Maurício Souza: homofobia ou emprego do Direito Fundamental à Imbecilidade?

A demissão de Maurício foi, até onde consta, sem justa causa, com o pagamento de todos os direitos – mas, se existir cláusula no contrato de trabalho proibindo a emissão de opiniões como essa, poderá ter sido por justa causa

Escrito por Haroldo Guimarães ,
Atleta Maurício Souza
Legenda: Maurício Souza, atleta do Minas Tênis Clube, foi acusado de comentários homofóbicos nas redes sociais
Foto: Reprodução/Instagram

Em Direito Penal, a adaptação do fato à norma precisa ser perfeita, sem margem interpretativa. Sempre foi e continuará sendo assim.

Maurício Souza colocou em suas redes sociais seu descontentamento com um conteúdo de uma revista em quadrinhos de maneira infantil, frágil, ilógica e, até mesmo, eleitoreira - certamente se candidatará e terá votos de parte da direita mais histérica, se elegendo facilmente.

Quando o fez, deixou claro pelo menos uma das seguintes convicções: 1. que ser bissexual é errado, e / ou 2. que ver numa revista em quadrinhos um beijo de pessoas do mesmo sexo influencia a orientação sexual do leitor e / ou 3. que a DC Comics deveria ceder à sua vontade e às suas convicções morais e estéticas.

Pensar assim e exteriorizar isso, segundo o Professor Doutor Carlos Mardem (UFC), com quem conversei demorada e filosoficamente sobre o tema, seria permitido no Brasil.

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Assim disse o Professor Mardem:

“Eu, no lugar de Maurício, jamais falaria o que ele falou, por conta do efeito de suas palavras. Mas não há proibição legal, por enquanto, daquela fala. É permitido, no Brasil, não ter empatia nas opiniões, respeitado os limites legais. Se esse jogador fizesse uma campanha diretamente contra as pessoas homossexuais, ou restringisse seus direitos em situações concretas, ou os ridicularizasse, seria responsabilizado".

"Ainda não foi vontade do legislador criminalizar a opinião de que ser homossexual é errado, ou de que uma revista em quadrinhos converte a sexualidade, assim como não é vontade do legislador criminalizar as opiniões de quem não concorda com os religiosos.

"A minha opinião - é natural - pode ser considerada imbecilidade para outros, e a do atleta também. Isso é do jogo. Principalmente para pessoas públicas e professores. Há, sim, em algumas situações, um Direito Fundamental à Imbecilidade, para o bem e para o mal, como costumo dizer em sala de aula. Para que isso mude, só se a legislação mudar, e acho que isso não vai acontecer”.

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As expressões “Deus me livre minha neta ser umbandista” e “Oxalá meu filho não seja evangélico” tem a mesma fórmula lógica e parecem ser igualmente permitidas pela lei, mas veiculá-las para milhões de pessoas são de uma grosseria e tolice tremendas. É meu pensamento. Eu não gostaria de empregados que dissessem isso em redes sociais.

A demissão de Maurício foi, até onde consta, sem justa causa, com o pagamento de todos os direitos – mas, se existir cláusula no contrato de trabalho proibindo a emissão de opiniões como essa, poderá ter sido por justa causa.

E essa cláusula – escrita ou tácita - restringindo opiniões públicas na constância do contrato de emprego... é permitida? Sim, conforme reiteradas decisões do Tribunal Superior do Trabalho - TST, e até mesmo vídeos institucionais deste tribunal. É assim que funciona a "norma geral negativa" kelseniana, segundo a qual "o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”.

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