Batista de Lima: A lua de Antônio Girão

Escrito por Redação ,

Antônio Girão Barroso era um homem noturno, na acepção bachelardiana de quem vive poeticamente. Enamorou-se da lua e de sua cidade como se escrevesse um poema sobre o corpo da mulher amada. Não se sabe até hoje quem era mais amada sua, se a lua ou a rua. No seu êxtase poético sempre pedia ao relógio que parasse. Lírico e socialista, anarquista e cordial, Girão virou lenda fortalezense.

No seu centenário de nascimento, em 2014, antes que algum aventureiro lançasse mão do seu acervo memorial, seu filho Oswald Barroso assumiu seu patrimônio de nuvens. Daí que organizou "Um certo contato com a lua". É um apanhado biobibliográfico em que poesia e vida se unem em livro de 386 páginas de agradável leitura. Torna-se agradável por conta da forma como foi organizado e também por transportar o leitor de mãos dadas por uma Fortaleza que não existe mais.

Só mesmo o filho para descrever, por completo, o pai. Mesmo assim aqueles que com ele conviveram, com ele também opinam sobre sua figura, permanentemente afável. Foi com essa sua qualidade que me chamou a atenção o seu perfil imitando Carlitos. Estivemos viajando para um Congresso de escritores que aconteceu, em 1985, em São Paulo. Éramos uma equipe de cearenses que, além de nós dois, estavam Roberto Pontes, Beatriz Alcântara, Luís Sérgio Santos, Pardal, Auriberto Cavalcante, Glícia Rodrigues, Dioguinho, Joyce Cavalcante e Nilze Costa e Silva.

Foi uma oportunidade em que me aproximei bem mais do Girão. Eram palestras durante o dia, no Teatro Sérgio Cardoso, e bares à noite. Do grupo era impressionante a juventude daquele cidadão já idoso.

A partir daquela época passei a admirar mais Antônio Girão Barroso. E agora, lendo esse livro "Um certo contato com a lua. Antônio Girão Barroso, Poesia e Vida", essa admiração só aumentou. Afinal, ele viveu poeticamente na sua Fortaleza amada.,O livro, editado em 2014, pela editora Armazém da Cultura, foi organizado por seu filho Oswald Barroso, escritor e professor da UECE. São 386 páginas em que o perfil de Girão é apresentado sem afetações de filho, nem paixão de fã. Dá gosto seguir seu itinerário de vida que começa no Cariri, mais precisamente na cidade de Araripe em que nasceu. Depois há seus tempos de Iguatu, Icó, com passagem por Lavras. Esse modo itinerante de viver era pelo fato de seu pai, como funcionário dos correios, ter sempre que mudar de cidade.

Por fim pode-se dizer que Antônio Girão Barroso pode ser medido pela adjetivação que lhe foi atribuída. Foi sempre altruísta, humano, angustiado pelo destino das gentes. Verdadeiro paletó aéreo da noite fortalezense, para ele não bastava ser poeta, era preciso viver poeticamente. Anjo de candura, seu despojamento diante da praticidade da vida tornava-o conduzível, administrável e ao mesmo tempo imitável.

Na sua trajetória, ligou uma Fortaleza da belle époque à metrópole das duzentas favelas, sem perder a ternura. Terminou por engravidar a cidade do mais puro lirismo. Seu encanto radical tem servido do mais puro exemplo às gerações que lhe sucedem.

Antônio Girão Barroso pode ser medido pela adjetivação que lhe foi atribuída. Foi sempre altruísta, humano, angustiado pelo destino das gentes

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