Editorial: O pré-sal e a desigualdade

Desigualdade é uma pauta, essencialmente, transversal. É mais comumente pensada como questão própria da economia, mas é determinante e manifesta em outros domínios sociais. Não poderia ser diferente, dada suas raízes estarem fincadas em muitos domínios. Trata-se, sempre, de quadro de complexa análise, cujas determinações precisam ser buscadas no contexto histórico, nas realidades culturais, no comportamento econômico e nas decisões políticas, passadas e presentes.

Neste tópico, o histórico brasileiro é longo. Se faz presente em todas as partes do País e, ainda mais, se ele for olhado de forma ampla, permitindo a comparação entre os entes da federação. Sofre-se ainda efeitos de passado remoto – como o regime colonial, que se arrastou por mais de três séculos, e da ainda mais tardia Abolição da Escravatura. 

Estudos de Economia da Desigualdade, como os empreendidos pelo economista francês Thomas Piketty, indicam que os descompassos sociais sofrem maiores impactos de determinantes políticos históricos, do que aqueles exclusivamente econômicos. A transformação destes quadros, com redução da desigualdade, termina por depender mais da política do que da própria economia. 

Exemplo auspicioso desta constatação é o movimento que se observa no Congresso Nacional, no sentido de definir a destinação de recursos do pré-sal. Tramita no Senado Federal a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 98/2019), que regula a distribuição da cessão onerosa dos recursos explorados no petróleo nacional. A ser aprovado, em votação esperada para hoje, o texto determina a distribuição de R$ 21 bilhões entre estados e municípios. 

A fatia que caberá ao Ceará condiz com a necessidade do Estado e seus municípios, podendo chegar a R$ 1,2 bilhão, ainda neste ano. Pelas regras propostas, ao Estado caberia o valor de R$ 692 milhões, enquanto aos 184 municípios seriam destinados um montante de R$ 543 milhões a serem pagos já no mês de dezembro. 

A exploração do pré-sal foi ordenada a partir de acordo feito entre União e Petrobras, em 2010, que serviu de base para a lei 12.276, do mesmo ano. Determinou-se, então, o limite de exploração dos 5 bilhões de barris de “equivalentes de petróleo”. Os volumes excedentes seriam então leiloados e os valores arrecadados, divididos entre os entes federativos. Do total arrecadado, 15% seriam divididos entre os estados e o Distrito Federal e outros 15%, entre todos os municípios. A maneira como estes percentuais seriam distribuídos está pendente. 

A PEC propõe a adoção dos critérios para a repartição dos percentuais a estados e municípios idênticos aos do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e Distrito Federal e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Entre as variáveis que estes dispositivos consideram, está a renda per capita, o que beneficia unidades mais pobres. A proporção, portanto, se guia por um parâmetro que almeja a redução das disparidades regionais. 

Medidas do gênero devem ser apoiadas por se pautarem em espírito que condiz com que é esperado de uma federação. A desigualdade, impossível de se apagar do passado do País, pode ser redefinida no futuro, com as decisões políticas acertadas.