Brincar é o verbo que se conjuga para tratar do Carnaval. Nos quatro dias desta festa popular, realizada em muitas partes do mundo, mas de espírito verdadeiramente brasileiro, a brincadeira é autorizada. Mais do que isso, é incentivada, a todas as faixas etárias, não havendo distinção de gênero, credo ou classe social. Momo reina no território e no tempo das fantasias, tanto daquelas que povoam a mente como as que recobrem os corpos. A festa desempenha um papel importante para a sociedade, não apenas por proporcionar um tempo em que o fluxo cotidiano, com suas tensões, é interrompido. As celebrações coletivas – e entre elas, o Carnaval – são importantes momentos de socialização, de estreitamento de laços de uma comunidade, processo que inicia mesmo antes de sua realização, no trabalho que as antecede, na preparação dos festejos. Festa da alegria e da celebração coletiva, o Carnaval é tempo e lugar de questionamento das normas, dos padrões e das formas habituais de viver o cotidiano. Não à toa, mesmo na brincadeira, o discurso político se faz presente e a crítica jocosa aponta o dedo para problemas graves da sociedade; e o repertório do que é submetido à crítica é renovado ano a ano. Por este meio, contribui para que se encare o que não pode ser ignorado, que se pense, que aja e que se mude. Os tabus do sexo e da nudez, por exemplo, há muito que são menos tabus, e foram questionados primeiro no Carnaval, em sua potência criativa. É de se lamentar, por isso, o cancelamento de festas carnavalescas programadas em municípios do interior do Estado, no bojo das recentes incertezas no campo da segurança pública, provocadas pela paralisação de atividades e dos motins de parte dos policiais militares. Soma-se, assim, às festividades que municípios do interior já haviam desistido de realizar neste ano. Há, tradicionalmente, certa instabilidade dos eventos carnavalescos. No começo do ano, outros já haviam sido suspensos por questões financeiras, para que seus recursos fossem realocados em outras áreas, como a saúde pública. Na semana que antecedeu o período carnavalesco, o Governo do Estado buscou contornar o impasse com os policiais militares, pela via do diálogo e da negociação, no que era então uma discussão sobre salários para os integrantes da corporação. Diante da interrupção do diálogo, o Palácio da Abolição tem respondido aos atos de insubmissão de forma rigorosa, não admitindo recuos em sua proposta diante da indisciplina dos amotinados. O Estado também foi ágil em pedir apoio ao Governo Federal, e o reforço já se faz presente com os homens da Força Nacional e do Exército Brasileiro. O objetivo é a manutenção da ordem e a defesa do cidadão e do patrimônio, público e privado, reforçando a atuação dos policiais que seguem desempenhando suas funções. O momento, contudo, não é de desmonte do Carnaval. Programações confirmadas e disposição do folião mantêm a festa. O tempo de brincadeira também se leva a sério, movimenta a economia e é motor da alegria, esperada com ansiedade ao longo de um ano por seus entusiasmados adeptos – que se antecipam e vão às ruas no cada vez mais forte movimento de Pré-Carnaval.