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Multa, fiscalização e incentivo: entenda novas ações para garantir igualdade salarial entre gêneros

Projetos de lei de autoria do Poder Executivo tanto a nível federal como estadual já estão sob análise do Legislativo

Escrito por Luana Barros , luana.barros@svm.com.br
Legenda: Objetivo é obrigar empresas a cumprirem normas de igualdade salarial
Foto: Shutterstock

Neste mês da mulher, a igualdade salarial entre homens e mulheres é foco de projetos de lei enviados tanto pelo governo federal como pelo Governo do Ceará para as respectivas casas legislativas. O assunto não é novo e está previsto na Constituição Federal e no decreto da  Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT. Contudo, a falta de cumprimento continua a ser um problema encarado diariamente por milhares de trabalhadoras no País e no estado. 

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em média, mulheres recebem salários com valor 22% inferior ao recebido por homens no País. No Ceará, o cenário não é diferente: a diferença salarial entre os gêneros é de 18%, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) no 3º trimestre de 2022. 

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A nível federal, o modo encontrado para tentar reverter este cenário de desigualdade foi endurecer a regra que garante que os salários de homens e mulheres sejam iguais no desempenho da mesma função. Além da exigência de maior transparência por parte das empresas – inclusive para otimizar a fiscalização –, a multa para quem descumprir a regra poderá chegar a dez vezes o valor do maior salário pago pela empresa infratora – uma ampliação em relação ao aplicado atualmente.

No Ceará, projetos de lei que tratam do tema também estão em discussão. Um deles é de autoria do Governo do Ceará e foi anunciado no último dia 8 de março pela vice-governadora Jade Romero (MDB), que também é a titular da Secretaria das Mulheres. 

A proposta, que já está em análise pela Assembleia Legislativa, pretende criar selo pró-equidade de gênero e raça tanto para organizações privadas como públicas. Além disso, projetos de parlamentares também propõem a igualdade salarial como um dos pontos exigidos de empresas que queiram firmar contratos com o Poder Público. 

Regra de igualdade salarial já prevista na legislação

Sócia do escritório Henrique Lavor Advogados e professora de Direito do Trabalho e Processos do Trabalho na Universidade de Fortaleza, Williane Pontes aponta que qualquer iniciativa que tenha como objetivo a equidade salarial entre gêneros é positiva. 

"Mas de forma alguma é um assunto novo", reforça. "A gente tem (essa igualdade) como preceito constitucional essa igualdade", completa. Além da Constituição Federal, a equidade também é prevista na CLT.  

"Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil"
Constituição Federal

A professora ressalta, no entanto, que a discussão do tema – propiciada pela análise de projetos de lei, por exemplo – já é positiva. "Estamos discutindo, estamos trazendo o assunto a discussão. (Mas) Existem outras medidas que são tão ou mais efetivas, porque legislação já tem", ressalta. 

Uma das previsões do projeto de lei anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Dia da Mulher e já enviado para o Congresso Nacional é, além do reforço da obrigatoriedade da equidade salarial, medidas de transparência para facilitar a fiscalização. 

Entre as previsões do texto, estão:

  • Publicação de relatórios de transparência salarial por empresas com mais de 20 empregados;
  • Edição de protocolo de fiscalização contra discriminação salarial e remuneratória entre mulheres e homens pelo Ministério do Trabalho; 
  • Caso seja identificada desigualdade, implementação de plano de ação pela empresa para mitigar a diferença, com metas e prazos;
  • Em caso de descumprimento, aplicação de multa equivalente a cinco vezes o maior salário pago pelo empregador, elevada em 50% em caso de reincidência;
  • Autoriza a Justiça a emitir decisão liminar, antes do final do processo, para forçar empresa a pagar imediatamente o mesmo salário para empregada prejudicada. 

"Vai ter muita gente que não vai querer pagar, mas para isso a Justiça tem que funcionar. (...) Quando aceitamos que mulher ganhe menos que homem na mesma função, estamos perpetuando uma violência histórica", declarou Lula ao anunciar o projeto.

