Dia do silêncio é um convite a desligar os barulhos externos e criar conexão com o "lado de dentro"

Opinião de Érica Bandeira Machado, psicóloga clínica de orientação junguiana

Escrito por Érica Bandeira Machado ,
Mulher contemplando a natureza sozinha
Legenda: O silêncio de que temos nos distanciado não se trata apenas de não falar, vai além: trata-se de nos desligarmos desse furacão de acontecimentos e estímulos externos e nos ligarmos ao nosso interior
Foto: Divulgação

Hoje, 07 de maio, é comemorado o Dia do Silêncio, data instituída pela OMS – Organização Mundial de Saúde. A origem, incerta, é supostamente inspirada nas práticas milenares de meditação. Mas, independente de qual seja a origem da data, sua maior importância deve-se ao seu objetivo de conscientizar as pessoas dos males que a poluição sonora é capaz de provocar e, portanto, da importância do silêncio para a uma melhor saúde e qualidade de vida.

A poluição sonora presente na vida urbana pode trazer prejuízos à concentração, aumentar os níveis de estresse e até prejudicar a audição. Além disso, o excesso de ruídos e atividades no nosso dia a dia nos atrai e nos fixa no mundo externo, contribuindo para que nos afastemos do nosso mundo interno.

Veja também

O nosso mundo interno está sempre presente, precisando da nossa atenção. Mas a vida cada vez mais agitada que levamos, especialmente nos últimos 30 anos, nos tem feito desaprender a silenciar. Hoje em dia, com a Internet e o uso cada vez mais ininterrupto de celulares, estamos o tempo todo conectados, lendo notícias, interagindo nas redes sociais, ouvindo músicas. Mesmo que estejamos sozinhos nos distraindo com essas atividades, elas não equivalem ao silêncio.

O silêncio de que temos nos distanciado não se trata apenas de não falar, vai além: trata-se de nos desligarmos desse furacão de acontecimentos e estímulos externos e nos ligarmos ao nosso interior, olharmos para dentro e cultivarmos uma relação com nós mesmos.

A ausência de conexão com nossa vida interior pode gerar uma série de consequências para a saúde mental e emocional, como aumento da ansiedade, estresse, depressão.

Por isso, é imprescindível que aprendamos e cultivemos o hábito de silenciar, ato importante de introspecção que cria um espaço mental e emocional para digerir emoções, organizar ideias, modular afetos e elaborar experiências. Quando silenciamos, somos levados a conhecer lugares novos da nossa mente, encontrar potenciais inexplorados, fortalecer a intuição e até encontrar soluções que só são possíveis quando nos damos tempo e espaço para pensar e sentir.

psicóloga Erica Bandeira
Legenda: Érica Bandeira Machado, psicóloga clínica de orientação junguiana
Foto: Divulgação

É fundamental iniciar por uma tomada de decisão e, junto a isso, adotar hábitos e atividades que favoreçam a conexão com o “lado de dentro”, nem que seja por alguns minutos, todos os dias. Fazer uma psicoterapia, uma caminhada, um esporte que se pratica só, como corrida ou natação, meditar, rezar/orar, contemplar a natureza e até envolver-se em atividades artesanais e relaxantes são exemplos de como podemos construir o hábito do silêncio.

Num modo de vida tão cheio de exigências, exposição e olhares de uns sobre os outros, é um gesto de autocuidado protegermos o quanto possível a nossa privacidade e ampliarmos o autoconhecimento.

E, para inspirar a começar, convido-os à bela experiência estética de apreciar a música e letra de Arnaldo Antunes e Antônio Carlos de Freitas, intitulada “O Silêncio”:

Antes de existir computador existia tevê
Antes de existir tevê existia luz elétrica
Antes de existir luz elétrica existia bicicleta
Antes de existir bicicleta existia enciclopédia
Antes de existir enciclopédia existia alfabeto
Antes de existir alfabeto existia a voz
Antes de existir a voz existia o silêncio
O silêncio

Foi a primeira coisa que existiu
Um silêncio que ninguém ouviu
Astro pelo céu em movimento
E o som do gelo derretendo
O barulho do cabelo em crescimento
E a música do vento
E a matéria em decomposição
A barriga digerindo o pão
Explosão de semente sob o chão
Diamante nascendo do carvão
Homem pedra planta bicho flor
Luz elétrica tevê computador
Batedeira, liquidificador
Vamos ouvir esse silêncio meu amor

Amplificado no amplificador
Do estetoscópio do doutor
No lado esquerdo do peito, esse tambor