Com usuários ativos, 1,8 mil telefones públicos restam na Capital

Em 2009, quantidade de aparelhos ultrapassava 21 mil em Fortaleza e 50 mil em todo o Ceará, mas dispositivos foram gradualmente desinstalados pelas operadoras; comunidades seguem utilizando e zelando pelos "orelhões"

Escrito por Theyse Viana / Lygia Azevedo , metro@verdesmares.com.br
Legenda: Em frente ao "Salão da Praça", orelhão serve a Álvaro e a toda a comunidade na Parangaba
Foto: Foto: Fabiane de Paula

Os botões já estão desgastados, as cabines têm algumas falhas, mas o propósito principal funciona: efetuar e receber chamadas. Protagonistas de um tempo em que celular "tijolão" era artigo de luxo, os telefones de uso público têm, aos poucos, sumido da cidade. Em dezembro de 2009, o Ceará tinha 50.547 "orelhões", 21.549 deles em Fortaleza. No mesmo mês do ano passado, o Estado e a Capital tinham, respectivamente, 35.949 e 10.371 aparelhos instalados.

Os dados são da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e apontam ainda que, de lá para cá, mais dispositivos ainda foram desativados. Até outubro deste ano, apenas 9.375 orelhões ainda resistiam em território cearense, 81,4% a menos do que há dez anos. Já em Fortaleza, dos mais de 21 mil telefones públicos, restavam 1.822, até outubro último, uma redução superior a 91,5%.

Hoje, do mais simples ao mais moderno, difícil é existir quem não tenha um celular no bolso - mas, mesmo nessa realidade, muitos ainda recorrem aos telefones públicos para se comunicar. O sinal sonoro que indica uma nova ligação recebida pelo "orelhão" da Rua Carlos Amora, na Parangaba, já é conhecido pelo barbeiro José Álvaro da Silva, 69, desde os anos 1990, quando ele mesmo se encarregou de colher 150 assinaturas em um abaixo-assinado para solicitar "o primeiro aparelho do bairro".

"Hoje, muita gente tem seu celular. Mas muitos chegam aqui, dão o toque pra alguém e a pessoa retorna. Nesse telefone, cansei de chamar gente na outra rua, ali do outro lado da praça, porque era o número que o pessoal dava", relembra o barbeiro - que, semana passada, sentiu "um membro do corpo, um braço, uma orelha" a menos, quando técnicos da operadora de telefonia retiraram o orelhão de lá.

Número pessoal

"Quando vi, o telefone já tava no chão, e eles levando. Me senti ofendido, fiquei sentido. A importância dele não tem como a gente falar com precisão, é demais. Só hoje já tocou umas duas ou três vezes. De Iguatu pra cá, muita gente liga pra mim! Minha família, meus parentes? Imagine meu prazer em receber uma ligação dessa?", descreve José Álvaro, cujo principal número da barbearia que tem há quatro décadas é aquele.

Após muitos protestos, o telefone foi reinstalado no mesmo local, fato comemorado não só pelo barbeiro, como também pelos vizinhos de longa data. Para a comerciante Irenilda Alves, 57, o orelhão ainda é útil, mas a importância é, sobretudo, pela memória. "Antigamente, eu usava demais. Tinha era fila nesse telefone, a gente tinha que esperar! Ligava pra cartão de crédito, pra família? Quase toda hora se vê uma pessoa usando esse telefone. Quando ligo pro meu marido aqui e ele não atende, ligo pro orelhão e peço pra chamarem", relembra.

O taxista Valdir Sarmento, que já exerce a profissão no mesmo ponto da Parangaba há 50 dos 88 anos de vida, relata que chegava a receber, por meio daquele orelhão, chamados para corridas. "Na época que eu não tinha celular, usava era muito, os passageiros ligavam. Hoje, tenho meu celular, mas até o pessoal (em situação de rua) aí da praça usa o aparelho pra se comunicar com a família".

Até julho de 2011, o Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo (PGMU) determinava que todas as localidades com mais de 100 habitantes deveriam contar com um telefone público, com distância de até 300 metros entre eles. Após dezembro de 2018, com o decreto nº 9619, tudo mudou: não há quantidade mínima exigida para as localidades, e os aparelhos só são instalados "mediante solicitação", em até 120 dias.

Os aparelhos já existentes em locais com até 300 habitantes devem ser mantidos, bem como aqueles em equipamentos da zona rural, como escolas públicas, estabelecimentos de saúde, comunidades quilombolas, assentamentos de trabalhadores rurais, aldeias indígenas e postos de combustíveis.

Os destaques das últimas 24h resumidos em até 8 minutos de leitura.