Saiba quem é Eve Babitz, cuja obra chega ao Brasil com segredos da cena underground de Los Angeles dos anos 1970
Livro "Dias Lentos, Encontros Fugazes: O mundo, a carne e Los Angeles", lançado pela editora Amarcord, é a primeira tradução de Eve no Brasil

Em uma Los Angeles ensolarada e fugaz, a jornalista, artista visual e escritora Eve Babitz mergulha na cena underground hollywoodiana dos anos 1970 e 1980. O espírito do tempo é atravessado por drogas, festas, sexo e confidências. Em "Dias Lentos, Encontros Fugazes: O mundo, a carne e Los Angeles" (2025), com tradução inédita no Brasil realizada por Cecilia Madonna Young, os leitores têm acesso a uma imersão quase fitzgeraldiana da época.
"Talvez o sol tivesse me levado à loucura", chega a declarar Eve em determinado ponto da narrativa. Ao longo dos capítulos, vai gradualmente apresentando observações perspicazes sobre lugares, pessoas, bebidas e músicas, transportando o leitor para o universo de seu cotidiano de maneira tão profunda que deixar o livro de lado se torna um desafio em si.
Em "O Grande Gatsby", de F. Scott Fitzgerald, os personagens são levados à loucura na Nova York dos anos 1920. Já na obra de Eve, é a sequidão, o calor de quase quarenta e três graus e os ventos secos que tomam conta da cena. Apesar do que possa parecer, esse cenário é familiar para Eve de um modo quase acolhedor. "Conheço esse tipo de vento como os esquimós conhecem a neve".
@diariodonordeste Em uma Los Angeles ensolarada e fugaz, a jornalista, artista visual e escritora Eve Babitz mergulha na cena underground hollywoodiana dos anos 1970 e 1980. O espírito do tempo é atravessado por drogas, festas, sexo e confidências. Em "Dias Lentos, Encontros Fugazes: O mundo, a carne e Los Angeles" (2025), com tradução inédita no Brasil realizada por Cecilia Madonna Young, os leitores têm acesso a uma imersão quase fitzgeraldiana da época. #booktokbrasil #booktok #tiktokbrasil #evebabitz #evebabitzbooks #amarcord #DiáriodoNordeste ♬ som original - Diário do Nordeste
Com oito livros publicados nos Estados Unidos, essa obra é a primeira a chegar ao Brasil. Para a tradutora de Eve, a jornalista e escritora Cecilia Madonna, esse é um tipo de livro que coloca o leitor dentro da história. Ao longo de quatro meses, traduziu com zelo, buscando ser fiel ao universo e aos maneirismos apresentados na escrita da californiana.
“Para mim, a importância é tanta que não consigo colocar em palavras. Sou uma pessoa que sempre vejo muita injustiça quando uma pessoa boa não tem a atenção que deveria”.
Para ela, Eve era uma dessas pessoas: injustiçada pela literatura. O que torna compreensível a imensa alegria de traduzir Babitz para o português, em uma jornada atravessada pelo encanto e pela paixão.
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Primeira tradução de Eve Babitz no Brasil
A escritora de “Tudo o que posso te contar” (2024), inclusive, revelou que sua paixão pela história de Eve — que ela vinha estudando de forma mais aprofundada durante a faculdade — contribuiu na luta contra essa injustiça de Babitz ainda não ser traduzida no Brasil.
“Falei com minha editora que Eve foi uma autora que me inspirou muito, que foi tema da minha pesquisa do TCC, porque eu estudei o novo jornalismo...Muita gente fala da Joan Didion, mas a Eve também fez parte”. Assim, quando surgiu a oportunidade de traduzir em novo lançamento da editora Amarcord, Cecilia recebeu o convite.
“É minha primeira tradução, o processo foi bem inesperado”, declarou. Ainda assim, antes de receber o manuscrito para começar seu trabalho, mergulhou em uma das biografias da artista visual e escritora estadunidense.
Ler como se conversasse com uma amiga
Apesar de já ser familiarizada com a escrita de Eve, Cecilia revelou que os maneirismos e os termos americanos da época foram parte do desafio da tradução. "Quando eu estava lendo, se tivesse uma palavra que eu não entendia, seguia em frente para entender o sentido, mas traduzindo, você tem que prestar atenção em toda a palavra. No sentido dela, no que Eve quis dizer".
