38% da rede de creches municipais de Fortaleza são terceirizados

Neste ano, chega a 98 o número de entidades e instituições privadas contratadas pela Prefeitura para prestar serviço de educação pública a crianças de até 3 anos. Gestão reconhece necessidade de ampliar rede própria

Escrito por Redação , metro@svm.com.br
Legenda: Conforme a SME, mais 37 centros de educação infantil devem ser entregues em 2020
Foto: FOTO: HELENE SANTOS

Todo ano, nascem, em média, 34 mil crianças em Fortaleza. O dado do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) carrega nos dígitos um grande punhado de demandas estruturais de serviços públicos: como educação, por exemplo. Na tentativa de reduzir o déficit de vagas escolares na cidade, a Prefeitura de Fortaleza firmou convênio, nessa quarta-feira (29), com 98 creches privadas - o que corresponde a quase 38% da rede pública de educação para menores de 3 anos. A necessidade de ampliar os equipamentos próprios, porém, é reconhecida pela gestão.

Em dezembro passado, mais de 13 mil crianças constavam no Registro Único (ou, popularmente, fila de espera) para obter vaga em uma creche pública da cidade. Ao fim das matrículas de 2020, pouco mais de 11 mil foram atendidas, de acordo com Dalila Saldanha, titular da Secretaria Municipal da Educação (SME), restando cerca de 1,4 mil ainda sem acesso. A própria secretária reconhece, porém, que "o número é dinâmico", e pode chegar, hoje, a cerca de 5 mil. O Registro Único visa identificar a demanda por vaga de crianças na faixa etária de 1 a 3 anos, sendo alimentado diariamente pelas unidades escolares.

Gestão

O convênio firmado ontem com 55 organizações da sociedade civil, que vão gerenciar 98 creches conveniadas à rede municipal de ensino durante este ano, supre a demanda de 7.382 crianças de 1 a 3 anos, com investimento total de R$36,7 milhões, segundo a Prefeitura. Além das creches terceirizadas, a rede conta com 162 Centros de Educação Infantil (CEIs) pertencentes ao próprio município, modalidade que, segundo avalia o prefeito Roberto Cláudio, é a mais indicada.

"O ideal seria que a gente tivesse toda a rede de creches patrimoniais, mas claro que isso não se faz num passe de mágica. Temos crescido muito, mas queremos aumentar, ano a ano, a quantidade de creches próprias. Porque nelas o Município tem 100% de responsabilidade e controle sobre a situação. Temos estudos em andamento para avaliar a qualidade de processos e entender se há diferença de resultados entre as unidades", reconhece o gestor.

As creches conveniadas são gerenciadas pelas instituições contratadas pela SME, e funcionam com estrutura e profissionais próprios. Os termos de colaboração para gerenciamento são regidos pela Lei Federal 13.019/2014, que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil.

A fiscalização das unidades, porém, fica a cargo da Prefeitura e do Ministério Público. "Toda a política pedagógica, fardamento e acompanhamento de aprendizagem são controlados pela SME, bem como o acesso às vagas. Monitoramos a qualidade e há um rigor cada vez maior em relação à estrutura, à documentação e ao histórico das entidades", garante o prefeito.

Continuidade

Questionada sobre a instabilidade deste tipo de inclusão das crianças, uma vez que os convênios são renovados ou não, todos os anos, Dalila Saldanha ressalta que "a expansão da rede conveniada não está substituindo a rede pública, mas tem sido importantíssima para atender à demanda das comunidades", sobretudo, em regiões como os Grandes Bom Jardim, Conjunto Ceará, Jangurussu e Messejana.

Conforme a SME, mais 37 CEIs devem ser entregues em Fortaleza até o fim de 2020, representando um acréscimo de 7.200 novas vagas em 2021. "Precisamos da demanda manifesta da família, porque a creche não é uma etapa obrigatória. Devemos ofertar, mas os pais só são obrigados a matricular na pré-escola. Por meio do Registro Único é que medimos a demanda", pontua Dalila.

O promotor de Justiça de Defesa da Educação do MPCE, Elnatan Oliveira, confirma que a demanda atual de vagas em creches é de cerca de 5 mil crianças, concentradas principalmente em regiões em expansão na cidade. "Foi construído o Residencial dos Escritores, em Messejana, por exemplo, mas não foi construído equipamento de educação, nem de saúde. Migraram de toda a cidade mais ou menos 2.500 famílias, que vão buscar vagas que não existem, precisando recorrer a creches e escolas de bairros vizinhos".

A construção de CEIs próprios da Prefeitura é, para o promotor, "medida urgente", mas "em curso" e amenizadas pelos convênios. A fiscalização destes, contudo, é fundamental. "Temos fiscalizado a merenda escolar, em quantidade e qualidade. Se recebemos notícia de má qualidade, abrimos procedimento. Os problemas mais recorrentes são falta de vagas, mas examinamos desde a lâmpada que quebra até a falta de professores, problemas estruturais, de inclusão e falta de cuidador", pontua o promotor.

Para Adriano Abreu, representante do Centro de Inclusão Social Renascer, contratado para gerenciar três creches públicas da Capital (Jardim Encantado, no bairro José de Alencar; Sonho de Criança II, no Santa Filomena; e Nossa Senhora de Fátima, no Conjunto Ceará), a qualidade do serviço educacional prestado pelas terceirizadas "tem crescido", mas requer presença forte da gestão municipal.

"A qualidade foi um dos pontos em que a gente mais cresceu. São feitas formações contínuas com a equipe e acompanhamento pedagógico. Porque a criança não está na creche só para a mãe trabalhar, mas para aprender e se desenvolver. A responsabilidade de formação é compartilhada, a SME tem que proporcionar essas qualificações também. A instituição sozinha não teria a proporção que tem hoje: atendemos 320 crianças, sem o convênio não teríamos chegado a isso", estima.

Os convênios e a construção de unidades "patrimoniais", sobretudo na periferia, têm "aliviado" a demanda reprimida - mas, para a representante da Associação dos Moradores do Conjunto Santa Terezinha, Maria Vilanir do Nascimento, 67, estão longe de supri-la.

"Demanda a gente tem até demais, se tivesse duas creches ainda não daria conta das crianças que estão fora da escola, na comunidade. Mas não dá pra atender todo mundo, né? Só que a creche tem uma importância muito grande pra atender a comunidade e para os pais. A gente não vê a creche pra mãe, é pra criança, pra aprender, mas muitas delas precisam ter onde deixar a criança pra trabalhar".

Atualmente, a entidade representada por Vilanir gerencia uma creche com 156 crianças, no Grande Mucuripe, fundada há 33 anos e conveniada ao Município desde 2009.

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