Artesã da novidade

Embalada pela sonoridade do novo disco "A pele do futuro", Gal Costa revela detalhes do trabalho e recorda projetos antigos, como o grupo Doces Bárbaros

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@diariodonordeste.com.br
Legenda: Para o novo disco, Gal Costa reuniu parcerias tão distintas quanto Adriana Calcanhotto, Erasmo Carlos e Marília Mendonça

Gosto por respirar novos ares é bússola para Gal Costa. É também combustível, fomentando o desejo da soteropolitana de constantemente oxigenar a carreira cinquentenária. A missão, encarada com firmeza, mune-se também de serenidade para lidar com as transformações artísticas, pessoais e mercadológicas que o tempo impõe. "É do meu temperamento. Sou calma, quieta, uma pessoa totalmente zen, mas tenho essa vontade de transformar, mudar, fazer coisas novas. Gosto de coisas polêmicas e de arriscar, fazer algo que nunca fiz. E, assim, vou buscando novos trabalhos e referências", detalha a cantora em entrevista à Verso por telefone diretamente de sua casa, na capital paulista.

É essa busca pela primeira vez das coisas que lhe permite, a cada projeto lançado, transitar entre diferentes sonoridades e surgir, novíssima e inteira, abraçando caminhos-pontes. Como acontece em "A pele do futuro", seu 40º disco, disponível em formato físico e nas plataformas digitais desde a última semana de setembro. Bem recebido por público e crítica, o registro inclui 13 fixas e tem chamado atenção pela leveza com o qual é conduzido - aspecto presente desde o título que, segundo Gal, foi extraído de uma das canções do repertório.

"Geralmente, todos os meus discos têm um título que sai do título de uma canção ou de uma frase que esteve na poesia de uma música. No caso desse novo álbum, conversei com o Marcus Preto, diretor artístico do projeto, e ele me sugeriu colocar essa expressão que está dentro da música do Gilberto Gil, 'Viagem passageira'. Achei maravilhoso e ficou assim", relata a artista.

O mergulho pela dance music dos anos 1970 - outra marca contundente do trabalho - é desejo antigo desde o início da carreira da baiana. Contudo, ganhou maior fôlego neste momento devido a atual preferência do filho, Gabriel, 13, por clássicos do gênero. Pelo player do adolescente andam passeando clássicos da americana Gloria Gaynor e do grupo Earth, Wind & Fire, por exemplo. "Ele (Gabriel) tem ouvido muito essas músicas e, quando vi isso, pensei 'nossa, mas que coisa! Essa geração do Gabriel ouvindo músicas dessa década?'. Então, pensei em fazer, agora, um disco que tivesse um sonoridade desse período".

Parcerias

Colcha de retalhos de cuidadosa curadoria, "A pele do futuro" é beneficiado pela quantidade de parcerias que colaboraram na composição das músicas - Adriana Calcanhotto, Nando Reis e Erasmo Carlos, por exemplo - e na interpretação de duas faixas: "Cuidando de longe", com Marília Mendonça, e "Minha mãe", com Maria Bethânia.

O diálogo com a intérprete sertaneja, segundo Gal, deu-se presencialmente e foi resultado da vontade de fazer uma "sofrência". "Conversando com o Marcus Preto, tive essa ideia e cogitei pedir a Marília Mendonça que fizesse uma canção e gravasse comigo em ritmo de dance music. Ele gostou da ideia, conversamos pessoalmente e a gente fez a música. Acho que ficou o maior barato", comemora. Com Bethânia, o convite se deu por telefone, já que ambas estavam imersas em outros processos musicais - Gal com a turnê "Trinca de Ases" na Europa e Bethânia em ensaios com Zeca Pagodinho. A logística, porém, não enfraqueceu o resultado da canção, um belo testamento sobre a maternidade.

Aproveitando a menção do nome da conterrânea, surge a pergunta se o projeto Doces Bárbaros - grupo formado na década de 1970 pelas duas cantoras juntamente a Gilberto Gil e Caetano Veloso - pode voltar aos palcos. "Vai depender deles, porque todo mundo tem uma vida independente. Acho meio difícil que a gente faça o projeto de novo, até porque ninguém pensou nisso, exceto a Bethânia, que sinalizou que queria fazer novamente e até tentou unir a gente em um show na Mangueira, quando ela desfilou pela escola de samba, o que não foi possível".

Travessia

Sobre a turnê do novo disco, a cantora revela que deve iniciar em dezembro. O planejamento é passar primeiro por São Paulo (dia 1) e Rio de Janeiro (no dia 7), itinerando na sequência para outras cidades. Fortaleza está inclusa. "É lógico que quero passar pelo Ceará. Mas, antes disso, vamos começar uma série de pelo menos dez shows para alavancar a turnê".

A conversa finaliza com Gal refletindo sobre o atual momento político do País. "É preciso educação para não haver violência. Com a educação se resolve a maioria das coisas. Neste momento, é muito importante abrir os caminhos, fazer com que as pessoas deem um voto consciente, não impulsivo, com raiva ou ódio", opina.

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