Dia de chuva, riso de sol

Escrito por Halisson Ferreira , halisson.ferreira@svm.com.br
Legenda: Em Fortaleza, os dias de chuva levam, trazem cenários e nos fazem refletir sobre o cotidiano
Foto: FOTO: NATINHO RODRIGUES

Não era nem sete da manhã e o céu já anunciava o cinza da chuva. Levantar cedo e partir para as obrigações era meu destino; e ainda teria que enfrentar a chuva? Reclamei como café da manhã. Coloquei a primeira roupa que encontrei...

Aquela pendurada na porta do guarda-roupa, mais velha; aquela que tinha testado no dia anterior e o espelho não tinha dado a aprovação; aquela que na rapidez da rotina em busca do nosso destino, encontra o seu no interior do móvel de guardar trapos. Ou seja, aquela combinação que não combina com seu momento. Fui.

Saí pra registrar o dia, não pra vivê-lo. Meio como um zumbi, fui caminhando com as reclamações mentais. Pensei: Ainda tenho dois ônibus para tomar, aposto que vão estar lotados e ainda mais abafados (janelas fechadas, típicas de dias chuvosos na cidade). Num é que acertei. Na segunda condução, o nível de simpatia já não estava lá essas coisas. A parceria fone de ouvido e celular, salvadora da pátria em muitos momentos, ainda estava em baixa; telefone descarregado. Lá fora, um verdadeiro dilúvio, e a hora de descer no ponto final já se aproximava (Ah! Só pra avisar, estava sem guarda-chuva). Com uma mão segurava a mochila, que nem nas costas poderia ficar por falta de espaço; com a outra me segurava como podia, tentando resistir às peripécias no trânsito do motorista.

Eis que surge uma garotinha, acho que no auge dos seis anos, de um sorriso ensolarado, que foi logo evaporando meu mau-humor. Ela desenhava e escrevia, com a maior alegria do mundo, naquele vidro embaçado do ônibus, e quase que suplicava pra vó um banho de chuva. Ela estava completamente encantada pelo cair das gotas do céu, nem ligava para as buzinas e sirenes do trânsito de Fortaleza. Vi aquela cena e lembrei-me, mais uma vez, da pureza das crianças, da festa contínua, das descobertas diárias.

Eu que, quando criança, queria mudar o mundo sendo um super-herói, tipo aqueles da tevê, me vi mudado pelo mundo. Mas de pronto percebi que basta variarmos um pouquinho a visão das coisas, como diz àquela canção que tantas vezes já cantarolei: "é melhor ser alegre que ser triste, a alegria é a melhor coisa que existe".

Quando crianças, queremos ser adultos; hoje, quero ser criança. No fim, desci do ônibus, fiquei encharcado, concluí meu dia, e tirei a roupa reprovada pelo espelho, mas tudo ficou tão leve. Aquela menina - nem sabe - mas ensolarou minha vida e a chuva não lavou só minha roupa, como também a alma.

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