Baiana System lança álbum mais consistente que os anteriores

“O Futuro não demora” sucede “Duas Cidades” (2016), álbum do hit “Playsom”, e já está disponível nas plataformas digitais 

Escrito por Felipe Gurgel , felipe.gurgel@diariodonordeste.com.br

Após cumprir o ciclo do celebrado “Duas Cidades”, lançado há três anos, o Baiana System chega ao terceiro álbum, “O Futuro não demora”. A partir desta sexta (15), o disco está disponível nas plataformas digitais e coloca Russo Passapusso (voz), Beto Barreto (guitarra), Marcelo Secco (baixo) e Japa System (bateria e percussão) em um patamar de “responsabilidade” frente ao cenário da música brasileira.  

“Duas Cidades” repercutiu por conta do hit “Playsom” e, mais do que visibilidade, o Baiana System ganhou respeito ao pautar questões sociais contemporâneas, sem economizar na intensidade de um caldo sonoro estereotipado como “ritmo de festa”. Ou seja, o grupo baiano teve o êxito de envolver, em torno de sua agenda de shows e de lançamentos (como o single “Invisível”, lançado em 2017), o folião adepto dos abadás ao crítico que assiste um show dançante de braços cruzados e testa franzida.   

“O Futuro não demora” nasce carregado de expectativas dentre os diversos públicos do Baiana System e envolve mais pesquisa em relação aos álbuns anteriores. Parte do repertório de “Duas Cidades” já existia ao vivo antes de ganhar as versões gravadas. O novo disco traz uma sonoridade ainda mais “carregada” de referências, participações especiais e cuidado com os detalhes do repertório. Daniel Ganjaman (Otto, Criolo, Planet Hemp) assina, de novo, a produção.  

Por ora, a banda não tem datas para se apresentar em Fortaleza. Durante o período de pré-carnaval, o Baiana System faz shows em casa (dias 23 e 28 de fevereiro, em Salvador/BA). E, no sábado e no domingo de Carnaval, o grupo aporta no Recife/PE.  

Disco 

“O Futuro não demora” é dividido em dois lados. A divisão é apropriada para a edição em vinil, que também integra o pacote de lançamento do disco. Lado “Água” e o Lado “Fogo” fazem uma referência simbólica a dois dos quatro principais elementos da natureza (“Ar” e “Terra” completam essa conta).  

De fato, o discurso do álbum costura referências diretas e sutis a esses elementos. A faixa “Água” abre o Lado Água. "H2O é ouro em pó", diz um dos versos da abertura. O olhar para a temática se combina ao título do álbum, "O Futuro não demora", envolvendo no ritmo do ijexá uma reflexão sobre sustentabilidade e urgência em preservar o que ainda sobra do meio ambiente.  

Na sequência, o balanço vigoroso de "Bola de Cristal" serve de abertura para o "início do baile" do Baiana System. Primeira faixa mais "viva" do álbum, a música chama atenção por conta do apelo dançante e pela letra que amarra uma boa história à reflexão futurista do conceito do disco. 

A ótima "Salve", escrita por Antônio Carlos e Jocafi, a exemplo da faixa de abertura, celebra ícones da cultura negra na contemporaneidade: a Nação Zumbi (PE), Zulu Nation (EUA), Orquestra Rumpilezz (BA) e o bloco afro Ilê Ayiê (BA). Trata-se de um ijexá turbinado por sintetizadores, com a participação especial do rapper BNegão dando um recado de proteção e espiritualidade.  

Tríade 

A tríade de início do álbum não dá respiro para o ouvinte. Quem acompanhou o Baiana System com seus álbuns anteriores toma consciência de que está à frente de um disco mais consistente, bem trabalhado.  

O trabalho mantém ainda mais claro os apelos habituais da sonoridade dos baianos: o som bem construído a partir da combinação entre a eletrônica e os ritmos africanos; o discurso afiado às questões sociais contemporâneas e a conexão dos artistas com a sua ancestralidade.      

Com uma citação ao escritor uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015), "Sulamericano" escancara as feridas do continente, e faz menção aos golpes que lembram o buraco onde o Brasil se encontra hoje.   

Curumin faz participação especial em "Sonar". Na sequência, a psicodélica "Melô do Centro da Terra" encerra o "Lado Água" do disco. O repertório do Lado B (o "Fogo") segue com uma atmosfera mais aberta. E o som poderoso e nervoso da mistura de ragga e coco, "Redoma", interrompe essa clima.  

"Saci" mantém essa temperatura alta. Diferente da primeira metade do disco, a segunda tem um clima mais tenso (e intenso) e o repertório forma uma unidade, sem a mesma variação do início do álbum.  

De "Redoma" até "CertopeloCertoh", o peso toma de conta da sonoridade e o ouvinte só ganha um respiro no final. A última faixa, "Fogo", com a participação da Orquestra Afrosinfônica, é curta, e retoma a ênfase na melodia e a clareza dos tambores.  

O Futuro não demora 
Baiana System 

Selo Máquina de Louco 
2019, 13 faixas 
Disponível nas plataformas digitais

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