: Ozorino Melo, diagnosticado com depressão bipolar há 20 anos, diz buscar uma oportunidade de emprego
Foto: Foto: Fabiane de Paula

Efeitos

A gestora do Hospital-Dia, Fátima Araújo, explica que para participar da capacitação é feita uma avaliação nos pacientes. Cada pessoa, tem um Projeto Terapêutico Singular (PTS). "Avaliamos se ele está em condição de fazer uma capacitação", diz. Quando ainda estão internados, eles passam algumas horas no hospital, outras nos cursos e as demais em casa. 

"Esses pacientes já estão em fase de desospitalização. Ele vem da internação, da residência médica, dos consultórios particulares e aqui a gente faz um trabalho com a equipe interdisciplinar".

O Hospital tem capacidade para "internar" 30 pacientes por vez. Em 2018, o Hospital-Dia atendeu 372 pacientes.

Para a assistente social da unidade, Liduína Benevides, os efeitos da participação nos cursos são evidentes e um dos fatores relevantes é que eles proporcionam a integração das pessoas com doenças mentais com aquelas que não têm. "É um resultado expressivo para autoestima, para o tratamento. Transforma as vidas deles e das famílias". 
 

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