Amor para regenerar

Escrito por Redação ,

Amor deveria ser leveza, empatia. Amar, verbo tão natural, deveria ser fácil - ação congênita, instintivamente humana. Mas, hoje, se tornou um direito básico que precisa ser adquirido todos os dias por tantos de nós. Amar, para a gente, para as gentes, para quem está disposto a sentir, se doar e se deixar transformar é um ato revolucionário: é desafio-meta, é escolha ou renúncia diária.

Foi escolha quando Nazaré Castro, 37, chegava para mais um dia de trabalho como técnica de enfermagem no Instituto Dr. José Frota (IJF), em 2016, e partia direto ao leito em que Janaína Guilherme, 29, estava internada - fazendo os destinos colidirem como dois veículos no acaso do trânsito. O amor, então, foi literalmente por acidente. Quase dois meses e três encontros furados depois, as duas ficaram juntas pela primeira vez - união que dura até hoje e foi consolidada no último dia 16 de dezembro, quando participaram de um casamento coletivo LGBT promovido pelo projeto social Ainda Existe Amor em Fortaleza (AEAF).

O sorriso fácil e o olhar terno que Janaína doa a cada minuto são, ao mesmo tempo, combustível e cura para Nazaré, cuja família vive afastada desde que ela assumiu a homossexualidade. Com o pai, não há mais vínculo algum além do sangue. Amar, aqui, foi, então, renúncia. "Se o amor da minha vida é uma mulher, eu vou viver é com ela", diz a profissional de saúde, num tom de quem fala o óbvio. Já para Janaína, o processo foi diferente. Se no início o pai "bonecou um pouquinho" para aceitar, hoje vive "louco pela nora", e driblou até as limitações dos 74 anos de idade e do câncer de próstata que enfrenta para ir à cerimônia.

"No casamento, tava minha família todinha. Todo mundo é muito feliz com a minha escolha e com a minha companheira. Se é de você ser uma pessoa desequilibrada, é melhor aceitar a realidade e viver livre como quer", diz a auxiliar de cozinha. Na aliança enorme, cujos "milímetros tudim" foram exigidos por Nazaré, estão os nomes do casal e a data da união, definida por elas como "um desafio vencido, que abriu a mente para ajudar outras pessoas".

A meta do casal para 2019 - além de aumentar a família com mais um filho - é transformar a rejeição em amor e propagá-la por meio de um projeto social. "Graças ao que vivi e vivo, quero acolher pessoas que passam por isso e até coisas piores", explica Nazaré. A iniciativa, batizada de "Amor sem dor", contará como primeira sede a casa das duas, "que está de portas abertas para receber quem precisa conversar, ser ouvido sobre o preconceito, se orientar sobre doenças ou não souber como se assumir por medo da reação da família e da sociedade".

A princípio, ainda não há recursos nem planos concretos para expandir o projeto no ano que vem - mas o pilar essencial para viver bem e resistir em 2019, como define Janaína, já está garantido. "Sabe o que é o mais importante de tudo? É agir e pensar com amor. Isso faz uma diferença que nem tenho como dizer".

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