No Centro de Nossa História

Escrito por Marlyana Lima , marlyana.lima@diariodonordeste.com.br
Foto: JADE QUEIROZ/MTUR

É fato que a Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção já não é mais uma Aldeia Aldeota de ruas tranquilas onde era possível perfilar cadeiras na calçada para uma prosa entre os vizinhos. Bons tempos. Boas lembranças. Muitas mudanças.

Há muito, a capital cearense virou cidade grande. Agora é metrópole onde cabem todos os sotaques. Ainda assim, jamais deixou de ostentar um certo ar provinciano. Talvez por isso mesmo, o muro invisível de preconceito impede que tantos de nós deixem de apreciar as belezas que existem no Centro.

Estigmatizado por alguns, amado por quem conhece suas entranhas, o Centro tem atrações culturais, sociais e uma diversidade econômica cheia de dignidade. Mas - tem sempre um mas -, infelizmente, ano a ano, suas ruas, avenidas, travessas e praças vêm sendo mais marginalizadas.

"O Centro é muito sujo", dizem alguns. "Perigoso demais", outros podem falar. Pois como legítima filha de Fortaleza que viveu a infância na Rua Castro e Silva, entre as avenidas Imperador e Tristão Gonçalves, posso afirmar, sem medo, que o Centro da cidade é lugar para quem gosta de gente, de cultura, de arquitetura, de vida que pulsa, apesar dos que o ignoram. É, acima de tudo, lugar de valiosas descobertas.

Puxando os fios da memória, lembro que, da calçada estreita da casa onde nasci, dava para ver o marco zero da cidade, a Catedral Metropolitana. Só mais tarde percebi que ela era (e é) nossa "Notre Dame". Imponente, me causava um certo medo. Na profecia que minha vó contava, nos fins dos tempos "a Igreja vai virar cama de baleia. O mar vai engolir tudo". Vaticínio que nunca esqueci, até porque vou ao Centro com regularidade. Conheço suas mazelas, sim, mas enxergo, acima de tudo, os seus tesouros.

Em meio ao grande mercado "persa" que se forma em suas ruas principais, acha-se de tudo. Como se fora uma grande feira, os gritos de camelôs se misturam à música alta que vem de dentro das lojas. Há cheiros, sons, cores muito peculiares no Centro. Sem esquecer as pechinchas de enlouquecer os mais consumistas. Embora, esses sejam os elementos que integram apenas a superfície desse universo multifacetado.

Quem olhar mais atentamente vai perceber a beleza escondida em velhas casas e casarões que teimam em manter suas fachadas originais apesar do dinheiro que "constrói e destrói coisas belas".

As praças como a do Ferreira, Lagoinha, da Estação, José de Alencar, dos Leões, acreditem, já tiveram seus dias de glória e bem que mereciam ser resgatadas. Nelas, há joias arquitetônicas incrustadas que perderam frequentadores. Theatro José de Alencar, Cineteatro São Luiz, Estação João Felipe, antiga Emcetur, onde o artesanato dividia espaço com peças de museu, restaurantes e cafés.

O próprio Forte Schoonenborch, em torno do qual a "loura desposada do Sol" cresceu, se mantém imponente tendo como vizinho o Passeio Público, salvo que foi do ostracismo e, hoje, serve como cenário para passeios e apresentações culturais.

No Mercado Central, brasileiros e estrangeiros percorrem os corredores onde nossas riquezas culinárias e artísticas viram atração. São cobiçadas por quem as vê feitas de pura tradição.

Pena que nem todos os cearenses consigam ver o mesmo. Pena que muitos jamais se darão a chance de cruzar o muro invisível para se aventurar entre as descobertas que, acima de tudo, envolvem nossa essência mascate. Quem sabe um dia, possamos colocar tanta história no Centro das atenções.

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