Faltam 156 médicos nos postos de saúde de Fortaleza

Para garantir atendimento regular nas unidades básicas, a Capital precisa de, pelo menos, 467 médicos. Hoje há 311, sendo 147 ainda remanescentes do Mais Médicos

Escrito por Thatiany Nascimento , thatiany.nascimento@diariodonordeste.com.br
Legenda: No Jardim das Oliveiras, a unidade, segundo funcionários, tem três equipes desfalcadas
Foto: FOTO: JOSÉ LEOMAR

Consultas pendentes. Procedimentos em espera. Ninguém sabe ao certo quando, finalmente, vai ter médico no posto de saúde. Problema crônico que perdura nas unidades básicas de saúde de Fortaleza. Se parte dos 113 postos, hoje, conta com médico, diversos equipamentos localizados em áreas vulneráveis seguem sofrendo os efeitos da ausência sistemática desses profissionais. O ideal, segundo a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), é que a Capital tenha 467 médicos nas unidades básicas. Hoje, com 311 profissionais, a cidade carece de outros 156 médicos.

No Posto Maria de Lourdes Jereissati, no bairro Jardim das Oliveiras, conforme uma agente de saúde (que não será identificada), três equipes estão sem médico há três anos. Na unidade, a doméstica Gilda Vieira relata que, em novembro de 2018, ela e o esposo fizeram exames, mas até agora não tiveram como mostrar os resultados a nenhum médico devido à ausência de profissionais no local.

Os impactos da carência de médicos são semelhantes no Posto Graciliano Muniz, no bairro Conjunto Esperança. "Ontem mesmo, eu cheguei antes do meio-dia e saí quase quatro horas da tarde e não tinha nem a enfermeira do acolhimento pra atender a gente. A moça do Same (Serviço de Marcação de Consultas e Exames) disse que não tinha médico. Não tem previsão de quando vão marcar médico, e eu estava sem a minha receita de saúde mental. E eu não posso ficar sem a minha medicação", contou a cabeleireira Ana Célia Carneiro, na quarta-feira (19). Na unidade, segundo uma funcionária (que não será identificada), há seis equipes e falta médico em uma.

Necessidade

A realidade é conhecida, principalmente entre os moradores das Regionais III, V e VI. Hoje, na equação para garantir médicos na atenção primária compondo as equipes da Estratégia de Saúde da Família - cujo atendimento está atrelado diretamente às demandas comunitárias -, Fortaleza tem 147 profissionais vinculados ao Programa Mais Médicos, do Governo Federal.

Contudo, explica o coordenador das Redes de Atenção Primária e Psicossocial da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Rui de Gouveia, como o Governo Federal, em 2019, não permitiu a renovação dos contratos do Mais Médicos nas capitais, os profissionais que estão em Fortaleza deixarão as unidades de forma gradual nos próximos anos.

O último médico vinculado ao programa na Capital tem contrato firmado até maio de 2022. "Nesse momento, eles não abriram edital para profissionais que estão atuando nas capitais e nem para a renovação. Têm profissionais, por exemplo, que vão sair agora em 2019 e que poderiam renovar por mais três anos. Só que o Governo Federal simplesmente vetou essa possibilidade. Então, hoje, em relação ao Programa Mais Médicos, nós ainda temos 147 profissionais distribuídos em vários postos de saúde em diversas regionais", explica o coordenador.

O representante da SMS avalia que essa lacuna histórica de médicos pode ser analisada de modo demográfico. "A grande maioria dos profissionais (médicos) mora em bairros como Cocó, Aldeota, Meireles, Bairro de Fátima. As áreas mais distantes da cidade acabam sempre ficando descobertas", acrescenta.

Além do atendimento, a ausência de profissionais, segundo avaliação do presidente do Sindicato dos Médicos no Ceará (Simec), Edmar Fernandes, compromete o vínculo entre os usuários e as equipes de saúde. Ele ressalta também que a própria funcionalidade das equipes fica desregulada.

"O médico é um elo. Sem esse elo não funciona adequadamente. O médico é quem dá o diagnóstico, avalia se o tratamento está dando certo. Algumas vezes, tem que trocar a medicação, e isto é parte da competência dele. Cada especialidade tem o papel fundamental nesse atendimento da população. Sem o médico fica desequilibrada a qualidade desse atendimento".

Outro impacto, diz o médico, é que a incompletude das equipes sobrecarrega quem atua no dia a dia nas unidades.

Novo programa

Diante da falta de médicos, a Prefeitura junto ao Governo do Estado, vem estruturando a contração de 140 novos profissionais no Programa Médico da Família. De acordo com Rui, esses profissionais deverão assumir os postos em áreas mais vulneráveis.

"A alocação deles será exatamente nas áreas de maior vulnerabilidade: nas Regionais V, III, VI. Alguns, em áreas da Regional IV e até mesmo na Regional II, no Vicente Pinzón, Serviluz, Cais do Porto e na Regional I, Vila Velha, Barra do Ceará, Cristo Redentor. São áreas que têm indicadores sociais e de saúde muito comprometedores e precisamos, do ponto de vista de igualdade social, levar melhor qualidade de serviços para esses locais", diz.

A previsão era que os médicos iniciassem o trabalho no dia 1º de julho. Mas houve um atraso na seleção e eles devem começar em 1º de agosto. Os profissionais integrarão o Curso de Pós-Graduação em Atenção Primária à Saúde (APS) a ser ofertado pela Escola de Saúde Pública do Ceará Paulo Marcelo Martins Rodrigues.

Os aprovados irão para postos de saúde durante um ano e receberão R$ 11.865 por mês. As contratações devem resolver parcialmente o problema, já que os profissionais do Mais Médicos deverão deixar as unidades. A Prefeitura, admite Rui, deverá discutir e desenvolver outras estratégias.

Em nota, o Ministério da Saúde informou, sem especificar características ou prazos, que "a Pasta trabalha na elaboração de um novo programa para ampliar a assistência na Atenção Primária". Até lá, sabem os moradores, parte da população continuará à espera de atendimento adequado.

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