Para buscar a melhor tradução, o caminho não foi recorrer ao "pé da letra", mas tentar entender as nuances, "entrar na mente de Eve", buscando compreender o que ela estava procurando dizer na construção de suas frases.
"Eu me encontrava me surpreendendo com ela. Foi obviamente difícil, mas eu realmente passava o dia inteiro como se estivesse conversando com uma amiga. Eu ficava cansada depois de trabalhar, mas tinha uma parte de mim que pensava: 'mas, nossa, descobri tanta coisa'".
Apesar da dificuldade, ela se vê emocionada com o resultado. "A Eve era meio esquecida da história dos anos 70 e 80, que é super interessante. E está na hora de falar mais dela, de trazer ela mais para o mundo".
Quem foi Eve Babitz?
Eve Babitz nasceu em Los Angeles, em 1943, e faleceu em 2021. Além de escritora e jornalista, também foi artista visual, nascendo no auge da época de ouro de Hollywood.
Sua mãe, Mae Babitz, assim como ela, era artista visual. Seu pai, Sol Babitz, era violinista da 20th Century Fox, enquanto seu padrinho era o compositor clássico Igor Stravinsky.
Em uma posição privilegiada, ela transitou em ambientes da cena musical e cinematográfica de Los Angeles, conseguindo traduzir suas diversas experiências, aventuras e festas na escrita. Ela também foi amiga de Joan Didion, outra escritora responsável por captar e traduzir Los Angeles.
Durante sua juventude, foi amante de atores famosos, como Harrison Ford, e de ícones do rock, como Jim Morrison. A música LA Woman, inclusive? Muitos dizem se tratar de uma homenagem para Eve Babitz, que tem um livro com mesmo nome.
Acima de tudo, ela também foi a figura considerada disruptiva, que usava drogas, não se importava de ser fotografada nua em uma partida de xadrez por Marcel Duchamp. Um dos símbolos da contracultura dos anos 1970 e 1980, proclama a liberdade sexual e intelectual enquanto habita essa "cidade invisível" que afirma ser L.A.
Quais os livros de Eve Babitz?
Dentre as obras dela, estão títulos, como:
- Eve's Hollywood (1974)
- Slow Days, Fast Company: The World, The Flesh, and L.A.: Tales (1977)
- Sex and Rage: Advice to Young Ladies Eager for a Good Time; a Novel (1979)
- L.A. Woman (1982)
- Black Swans: Stories (1993)
- Fiorucci, The Book (1980)
- Two by Two: Tango, Two-step, and the L.A. Night (1999)
- I Used to Be Charming: The Rest of Eve Babitz (2019)
Confira trechos de 'Dias Lentos, Encontros Fugazes'
Ao descrever Los Angeles, Eve destaca que é uma "cidade invisível com o nome de uma planta que nunca existiu, batizada por um clã que fica à espera do embarque no próximo filme". Outros trechos também marcam esse tom de Babitz, como:
- "Nunca pensei que a personalidade externa que construí, materializada em uma senhorita elegante e blasé hollywoodiana, iria se esfacelar no primeiro embate com esses americanos de uniforme branco lá embaixo (jogadores de baseball), mas ali estava eu. Fissurada";
- "Era como se tivesse dito a alguém como o filme era bom e, para provar minha sinceridade, me oferecesse para ir com ele numa sessão, tipo cortar os próprios punhos. Talvez o sol tivesse me levado à loucura";
- "Como eu sempre digo, o sol nasceu no domingo deixando o passado ficar congelado no passado";
- "Em Hollywood, evitamos discussões sobre realidades concretas como o futuro";
- "Os pilares desengonçados do subsolo do Chateau Marmont suportam o passado".
Inclusive, o conto "The Garden of Alah", em que Eve ambienta o leitor no icônico hotel Chateau Marmont, que chegou a ser retratado em um filme da diretora Sofia Coppola, em 2010. O hotel, construído em 1927, já recebeu diversas celebridades, incluindo Jim Morrison e os integrantes do Led Zeppelin.
Serviço
- Livro: Dias Lentos, Encontros Fugazes: O mundo, a carne e Los Angeles
- Editora: Amarcord
- Quantidade de páginas: 240 páginas
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