Filha faz homenagem para mãe com serenata: “É muito importante ressignificar o ritual”

Tuty Osório recebeu a surpresa durante o aniversário e já no clima de Dia das Mães; iniciativa deriva do projeto cearense “Desce, vai ter serenata”

Dentre as tantas canções da infância de Camilla Osório, 24, uma ecoa na mente toda vez que é chegada a hora de dormir. Com ela, vem tudo: o clima de aconchego, as alegrias ou decepções do dia que passou, a lembrança da mãe entoando a música baixinho, sossegando o espírito. “Se essa rua, se essa rua fosse minha”.

Não demorou, assim, para que a cineasta cearense escolhesse qual melodia poderia aquecer o coração de Tuty Osório, 56, no dia do aniversário da jornalista, celebrado neste sábado (1º). A intepretação da cantiga de ninar arrancou suspiros da matriarca, embora não apenas: o modo como o instante se deu ultrapassou o comum e instaurou novo fôlego.

Da sacada do apartamento no bairro Meireles, em Fortaleza, Tuty presenciou pessoas cantando para ela, em cortejo afetivo. Camilla também estava presente, olhando para o alto, para a própria mãe, a fim de celebrar mais um ciclo dela e, de quebra, adiantar as comemorações pelo Dia das Mães, no próximo domingo (9).

“Esses tempos são muito difíceis e a gente fica procurando formas de ter momentos de emoção, de alegria”, comenta.

A iniciativa deriva do projeto “Desce, vai ter serenata”, criado e realizado pelas celebrantes de casamento Lara Rovere, Sarah Coelho e Juliana Julião. A ação nasceu a partir da emoção de Lara ao assistir a uma loucura de amor perto da casa onde mora.

“Comentei com a minha família e com as meninas, pois já trabalhamos juntas, que, por incrível que pareça, apesar dos clichês e do movimento todo das loucuras de amor tradicionais, eu estava emocionada”, diz.

A partir dali, o trio partilhou inquietações e decidiu lançar o projeto para o mundo, valendo-se sobretudo da proximidade do Dia das Mães para multiplicar as possibilidades de abraço durante a pandemia de Covid-19. “Na verdade, inicialmente foi pensado para essa data, mas eu acho que a gente não vai deixar esse samba morrer, não”, confessa Lara. “É algo muito bonito para ficar numa data só”.

Conhecer as histórias

Segundo as celebrantes, o diferencial do projeto é a proposta personalizada das homenagens, algo que já era realizado por elas antes da pandemia do novo coronavírus, envolvendo casais. Para isso, primeiro é feita uma entrevista com um parente da pessoa que receberá a serenata, de modo a colher informações sobre aspectos da trajetória dela.

Depois, os dados são recolhidos e transformados em um texto, refletindo todos os aspectos importantes do caminhar do homenageado. “Diferentemente das tradicionais loucuras de amor, fazemos algo bem mais intimista e pessoal, pois não estamos falando de um texto pronto, mas algo que tem a ver com aquela pessoa”, detalha Sarah Coelho.

Pode haver ainda uma sugestão de músicas para coroar o instante de celebração, mediante diálogo com os familiares. No presente dia da homenagem, a atmosfera é de um verdadeiro sarau, com a participação de uma das celebrantes, um músico e um fotógrafo, perpetuando a lembrança também em registro físico. 

“Tem poesia, música, por vezes a interação dos transeuntes, dos vizinhos… Há toda essa dinâmica, e assim vamos montando o roteiro”, enumera Sarah. “Ao mesmo tempo, colocamos o ‘Desce’ no nome do projeto porque queremos fazer tudo com a maior segurança possível, chamando a pessoa para descer até o térreo, no caso de um apartamento mais alto, ou ficando no jardim, se for uma casa. Assim, ela ouve tudo sendo realizado sem microfone, de modo mais intimista, e sem gente na casa dela de fato”,  completa Lara.

A homenagem de Camilla Osório à mãe, Tuty, foi a primeira empreitada da ação e não poderia ter sido mais emocionante, segundo a cineasta. “Minha mãe gosta muito de música de seresta, de MPB, então pensei, ‘Isso é a cara dela, ela vai amar'. Todo o formato é muito perfeito. E também a gente mora num prédio que tem uma varanda perfeita para uma serenata. Eu sabia que ela ia gostar e que ia ser ótimo, mas foi muito mais emocionante do que eu pensava”, observa.

A magia do encontro

Tuty Osório complementa a fala da filha ao revelar que foi a primeira vez que recebeu uma serenata. “Já cantaram algumas vezes para mim, mas uma serenata surpresa assim, ainda não”, ri. “Foi uma grande emoção. Compensa pelo fato de você não poder reunir as pessoas que gosta neste momento. Tudo foi feito com muita beleza, com as músicas que eu gosto e ainda com o texto”.

“Acho que é fundamental pensar em bolar opções para homenagear a pessoa que você gosta, principalmente agora. Até porque a repercussão vai além da sua intimidade. Aqui no prédio, por exemplo, os vizinhos mandaram beijo, eu mandei fotos para os amigos pela internet, ou seja, acolheu o coração de muito mais gente para além de mim, que fui a homenageada. É uma forma de a gente estar junto, consolando um ao outro", reflete.

"Só o amor vai poder fazer a gente permanecer lúcido”, complementa.

Ao que Camilla sublinha: “Essa situação da serenata envolvendo o aniversário dela e o Dia das Mães me traz como mensagem a importância de a gente não perder de vista o que é realmente importante. E valorizar o ritual, as formas que temos de ressignificá-lo, uma vez que ele tem o papel de nos manter vivos. São formas de seguirmos em frente”.

Lara Rovere, Sarah Coelho e Juliana Julião tecem considerações semelhantes. Não à toa, elas já estão se preparando para repetir o movimento de tributo no Dia das Mães que já acena no calendário, otimizando outras formas de dizer “Eu te amo”. 

“Acho que o desejo de as pessoas homenagearem outras na porta de casa nasceu desde que o violão surgiu. Mas, nesse instante, de uma forma específica, todos estão mais emotivos, se dando conta de como faz falta abrir a porta de casa e receber as pessoas que você gosta”, observa Sarah, comentando a respeito da perpetuação das serenatas no tempo presente.

“É uma sensação muito bonita, de que ainda é possível as pessoas repararem umas nas outras. A serenata nunca saiu de moda. A gente acha que ela é uma coisa antiga, mas ainda é muito forte, continua tocando. Acompanhar a ação de ontem e as outras que ainda virão está sendo uma injeção de ânimo”, destaca Juliana Julião.

Quanto à Tuty, envolvida com o espírito de ternura do projeto, é enfática ao comentar sobre mais um Dia das Mães vivenciado na pandemia: “A maternidade é uma grande festa que acontece dentro da gente. Eu vivo muito isso. E é muito importante, neste momento, que a gente celebre essa maternidade em todos os sentidos, inclusive da Mãe Terra, da Mãe Tempo. Que celebremos quem a gente é porque somos divinos”.


Serviço
Projeto “Desce, vai ter serenata”
Mais informações por meio dos perfis de Lara Rovere (@escritoseritos), Sarah Coelho (@tantocelebracoes) e Juliana Julião (@laco.celebracoes), no Instagram