Banho de mar em águas impróprias é risco maior para crianças

Sem sistema imunológico completamente formado, ingestão de água do mar em praias consideradas inadequadas para banho pode causar infecções nos pequenos, com risco de prejuízos ao desenvolvimento cerebral

Escrito por Barbara Câmara , barbara.camara@diariodonordeste.com.br

Apesar da paisagem azul-esverdeada, convidativa ao olhar e ao mergulho, o mar que contorna a orla da Capital não é totalmente adequado para banhistas. A presença de coliformes termotolerantes - ou coliformes fecais - na água, em determinada quantidade, pode representar um risco de infecções por bactérias, que tendem a ser perigosas, em especial, para crianças.

Conforme o boletim de Balneabilidade de Fortaleza mais recente da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), divulgado no dia 16 deste mês, cerca de 30% da orla monitorada na Capital é imprópria para banho. Dos 31 trechos sob análise semanal pelo órgão, que vai da Barra do Ceará à Sabiaguaba (até a foz do Rio Cocó), nove são considerados impróprios, enquanto 22 são próprios para banho. "A água pode ser poluída não só por bactérias, mas também por substâncias químicas, e isso é ainda mais prejudicial para as crianças. Elas, com certeza, engolem mais água que os adultos, e são muito mais suscetíveis a alergias e a doenças", alerta o infectologista Anastácio Queiroz, do Hospital São José. Segundo ele, na infância, o sistema imunológico ainda não se formou completamente, e a pele fina também é mais exposta a agentes infecciosos, chamados patogênicos.

Infecção

A Escherichia coli está entre as bactérias encontradas em águas impróprias e ameaça a saúde com infecção urinária e diarreia. "Também pode causar quadros sistêmicos. Toda bactéria que se multiplica pelo corpo humano pode invadir a corrente sanguínea. Por isso, esses informes de quais praias são impróprias devem ser comunicados de maneira plena para a sociedade, para que as pessoas não utilizem essas praias. É um lazer que pode se transformar em algo muito grave", afirma.

O infectologista alerta, ainda, que em uma criança pequena, infecções bacterianas repetidas podem prejudicar o desenvolvimento cerebral. "Se você sobrecarrega o sistema imune, outras funções vão ficar prejudicadas".

De acordo com professor Michael Barbosa, do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), as condições impróprias de uma praia se originam a partir de três fatores: o aporte de micro-organismos que vem dos rios, a falta de saneamento e a ligação clandestina no sistema de drenagem urbana.

"Quando chove, tem esse transporte de impurezas pela água que cai, e as praias tendem a ficar mais impróprias", detalha. Segundo ele, para evitar o acúmulo de coliformes termotolerantes no oceano, próximo à faixa de areia, é preciso tratar corretamente o esgoto, "deixando-o dentro dos padrões adequados de lançamento".

Distância

Em uma das barracas de praia da Barra do Ceará, a vendedora Patrícia Freitas, 46, aproveitava a manhã de sexta-feira (23) mantendo uma distância segura da água. "Eu gosto muito de vir pra cá, mas a gente sabe como é. Tem esgoto, é conhecido. Por isso, eu não entro. Quando é pra tomar banho de mar, prefiro ir pro Cumbuco", revela. A moradora do bairro acredita que falta divulgação precisa sobre a qualidade da água, a fim de conscientizar os frequentadores. "Não é todo mundo que verifica no jornal. Deviam ter umas placas avisando".

Já a aposentada Perpétua Duarte, 69, pensa diferente: para ela, o que os olhos não veem, o 'coração' não sente. "Eu costumava ir à Praia do Futuro, mas lá ficou tudo muito caro, então comecei a vir pra cá, pra Sabiaguaba. É muito mais calmo. Eu não sinto cheiro nenhum na água, não vejo sujeira perto. Tomo banho e não sinto incômodo na pele, nenhuma coceira. Por que é que eu não vou entrar na água?", indaga.

Coleta

A coleta de amostras da água do mar acontece semanalmente em Fortaleza, seguindo a Resolução nº 274 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). As demais praias, dos litorais Leste e Oeste do Ceará, passam por coleta e análises a cada mês.

"Mesmo com baixa quantidade de coliformes, ela pode ser considerada imprópria devido a alguns fatores, como o acúmulo de óleo e a florescência de algas, algo que pode acontecer no verão. Significa que teve algum fenômeno que mudou as condições da área, algo que tem que ser pesquisado e visto", explica Gustavo Gurgel, gerente de Análise e Monitoramento da Semace.

Nos laboratórios da Superintendência, os coliformes termotolerantes foram escolhidos como indicadores da presença de agentes patogênicos, e as amostras são avaliadas com a metodologia de tubos múltiplos. A Escherichia coli e os enterococos também podem servir como indicadores nos estudos.

Gurgel avalia que, nos boletins, as praias do setor Oeste de Fortaleza comumente apresentam mais pontos desaconselháveis. "Existe muita contribuição do esgoto clandestino nas drenagens, e ali perto tem isso. As áreas que possuem uma urbanização não planejada têm um risco maior de abrigarem praias impróprias. Também pode ser por conta dos resíduos sólidos jogados na praia".

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