Entidades filantrópicas de saúde cobram repasse de recursos

Instituições recebem quase metade dos atendimentos do SUS no Ceará, beneficiando principalmente a população mais pobre

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@diariodonordeste.com.br
Legenda: A Santa Casa de Misericórdia presta serviços de saúde na Capital há mais de 150 anos
Foto: FOTO: NATINHO RODRIGUES

Nem todo atendimento em saúde pode ser suprido pela rede pública de hospitais municipais, estaduais e federais. De forma complementar, no atendimento à população, a Federação das Misericórdias e Entidades Filantrópicas do Ceará (Femice) contabiliza 47 entidades filantrópicas em todo o Ceará. Aqui, elas respondem por mais de 40% dos atendimentos ambulatoriais e internações hospitalares realizadas no Sistema Único de Saúde (SUS), na média e alta complexidade. Mesmo com uma missão tão importante, elas encaram dificuldades financeiras para se manterem.

A Santa Casa de Misericórdia, uma das sete entidades filantrópicas de Fortaleza, presta serviços de saúde à população vulnerável da Capital (e também do interior) há mais de 150 anos. No entanto, atualmente, enfrenta os percalços da crise econômica - da diminuição de doações financeiras à ausência de repasses.

"A falta de financiamento prejudica muito o atendimento. A Santa Casa tem leito vago, mas a gente oferece para o SUS e é informado que não tem recurso", ressalta o provedor da Casa, Luiz Marques. Uma das experiências exitosas é um convênio do Governo do Estado com a Entidade para dar vazão a cirurgias de ortopedia e urologia. Só na última quarta (5), foram 52 procedimentos realizados.

Para o presidente da Femice, Marcos Granemann, o setor precisa se fortalecer para evitar fechamentos de leitos nas unidades, um problema que afeta todo o País. Conforme relatório da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o número de leitos no Ceará não acompanhou o crescimento populacional. Em 2008, eram 2,11 leitos por mil habitantes. Neste ano, com quase 570 mil habitantes a mais, caiu para 1,99 leitos por mil habitantes.

Repasse

"Hoje, são fechados, em média, 12 leitos por dia, no Brasil, por falta de condições. Para cada R$10 de gastos que uma entidade tem, ela recebe apenas R$ 6,00 pelo serviço", afirma Granemann.

De acordo com o secretário da Saúde do Ceará, Henrique Javi, o Governo do Estado destina cerca de R$ 200 milhões anuais aos municípios para fortalecer essas entidades. "Não existe um conflito entre Governo e entidades filantrópicas, o que existe é falta de recurso mesmo", reconhece.

Nesse sentido, Javi critica a persistência da Emenda Constitucional 95, que limita os gastos do Governo Federal em diversas áreas, incluindo a Saúde. Dessa forma, ocorre cada vez mais uma transferência do peso assistencial para estados e municípios, que não têm força suficiente para lidar com o problema, conforme o diretor geral das Confederações das Santas Casas, José Luiz Spigolon.

Tabela

"Os governos não têm orçamento para construir as unidades hospitalares que o País precisaria para toda a população que se vale do SUS. Hoje, nós temos 2.172 hospitais filantrópicos. O investimento necessário seria impensável", declara Spigolon.

Uma das bandeiras das entidades filantrópicas é o reajuste da tabela de pagamento do SUS, defasada há mais de 15 anos, segundo Marcos Granemann. "O ideal é uma atualização da tabela ou uma nova forma de financiamento".

Contudo, Spigolon admite que o Ministério da Saúde tem insistido na impossibilidade da correção dos valores e cita a construção de planos operativos bem traçados para os hospitais, esquecendo a tabela incluindo a orçamentação global dos gastos, como saída possível. Na opinião do secretário Henrique Javi, o caminho passa por aí mesmo. "Nós pegamos emprestado um modelo tradicional de plano de saúde para remunerar o SUS, mas isso causa um transtorno. Você recebe por uma consulta, ou um exame, mas o paciente é um todo que demanda mais que isso", analisa.

 

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