Editorial: A língua é a pátria

A Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) celebra, hoje (10), com solenidade na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, EUA, o Dia da Língua Portuguesa, que transcorreu domingo último. O idioma é falado por 280 milhões de pessoas em todo o Globo, tendo inquestionável relevância na cena internacional a partir dos países lusófonos.

O português se faz presente na diversidade de sotaques e expressões regionais brasileiras e é a língua de trabalho de organismos como a União Africana e a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental. Tem, desse modo, destacado posicionamento social e vem imprimindo óbvia representatividade a relações fundamentais para cidadãos de origens distintas.

A abordagem agendada para a ONU consolida, de certo modo, o acordo que em 1990 obteve a adesão do Brasil, Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, pelo qual novas regras passariam a normatizar o escrever e o falar, buscando unificar o ensino e o aprendizado do idioma nos países que o adotam, com evidentes reflexos para o restante das nações. Pode-se, então, compreender o tratado – que foi posto para vigorar em 2016 – como um gesto político que estimula a conciliação cultural entre nações da América, da África, da Europa e da Ásia e que, assim, se concentra na pertinente e desejada integração entre cidadãos.

A propósito, o documento, que encerra o acordo, ressalta que se “constitui um passo importante para a defesa da unidade essencial da língua portuguesa e para o seu prestígio internacional”. A própria ONU promove o ensino de Português em Escola Internacional que mantém, num projeto-piloto com foco extracurricular, contemplando alunos de 8 a 18 anos de idade.

Ao se tratar do idioma é necessário, com igual atenção, observar o que a nossa Constituição determinou em 1988: “A língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil” (art. 13); e “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais” (art. 215).

É a respeito desse conjunto de situações, e do fortalecimento que a junção de diferentes fatores permite, que configuram-se preocupantes para a identidade e a cidadania as menções e as ações que tratam de uma eventual revogação do acordo ortográfico.

A Comissão de Educação da Câmara de Deputados até aprovou requerimento de audiência pública, com data a ser acertada, com a finalidade de debater essa possibilidade com representações da sociedade, assim como já teriam emanado do Palácio do Planalto sugestões de simpatia à aventada revogação.

Os que defendem o retorno às definições passadas desconsideram os impactos educacional, econômico, cultural, editorial e das relações entre povos que poderiam decorrer da medida. Também são desprezados os fatos de que o Brasil é apenas um dos signatários e, em enorme e perigosa gravidade, que uma decisão unilateral o isolaria de um contexto em que estão mais sete países.

Definitivamente, estão postos novos tempos. E, diferentemente do que se põe, recuar seria o pior dos cenários.


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