Efeitos da corrosão afetam moradores da Praia do Futuro

Só em 2016, a Enel trocou 125 postes e 28 transformadores, devido aos danos causados no local

Escrito por Patrício Lima - Especial para Cidade ,

A informação de que a Praia do Futuro, em Fortaleza, tem a segunda maior propagação de maresia do mundo, perdendo apenas para o Mar Morto, em Israel, ainda não foi comprovado cientificamente. Entretanto, os efeitos da corrosão ocasionados por esse fenômeno natural continuam dando prejuízos aos proprietários de imóveis na região, que chegam a gastar até R$ 30 mil em manutenções para evitar danos maiores. Há também moradores que conseguem conviver com a maresia, sem ter maiores prejuízos, e acreditam que a região sofre especulação imobiliária, além de preconceito por parte da população.

Pelaio Gentil, diretor do hotel Marbello Ariaú, revela que cerca de 10% do custos do seu empreendimentos são destinados à manutenção dos efeitos da maresia. "Os ar-condicionados duram em média 1 ano, por exemplo. Televisões, frigobares, computadores e outras estruturas com metais também sofrem esse processo. A solução é fazer manutenções o máximo possível de vezes. Com isso e os prejuízos, gastamos entre R$ 25 mil e R$ 30 mil. Temos que conviver com esse fenômeno da natureza e tentar utilizar materiais que não sejam tão corrosivos", afirma.

Portas

O hotel anexo ao Clube Dos Associados do Banco Central está em reforma, depois de fechar as portas há dois anos, também sofre com a maresia. O atual inquilino do prédio, Francisco Oliveira, conta que gastou mais de R$ 10 mil na reforma. "A parte elétrica estava completamente danificada por conta da maresia. A partir de agora, temos que fazer a manutenção de limpeza para tirar o sal diariamente, caso contrário teremos os mesmo problemas", ressalta o empresário. Já para o jornalista Luiz Paulo Machado, morador da região há 18 anos, a maresia da Praia do Futuro já virou um mito. "É lógico que existem problemas com isso, mas é a mesma coisa para outras casas localizadas em praias de Fortaleza. Meu prédio tem 36 anos e nunca tivemos problema maiores. Meus eletrodomésticos duram mais de 10 anos. Tomo alguns cuidados, como não deixar as janelas escancaradas durante todo o dia e a utilização de produtos especiais nos móveis e eletrodomésticos", acrescenta.

De acordo com a diretora do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Oziléa Menezes, não há nenhum dado científico que comprove que a maresia da Praia do Futuro é a segunda maior do mundo. Ela ressalta que outras praias com um número considerável de residências, a exemplo da Praia Porto das Dunas, também sofrem com o mesmo problema, porém não tão disseminado. O professor Rivelino Cavalcante, também do Labomar da UFC, iniciou em 2016 um estudo para medir a salinidade das regiões de Fortaleza. Segundo ele, a pesquisa tem como intuito observar até onde o spray marinho vai da zona litorânea para o interior da cidade. "Adquirimos um equipamento australiano, orçado em torno de R$ 65 mil, para realizar uma pesquisa inédita. Porém, ainda não temos dados conclusivos a respeito disso. Mas o que a gente pode aferir é que a salinidade em Fortaleza é considerada alta em virtude do spray marinho", explicou.

Ele pontua ainda que a salinidade na Praia do Futuro é a mesma do que em outras praias, a diferença é o arrebentamento das ondas,que transportam partículas para o ar que são disseminadas pelos ventos. "A salinidade é como qualquer outra região nos trópicos. O que acontece é que as pessoas estão morando em cima de uma duna, formada em um regime de vento, e essas edificações continuam recebendo esse spray marinho", explica o professor.

Enel

Os espaços públicos no entorno da Praia do Futuro também sofrem com ação da maresia. De acordo com dados apresentados pela Enel Fortaleza, somente no ano passado, foram trocados 125 postes e 28 transformadores, devido aos danos causados pelo fenômeno natural. Isso significa que houve um aumento de 40% de manutenção no local, comparado às demais regiões da capital cearense.

Francisco Queiroz Magalhães, gerente de operações da Enel, ressalta que a durabilidade desses equipamentos na Praia do Futuro não chegam a dois anos, sendo que eles são fabricados para serem utilizados por, pelo menos, 10 anos. "Cada poste vale em torno de R$ 5 mil. Se multiplicarmos o valor de cada poste trocado, vai dar um prejuízo considerável. Fizemos em 2016 também substituições em cerca de 2,7 quilômetros da orla da Praia, por conta desses problemas", revela.

Ele acrescenta, ainda, que a Enel realiza sistematicamente atividades de manutenção no local. "Se não fizermos manutenção vai ser ainda pior. Para evitar esses problemas, fazemos ações preventivas, inclusive durante a noite", conclui.

Já a diretora técnica do Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará (Nutec), Ieda Nadja Silva Montenegro, explica que de fato, a Praia do Futuro tem uma das maiores taxas de corrosão do mundo, porém não há como confirmar que é a segunda maior. Ela estuda há mais de 25 anos o processo em parceria com outros países ibero-americanos.

Ventos

"A alta velocidade dos ventos, poucas chuvas e a alta umidade do ar são suficientes para gerar um ambiente de propagação da ferrugem. O Mar Morto, por exemplo, tem uma salinidade altíssima, assim como a Praia do Futuro, entretanto, lá não tem o vento que nós temos aqui. Por isso, consideramos que a Praia do Futuro tem um grande potencial de corrosão", argumenta.

O vice-presidente do Conselho Regional de Imóveis do Ceará (Creci-CE), Tibério Benevides, acredita que não existe especulação imobiliária na região e que o maior problema não é a maresia, e sim, a falta de segurança. "Há muito tempo se fala em maresia nessa região, mas com o avanço da tecnologia nas edificações, isso tem se tornado algo do passado", revela.

Ele acrescenta que a questão da falta de segurança naquela área é que deve ser debatida. "Lógico que os apartamentos mais antigos sofrem com o problema da corrosão. Isso se dá porque muitos deles foram comprados por pessoas de outras cidades, que dificilmente visitavam o imóvel, e os deixavam praticamente sem manutenção, e, consequentemente, isso acaba influenciando no valor final do prédio", defende.

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