Pontes ressalta que iniciativas que "mexam no bolso de quem contrata" são sempre importantes, mas que o foco deve ser a efetividade da fiscalização. "A fiscalização efetiva continua sendo a melhor das alternativas para dar uma equidade efetiva", afirma. Ela cita que trabalhos junto a associações e sindicatos para orientação das mulheres, além de canais de denúncias, inclusive dentro das empresas, são importantes para garantir a igualdade salarial no mercado de trabalho. 

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Medidas a nível estadual

Iniciativas para garantir a equidade salarial também estão sendo propostas a nível estadual. O governador Elmano de Freitas enviou projeto de lei para criar o selo "Equidade de Gênero e Inclusão" voltado a incentivar que organizações públicas e privadas adotem medidas para garantir a igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho.

Esta iniciativa já havia sido anunciada, no Dia da Mulher, pela vice-governadora Jade Romero. Caso aprovado, o selo será conferido pela Secretaria das Mulheres, da qual Romero é a titular. No dia, também foram anunciadas outras ações voltadas às mulheres, como a construção de Casas da Mulher Cearense. 

"Continuamos trabalhando firme, ao lado do governador Elmano, para promover o protagonismo feminino na nossa sociedade", afirmou a vice-governadora.

A proposta de autoria do Poder Executivo foi diretamente inspirada em projeto de indicação de autoria da deputada estadual Larissa Gaspar (PT), que ainda está em tramitação na Assembleia Legislativa. 

Caso aprovada, fica prevista a criação de um Comitê de Avaliação para conceder o selo por prazo de dois anos em diferentes categorias, como bronze, prata e ouro. Entre os critérios, estão políticas adotadas desde a seleção até a ascensão funcional e planos de carreira. 

Também será analisada se a empresa possui políticas diferenciadas de licença parental e para prevenir, por exemplo, assédios moral e sexual; e se existem mecanismos de contratação de mulheres em situação de vulnerabilidade, como as vítimas de violência doméstica e familiar. 

O texto está agora sob análise dos deputados estaduais e recebeu parecer favorável do relator da matéria, Romeu Aldigueri (PDT), na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa. Contudo, ainda não foi à votação por conta de pedido de vistas da deputada Dra. Silvana (PL). 

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Contratos com o Poder Público

Outra forma de incentivo proposta por parlamentares estaduais é incluir a igualdade salarial como um dos critérios para que empresas privadas possam fazer contratos com o Governo do Estado. O projeto de lei é de autoria das deputadas Gabriela Aguiar (PSD) e Larissa Gaspar (PT). 

Segundo o texto, "todos os órgãos da Administração Pública Direta, Indireta e Fundacional do Estado do Ceará deverão requisitar das empresas vencedoras de processos licitatórios, pertinente a obras e serviços, como condição para a assinatura do contrato, a comprovação formal de equidade salarial em seu quadro de funcionários". 

Caso seja identificada uma discrepância "injustificada" entre salários de homens e mulheres que ocupem a mesma função, a empresa vencedora do processo licitatório deverá apresentar Plano Pormenorizado de Adoção, com ações afirmativas para garantir a equidade. 

Ainda segundo a proposta, o prazo para implementação destas ações é de 90 dias e, se não for cumprido, o contrato deve ser rescindido. 

Para a professora Williane Pontes, iniciativas como essa ou a criação de selo pró-equidade também são importantes por trazer à tona a discussão sobre a igualdade salarial. 

"Sempre é válido. Sempre traz algum benefício, nem que seja de reflexão. Já tem leis, o que vai diferenciar são planos de ação e fiscalização para que possa acontecer. Agora, não tenha dúvida, quanto mais se fala do assunto, mais se traz a claridade, principalmente para as mulheres, de que isso não pode ser assim".
Williane Pontes
Professora da Unifor

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